O desgaste de Jesus - O Benfica, e Jorge Jesus, estão enredados numa teia da qual já será muito difícil escapar. Não, não se trata de nenhuma nova teoria conspirativa, mas antes da pressão mediática que coloca o treinador em constante ponto de mira por parte de cada vez mais adeptos e críticos. Existem, obviamente, pontos em que esses reparos são justificáveis, mas há também toda uma série de análises que se vão generalizando e que tendem a estabelecer todo e qualquer nexo de culpabilidade do treinador relativamente ao que de menos positivo possa suceder. Tem tudo que ver com o lado emocional do futebol, enquanto fenómeno social, e quanto maior vai sendo o desgaste mediático do treinador, mais forçada e sofismável se torna a argumentação dos seus críticos. Da minha parte, mais do que lamentar, resta-me constatar, porque se o impacto do futebol se explica pelo lado emocional, não podemos depois desejar que seja a razão a conduzir os raciocínios colectivos.
Sofrimento não é, necessariamente, defeito - Abordando mais concretamente o jogo, mas mantendo-me ainda no campo das emoções que passam de dentro para fora do campo, o sofrimento que o Benfica sentiu nos instantes finais do jogo induz a crítica pela forma como a equipa geriu a vantagem que cedo conseguiu no marcador. Tanto mais, que esteve mais de 30 minutos em vantagem numérica. Não digo que não pudesse ter feito mais, mas não estou de acordo que o Benfica tenha gerido mal o jogo, parecendo-me aliás que terá feito uma das melhores partidas dos últimos tempos. E afirmo-o tendo em conta a qualidade do adversário, que será provavelmente a quinta equipa do futebol português no momento presente.
O Benfica nunca conseguiu um grande volume de posse de bola, nem era previsível que o fizesse, mas controlou praticamente sempre o Estoril, apenas acabando por sentir desconforto no inevitável jogo directo dos minutos finais. Particularmente, na segunda parte Jesus alterou a sua estrutura, integrando Gaitan no corredor central, por troca com Rodrigo, tantando retirar assim do argentino uma presença que oferecesse mais apoio à linha média, tanto defensivamente como na gestão da posse. E esta estratégia, mesmo antes da expulsão de Filipe Gonçalves, foi bem conseguida. É trivial que seria desejável ter evitado o aperto final, mas seria igualmente desproporcionado fazer do objectivo de dilatar o marcador uma prioridade ao ponto de colocar em risco a vantagem de que a equipa já usufruía. E, mais importante ainda, não é também justo afirmar que o Benfica não resolveu ofensivamente o jogo, porque o fez com o golo do Cardozo... o problema é o que continua a passar-se lá atrás!
O verdadeiro problema defensivo do Benfica! - É um ponto que se arrasta desde a pré época, que já várias vezes o abordei, mas para o qual permaneço sem uma boa explicação. Ou seja, o Benfica continua a sofrer golos com enorme regularidade, mas isso não resulta tanto de uma grande permeabilidade defensiva ao nível das ocasiões de golo consentidas, mas antes de um nível assustador de eficácia por parte dos adversários. Para se ter uma ideia, rapidamente, o Benfica sofreu 10 golos em 17 ocasiões (58% de aproveitamento dos adversários), enquanto que Porto e Sporting sofreram, respectivamente, 6 em 18 (33%) e 4 em 14 (29%). E este é, a meu ver e de forma muito flagrante, o grande problema defensivo do Benfica.
Gaitan, Matic e Cardozo - Gaitan, Matic e Cardozo serão, para mim, os grandes destaques do jogo. Gaitan, porque oferece uma qualidade enorme à equipa e que, na ausência de Salvio, não existe em mais nenhum extremo do plantel. Pelo desempenho técnico, claro, mas também pela sua maturidade em muitos outros aspectos, como no posicionamento defensivo ou na capacidade de ocupar outras zonas que não apenas os corredores laterais. Continua a ter algum instabilidade ao nível da segurança em posse, é verdade, mas para mim é um jogador absolutamente essencial na equipa, pela diferença que marca em relação às outras soluções. Matic, regressado a um papel que lhe é mais familiar, voltou a ter a preponderância habitual, com a capacidade de complementar essa influência com uma boa capacidade desequilibradora no último terço. Cardozo, porque entrou de facto muito bem no jogo, a oferecer outra resposta nas primeiras bolas e com influência relevante no último terço, pelo golo que marcou e por outra ocasião que criou para Lima. Parece motivado, e quando isso acontece, a utilidade do paraguaio é de facto muito elevada... o problema é que isso nem sempre acontece com Cardozo. Uma referência também para Lima, que vai continuar a ser criticado pelas ocasiões falhadas, um aspecto altamente sobrestimado em termos mediáticos. Lima, porém, tem uma capacidade muito boa de envolvimento ofensivo, conseguindo ser protagonista em vários desequilíbrios da equipa, quer finalizando, quer assistindo, e isso tem um enorme valor. A meu ver, com ou sem Cardozo, Jesus faria bem em dar mais minutos ao brasileiro.
O Estoril - Importa fazer, novamente, um elogio ao Estoril. Já não é surpresa que crie dificuldades a qualquer equipa que encontre, fazendo-o sempre com uma identidade muito própria e que não necessita de grandes ajustamentos estratégicos perante adversários diferentes e de maior qualidade. Isso é apenas possível pela qualidade. Qualidade no modelo de jogo implementado, mas também qualidade nos recursos individuais que o interpretam. Porque se Marco Silva merece obviamente destaque, também não me parece justo que o foco colocado sobre o treinador ofusque os méritos de outros protagonistas.