Eficácia normalizada e o exagero resultadista - No futebol, e por mais que se diga o contrário, é sempre assim... os resultados são avassaladores na apreciação qualitativa que se faz das equipas. No caso do Benfica, as duas vitórias recentes arrastam consigo uma série de diagnósticos a propósito das melhorias que equipa terá denotado nos seus últimos 180 minutos. E todos têm por onde escolher: pode ser dos laterais (especialmente a ausência de Cortez, claro), pode ser dos médios (com a introdução de Fejsa), pode ser dos extremos (Enzo Perez), ou dos avançados (Djuricic e Cardozo). São tantos e tão variados os possíveis bodes expiatórios, que dará para o gosto de quase todos.
Pessoalmente, não partilho da ideia de que o Benfica tenha melhorado globalmente. Haverá pontos positivos, claro, e deixarei a minha opinião sobre eles, mas globalmente não me parece justo dizer que o Benfica fez melhores exibições nestes dois jogos caseiros do que havia feito, por exemplo, frente ao Gil Vicente. Pelo contrário, até. Como fui referindo, o Benfica foi sobretudo penalizado por um aproveitamento anormalmente desfavoráveis das ocasiões de golo nos seus jogos. Os adversários marcavam praticamente em cada oportunidade que conseguiam criar, e o próprio Benfica precisava de várias para o conseguir. O registo de eficácia não era apenas anormal, mas insustentável a prazo, e a principal explicação para as diferenças nos resultados destes dois jogos para os anteriores passa precisamente por aqui, pela eficácia. Em ambos os jogos o Benfica marcou cedo e na primeira oportunidade, e isso só por si faz toda a diferença.
O jogo - O Anderlecht apresentou-se na Luz com uma estratégia notoriamente cautelosa, mas sobretudo nos momentos sem bola, acabando por ser, a meu ver, naquilo que fez com bola que acabou por ser mais penalizado. Sobretudo, na primeira parte. É que, e apesar da facilidade em sair da sua fase de construção, o Benfica raramente conseguiu entrar com perigo no extremo reduto belga, acabando por alicerçar o domínio inicial no condicionamento defensivo que fez, quer na reacção à perda, quer na pressão sobre a fase de construção do Anderlecht. A este propósito, o facto dos belgas terem tentado sair a jogar pelos centrais, havendo aparentemente pouca qualidade para o fazer, parece-me ter sido um erro estratégico importante, e assim que a construção longa (nota para o longo pontapé do guarda redes) passou a ser opção, o jogo entrou numa toada de equilíbrio, já que o Benfica sentiu sempre muitas dificuldades em controlar a segunda bola na zona média. E, reforço, esta perda de domínio do Benfica não teve de esperar pela segunda parte, surgiu antes do intervalo.
Na segunda parte, o Anderlecht alterou a sua estrutura, colocou mais gente na frente e partiu o jogo. Aqui, percebe-se a necessidade do Benfica se resguardar, mas parece-me manifestamente pouco o que a equipa conseguiu fazer com bola. Também em organização, passando a preferir reposições longas ao contrário do que havia sucedido na primeira parte, mas sobretudo em transição, porque com o adversário partido, ao Benfica dever-se-ia exigir mais critério e qualidade para tirar partido do espaço que lhe era episodicamente oferecido. E isso raramente aconteceu.
André Almeida e Siqueira - Foi um jogo de grande exigência defensiva para ambos, e embora estivessem longe de estar perfeitos, estiveram ambos bem. De Siqueira não se espera outra coisa que não seja a titularidade, mas o caso de André Almeida pode ser até mais interessante, ainda que menos badalado. As exibições de Maxi vinham sendo muito pouco conseguidas, e a meu ver até mais comprometedoras em termos defensivos do que as de Cortez, e André Almeida poderá ser uma solução a ter em conta para o lugar, sobretudo por poder oferecer menos volatilidade a uma equipa que já sofre demasiado com esse mal.
Fejsa e Matic - A exibição do primeiro deverá implicar a manutenção da dupla, pelo menos no curto prazo. O jogo de Fejsa foi, de facto, impressionante pela capacidade de trabalho que revelou, podendo perspectivar-se uma dupla de grande capacidade defensiva a formar com Matic (a minha perspectiva é que adiantar Matic para uma fase mais alta do pressing deverá trazer resultados interessantes e recorrentes). No entanto, e possivelmente irei voltar a este tema, parece-me que o meio campo do Benfica tem algo a rever em termos de critério posicional, nomeadamente na protecção do espaço entrelinhas. De todo o modo, numa equipa que pede normalmente muito aos seus médios, pode estar aqui a melhor novidade para o Benfica 13/14.
Extremos - A principal reticência que tenho em relação ao Benfica vem da ausência de Gaitan e Salvio. Markovic é um jogador de enorme potencial, capaz até de conseguir coisas fora do alcance de qualquer dos argentinos, mas a sua consistência está ainda longe de ser a ideal e pode ter também períodos de continuada ineficácia nas suas acções. Por seu lado, Enzo Perez tem qualidades que aprecio e pode dar de facto outra característica ao jogo do Benfica, mas a meu ver esbarra na parede do talento, quando comparado com Salvio ou Gaitan. Não é, portanto, um problema das alternativas serem más ou insuficientes, é apenas a constatação de que o que ofereciam Salvio e Gaitan é muito difícil de igualar, tanto pela capacidade de desequilíbrio, como pela maturidade táctica que ambos têm.
Djuricic e Cardozo - O golo do primeiro retira-lhe alguma pressão, e confirma a sua vocação para aparecer com propósito em zonas de finalização, mas não é suficiente para apagar as dificuldades que continua a revelar na integração no jogo colectivo da equipa. Jesus conta com Djuricic para que este possa ser um elemento de ligação do jogo ofensivo, na linha do que foram Aimar ou Saviola no passado, mas o sérvio está ainda longe de conseguir ser esse jogador e não é o golo ou o número 10 nas costas que alteram essa constatação. Rodrigo, ou mesmo Lima, por exemplo, não terão uma qualidade de envolvimento inferior nesta altura.
Quanto a Cardozo, não marcou, e se é verdade que o poderia ter feito em duas ocasiões, também é um facto que a equipa não produziu suficiente para que lhe fosse exigido muito nesse aspecto. De todo o modo, a exibição do paraguaio foi globalmente positiva, conseguindo um bom envolvimento no jogo e uma eficácia assinalável nas suas aparições no jogo. A Champions e os jogos mais importantes não são nem nunca foram o problema de Cardozo.