24.1.11

Beira Mar - Porto: Análise e números

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Numa conversa entre Mourinho e Maradona, as camâras apanharam uma breve troca de impressões em que o português dizia algo como isto: “uma coisa é teres uma equipa que sabes que, se marcas, ganhas. Outra coisa, é quando, marcas, e mesmo assim não sabes o que se vai passar”. Ora bem, o Porto foi, em absoluto, o primeiro caso levantado por Mourinho. Não era liquido que marcasse na primeira parte de um jogo tão fechado – e é importante que se note o relevo desta eficácia para o destino do jogo – mas, tendo-o feito, soube manter o jogo sempre longe da sua baliza, mesmo que para isso tivesse de arregaçar as mangas e despir o “smoking”. Ossos do ofício para quem percebe bem qual é o verdadeiro objectivo de um jogo de futebol. De resto, e como abordo abaixo, mérito para o Beira Mar por ter condicionado fortemente a mais valia técnica dos portistas.

Notas colectivas
Não é este o tipo de jogo que alguma equipa “grande” deseja enfrentar. Não é, mas é bom que esteja preparada para ele. O mérito é do Beira Mar, que, se não conseguiu pontuar, conseguiu, pelo menos, forçar o Porto a jogar sempre em espaços muito apertados e longe das balizas. Porque é que o conseguiu? Pela conjugação de vários factores. Primeiro, a ideia, a estratégia, que limitou os riscos do seu próprio jogo, não querendo jogar muito em apoio e apostando em lançamentos mais largos para inicio de jogadas. Depois, pela atitude e organização. Atitude, para manter agressividade e reactividade na zona intermédia. Organização, para não permitir que o Porto encontrasse espaços para dar profundidade ao seu jogo. Os números, já agora, confirmam esta característica de um jogo mais disputado do que é comum: este foi, no campeonato e descontando o alagado jogo de Coimbra, o jogo com mais intercepções e menos % de sequência em posse da equipa do Porto.

Perante tudo isto, o Porto respondeu muito bem. Manteve-se concentrado, organizado e agressivo. Não foi fácil encontrar, depois, os tais espaços para chegar próximo do golo, mas o Porto lá os foi conseguindo, através do seu óptimo jogo em posse. Quer por aquilo que o maior ascendente lhe oferecia – mais bolas paradas – quer pela exploração de algumas lacunas posicionais no bloco contrário. A saber, o espaço entre os centrais e laterais aveirenses, nem sempre bem mantido por estes últimos, e o desposicionamento de Djamal, “pivot” defensivo, que sempre que saía da sua zona para pressionar, abria um buraco nas suas costas.

Há que notar, neste jogo, a importância do posicionamento base dos jogadores, quase sempre bem respeitado de parte a parte. Para o Porto, foi um jogo disputado em espaços mais curtos do que é costume. Os jogadores puderam manter distâncias mais próximas entre si e fizeram-no bem. É curioso como esta característica condicionou o tipo de exibição característica de alguns jogadores mais defensivos. No Beira Mar, já destaquei algumas lacunas que foram aparecendo também por mérito do Porto e da sua posse, mas há que realçar a boa organização da equipa, em particular da coerência posicional da sua linha defensiva e da importância dada pelos centrais à conservação de um espaço sempre curto entre eles.

Notas individuais
Emídio Rafael – Dos jogos para o campeonato (os outros não analisei com o mesmo detalhe) foi a sua melhor exibição. O Beira Mar pareceu tentar explorar o seu flanco de forma intencional e o resultado foi que Rafa acabou como o jogador mais interventivo da sua equipa. Defensivamente, esteve bem, beneficiando, parece-me, do tal jogo de referências posicionais mais próximas, ajustando sempre bem o posicionamento, nomeadamente em relação a Otamendi, e mantendo uma boa agressividade na sua zona. Com bola, poucas vezes teve a oportunidade de jogar no campo adversário, mas numa dessas vezes combinou bem com James para uma das melhores ocasiões da equipa. De resto, cometeu um erro que podia ter comprometido, e, talvez por isso, teve uma segunda parte de risco mínimo sempre que a bola passava pelos seus pés. Daí, o menor aproveitamento no capítulo técnico.

Rolando e Otamendi – Invariavelmente, Otamendi é o mais interventivo em termos defensivos, mas desta vez foi ao contrário. Na minha leitura, tem a ver com a característica mais fechada do jogo, sendo que Otamendi é um jogador que sobressai mais quando o jogo é mais esticado e há mais espaço para controlar. Seja como for, e sem terem feito um jogo perfeito, estiveram ambos bem, com Rolando em melhor plano também no capítulo técnico.

Fernando – Villas Boas fez bem em fazer regressar o “polvo” neste jogo. Não teve um jogo de domínio excepcional da sua zona, mas cumpriu perfeitamente a sua missão, quer em termos defensivos, quer em termos de segurança em posse. E isso, raramente Guarin consegue com tanta eficácia.

Belluschi – Não foi influente no último terço, mas, mais uma vez se prova, Belluschi é tudo menos um jogador apenas criativo. É um jogador de grande capacidade defensiva: rápido e reactivo a encurtar espaços e muito agressivo a pressionar. Por isso ganha tantas bolas e por isso é tão útil, mesmo em jogos mais fechados. Creio que é uma característica que continua pouco percepcionada em geral, mas que não escapa à equipa técnica, que, por isso, o mantém quase 90 minutos num jogo destes (Jesualdo, por exemplo, nem o colocava a jogar em jogos mais exigentes em termos defensivos).

James – Há um aspecto que se repete nele, e em jogos bem difíceis para o fazer: a certeza em posse. A sequência que dá às posses que passam por ele é muito acima do que é esperado para um jogador da sua posição e idade, e isso indica uma boa capacidade de decisão que, efectivamente tem. James, porém, precisa ainda de encontrar a sua forma de ser decisivo, porque só assim poderá ser o jogador de excepção que o Porto tanto espera dele. Curiosamente, pareceu melhor quando jogou na direita, intervindo mais em zonas interiores.

Hulk – Há 1 semana escrevia que o momento de Hulk é de tal forma positivo que desequilibraria em qualquer circunstância. Mais um exemplo. Jogo fechado, actuando numa posição onde não se sente tão confortável e, mesmo assim, presente em 2 dos principais desequilíbrios da equipa. A curiosidade de nenhum ter sido pela sua habitual capacidade de desequilíbrio no 1x1, mas em movimentos característicos de um 9.

Cristian Rodriguez – Entrou bem e penso que pode dar muito à equipa se tiver disponibilidade física e oportunidades para tal. A confirmar.

Kanu – Desde a II Liga – e já há alguns anos – que se percebe que tem características para muito mais. É um jogador muito forte em termos físicos, pela velocidade e agilidade invulgares que possui. Por isso, ganha tantas bolas e é tão difícil de bater no 1x1. No capítulo técnico não tenho tanta certeza sobre a sua real valia, mas não será esse o seu principal desafio. Com Leonardo Jardim, já tem tido essa possibilidade de evoluir, mas precisa de ser “formatado” em termos de rigor posicional e risco de decisão. Se o conseguir, será um central muito bom, porque potencial, tem.
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