Notas colectivas
Para sustentar o carácter algo atípico do jogo portista, basta atentar a alguns dados muito claros: o Porto realizou, neste jogo, a sua partida em casa com menos passes completados e menor % de sequência dada a cada posse de bola. O motivo para tal constatação, perante uma equipa, em teoria, das mais incapazes de discutir o domínio do jogo, está, como referi antes, na opção estratégica da Naval. A sua linha defensiva teve um comportamento altamente agressivo, subindo muito, abrindo espaço nas suas costas mas também reduzindo substancialmente a zona onde o Porto faz a construção das suas jogadas. A consequência disto foi um tipo de jogo mais verticalizado e menos trabalhado, onde cada jogada precisava de menos passes até chegar à sua conclusão. Quem experimentou estratégia idêntica no Dragão foi o Leiria, mas desta vez o Porto não esteve tão inspirado no aproveitamento do espaço que havia nas costas da defensiva contrária.Ainda em relação à Naval, importa dizer que a sua atitude agressiva em termos posicionais não teve sempre a melhor organização. Não só na fundamental sincronia da última linha, mas também na forma como, por diversas vezes, o seu curtíssimo bloco não se conseguiu ajustar ao posicionamento da bola para manter uma presença pressionante sobre o portador da bola. E, como se sabe, só é possível jogar-se com espaço nas costas se a pressão sobre a bola for sempre conseguida. Caso contrário, pode ser suicídio.
De resto, e termino por aqui em relação à Naval, a sua qualidade com bola também não foi muito boa, vivendo sobretudo de alguns rasgos individuais de Fabio Júnior que, porém, lhe chegaram a dar uma soberana oportunidade para complicar as contas portistas. Não que chegasse para a surpresa – isso nunca saberemos – mas porque, dadas as circunstâncias, a eficácia era um elemento obrigatório para quem queria sonhar.
Quanto ao Porto, e apesar do tal bloco curto da Naval, é notável a movimentação que existe em ataque posicional, com a equipa a encontrar situações de liberdade, mesmo dentro das apertadas linhas do seu opositor. Foi, creio, um bom jogo da equipa em vários parâmetros, ficando apenas a dever a si própria alguma qualidade de definição no último terço para atingir uma expressiva goleada. É que as condições estavam criadas.
Uma nota em relação ao meio campo portista. Parece haver uma intenção de usar as características mais ofensivas de Guarin, dando mais liberdade ao “pivot”, e, para isso, mantendo Moutinho numa posição de maior proximidade com essa zona. Quer no equilíbrio posicional, quer mesmo numa fase de construção, onde Moutinho aparece muito mais do que Belluschi junto dos centrais. Por outro lado, Belluschi tem uma presença mais próxima das linhas ofensivas, aparecendo menos numa primeira fase de construção, mas mais no espaço entre linhas e dando largura à direita em situações de variação de flanco. São comportamentos já vistos noutras ocasiões, mas que creio serem mais notórios e conseguidos nos últimos jogos, com Guarin como “pivot”. Resta saber, porém, se esta opção se manterá noutro tipo de jogos onde, claramente, o colombiano não dá tantas garantias como Fernando em termos de segurança e presença posicional.
Notas individuais
Fucile – Regressou à esquerda, mas não teve muita sorte no ‘timing’ deste regresso. É que o jogo foi mais verticalizado do que é hábito, havendo menos apelo à inclusão dos laterais em termos ofensivos. Ainda assim, o grande reparo que lhe tem de ser feito é para a frequência absurda com que fica ligado a erros decisivos ou a grandes penalidades. Uma tendência para o desastre que se lamenta, porque é forte em quase tudo.Otamendi – Não pode marcar com tanta frequência como vinha fazendo, mas vem-se revelando como a melhor opção para o lugar, e com alguma distância. Tem uma área de intervenção muito alargada e consegue ser dominador em todo esse espaço. Sente-se que gosta disso e que, por isso, também arrisca mais nas suas intervenções. O segredo para a sua evolução é calibrar melhor as bolas a que deve ir e aquelas em que deve ficar, assim como o risco que assume em cada posse de bola. É, a meu ver, o dilema tradicional dos centrais com maior potencial.
Rolando – Ao contrário de Otamendi, tem uma zona de intervenção curtíssima e impõe-se com muita dificuldade em termos defensivos. Mantém um perfil sóbrio, tem boa presença nas bolas paradas e é fiável com a bola nos pés, o que o faz errar menor e o iliba quase sempre de apreciações mais negativas. A meu ver, porém, o Porto deve pedir mais para esta posição.
Guarin – Voltou a fazer um bom jogo, sobretudo porque tem a capacidade de dar profundidade à sua intervenção. Mas não é – de longe – um jogador muito forte na missão posicional e de segurança que normalmente está reservada para a sua posição. Será interessante ver como Villas Boas gerirá a sua utilização ao longo da época.
Moutinho – Começou por ameaçar uma grande exibição, mas foi perdendo presença e acabou por estar menos participativo na segunda parte. A sua fiabilidade, no entanto, faz com que jogue sempre bem e penso que é boa ideia reservar-lhe uma missão mais focada no equilíbrio e na primeira fase de construção do que esperar dele uma grande influência no último terço.
Belluschi – Não começou bem, mas creio que terá feito uma das suas melhores exibições em termos globais. Esteve bem em posse, conseguiu várias recuperações importantes em zona alta e foi influente também no que a equipa conseguiu no último terço.
Hulk – Voltou a jogar a partir da ala, onde claramente rende mais. O ponto, porém, é que o momento de confiança é de tal ordem que não creio que alguma posição no campo o impedisse de marcar e ser influente. Que época!
João Real – Posicionalmente não dá para tecer grandes elogios, mas a sua capacidade interventiva foi absolutamente incrível. Fez um número absurdo de cortes, muitos deles em recuperação e decisivos. Diria que foi um “guarda redes de campo”, e muito graças a ele, não aconteceram mais golos.