16.6.14

A caminho do Maracanã #4

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Suíça - Equador
Um confronto interessante, por colocar em confronto duas selecções, digamos, da classe média dos respectivos continentes, sendo que ambas representam bem as orientações tácticas que hoje predominam quer nas equipas europeias, quer nas sul americanas. Ambas em 4-2-3-1, mas a Suíça a valorizar mais o momento de organização, enquanto que o Equador a revelar-se sobretudo vocacionado para o momento de transição. Daqui resulta uma consequência sobre aquele que seria - e foi, durante grande parte do jogo - o detalhe fundamental do jogo, ou seja o momento da perda da bola suíça. Quando os suíços conseguiram ter mais qualidade na ligação do seu jogo, prolongando-o até ao último terço, a resposta do Equador foi sempre muito complicada. Mas quando isso não sucedia, eram os equatorianos quem tinham uma presença mais ameaçadora no jogo. Pessoalmente, entendo que a Suíça é uma formação mais bem trabalhada tacticamente e com uma equipa mais completa em termos de qualidade, mas a verdade é que os suíços tiveram muita dificuldade em lidar com o bloco baixo e denso dos equatorianos, não confirmando no jogo - e muito por este ponto que, como disse, me parece fulcral - a superioridade que lhes reconhecia. Outro detalhe interessante, e decisivo na definição do resultado, foi a forma como o Equador permitiu que o jogo se partisse nos minutos finais, provavelmente deslumbrado pela possibilidade de vitória, mas acabando por ser penalizado pelas dificuldades que os seus defensores revelam quando saem do conforto daquele bloco baixo e denso que tanto caracteriza a equipa.

França - Honduras
Há pouco para dizer deste jogo, tal o desequilíbrio de valores entre os dois conjuntos. Na verdade, parece-me até que a percepção das diferenças não estava muito bem percebida, havendo alguma expectativa em torno da possibilidade de uma surpresa hondurenha. A verdade, porém, é que as Honduras são das equipas mais fracas deste Mundial (com Irão e Austrália, formam um grupo que destaco claramente das demais), enquanto que a França está no topo do segundo pelotão de favoritos para este Mundial, atrás dos 4 mais claros candidatos. Na equipa francesa, o sublinhado mais evidente recairá em Benzema ou no poderio do seu meio campo (fisicamente, o mais impressionante da prova), mas gostaria de destacar também a qualidade de Valbuena, que como já havia referido na antevisão sobre a equipa, tem um papel fundamental nos movimentos interiores da equipa, oferecendo-se sempre como solução de qualidade num zona que onde poucos o conseguem fazer. Ao vê-lo nesta função aos 29 anos, fico com a sensação de que terá passado ao lado de uma carreira de muito maior fulgor, nomeadamente ao ser sempre utilizado em posições exteriores. Que desperdício!

Argentina - Bósnia
A Argentina foi das equipas que menos se deu a mostrar nos jogos de preparação e, talvez por isso, aquela que mais me surpreendeu na sua abordagem inicial, em relação ao que tinha visto. De facto, não esperava os 3 centrais, e também não me parece a melhor forma de potenciar os recursos desta equipa. De resto, é interessante o caso de Messi, que marcou um grande golo, mas que passou também grande parte do jogo a ser anulado pelo adversário. Pessoalmente - e posso estar errado, aqui - continuo a pensar que o que distingue o patamar de rendimento de Messi é sobretudo o ajuste do contexto colectivo. A sua envolvência no jogo, na minha perspectiva, deve ser potenciada e explorada, mas de preferência entre as últimas duas linhas adversárias. O que me parece acontecer é que, em relação ao passado, Messi tem sido solicitado em fases cada vez mais precoces do jogo das suas equipas, nomeadamente quando tem ainda 30-40 metros para percorrer até chegar à baliza e, principalmente, duas ou três linhas defensivas por ultrapassar. Assim, acaba por desgastar-se física e mentalmente, quer pela maior frequência com que é solicitado, quer pela frustração de ser mal sucedido em iniciativas de grande improbabilidade de sucesso. Ou seja, potenciar Messi, sim, mas saltar etapas do jogo ofensivo, não.

Se a grande expectativa mediática para este jogo girava em torno da equipa argentina, a minha estava também muito centrada na Bósnia, sobre quem tinha sido muito elogioso. De facto, foi pena o golo sofrido logo no inicio do jogo, porque a qualidade que esta equipa confirmou tinha tudo para colocar os argentinos em sobressalto. Como havia referido, é uma equipa com uma proposta arrojada, tanto a nível defensivo como ofensivo, mas com bastante qualidade naquilo que se propõe fazer. Não diria que o resultado foi injusto, mesmo se foi a Bósnia quem conseguiu mais finalizações enquadradas ou pontapés de canto no jogo (o que, dado o desnível de recursos entre as equipas, é já de si notável), mas destacaria sem dúvida a capacidade que a equipa revelou para gerir o jogo com bola, sempre ligando o jogo de forma apoiada a partir de trás. E recupero aqui o que escrevi sobre a exibição da Croácia frente ao Brasil, que com recursos individuais bem mais capazes não teve o arrojo de ir além de uma postura submissa e reactiva. Na Bósnia, grande destaque para o corredor central, com Pjanic, Besic (já havia antecipado a qualidade deste jovem desconhecido, que me parece ter capacidade para jogar numa das principais equipas do futebol europeu, como médio defensivo), Misimovic e Dzeko, que contrasta com alguma mediocridade dos jogadores que actuam nos corredores laterais. Enfim, a prova é curta e bastante vulnerável a factores aleatórios, assim como aos caprichos de calendário (a Argentina jogará com a Nigéria na última jornada, podendo estar já qualificada nessa altura), mas mantenho a expectativa elevada sobre esta equipa, que me continua a parecer a mais bem potenciada colectivamente, em face dos recursos individuais que possui. Esperemos é que Susic não se deixa afectar por alguma miopia analítica, e queira mudar uma identidade forte que construiu para incluir outro avançado no onze, quem sabe encostando Pjanic outra vez a uma faxa ou abdicando do toque vintage que só Misimovic é capaz de oferecer à ligação da equipa. Seria uma crueldade, mas no futebol nunca se sabe...

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