O Sporting é um clube "grande" e esta "grandeza" mede-se, em última instância, pela capacidade de atrair um apoio popular de invulgares dimensões. Esse é o maior património que um clube pode ter, e se ele for cultivado, tudo o resto pode ser conseguido no longo prazo. Mas, este apoio popular, maciço e de uma fidelidade incondicional, não resulta certamente da razoabilidade e lucidez dos adeptos, pelo contrário só se explica por uma sobredosagem de emotividade na sua relação com o futebol. Ora, se a emoção é o alimento da "grandeza" dos clubes, parece-me que a última coisa que um clube "grande" deve fazer é apelar à sua moderação. A emoção e ausência de razão têm, seguramente, muitos efeitos perversos e prejudiciais à gestão ideal dos clubes, mas esses são precisamente os fundamentos da sua existência, pelo que a instabilidade e a pressão externa só podem ser vistas como manifestações de saúde por parte do clube, e nunca o contrário. Aliás, o Sporting é um óptimo exemplo disto mesmo, porque se o clube sobreviveu a diversas situações similares nas últimas décadas, foi precisamente pela sua capacidade manter a ilusão nos seus adeptos. Um clube "grande" pode resistir a todas as desilusões, mas não sobreviverá seguramente à ausência de ilusões.
Sobre o jogo com o Arouca, foi de facto uma boa forma de começar para o Sporting, tanto pela expressividade da vitória, como pela injecção de confiança em algumas unidades decisivas para o sucesso da equipa. Curiosamente, o jogo tardou a revelar as facilidades que o Sporting encontraria na segunda parte, sendo até estranho o desfasamento no comportamento do Arouca, de uma parte para a outra. Na primeira, conseguiu impedir o domínio territorial do Sporting durante vários períodos, condicionando a posse contrária e contornando o pressing com reposições longas que instalavam de imediato o jogo no meio terreno adversário. Na segunda parte, porém, a equipa apareceu mais baixa e aparentemente menos interessada em condicionar a posse do Sporting.
Do lado do Sporting, não houve muitas novidades em relação ao que se viu na pré época, e não era previsível que tal acontecesse. A equipa manteve as características que havia revelado, destacando-se a assimetria de funções no meio campo da equipa e segurança da mesma no controlo do momento de transição. Mas, a principal explicação para a goleada resulta da dinâmica nos corredores e da consequência ao nível dos cruzamentos. É que todos os golos resultaram de situações de cruzamento, o que é um registo invulgar. O envolvimento ofensivo foi bom, assim como a presença em zona de finalização, mas também o Arouca deverá ter uma boa dose de culpa própria na forma como foi repetidamente exposto da mesma maneira. Os próximos jogos dirão muito sobre o mérito de uns, e demérito de outros.
Individualmente, há várias unidades em destaque, com realce óbvio para Montero e qualquer dos extremos. Sobre Montero, havia referido o potencial que lhe oferece o repentismo técnico em espaços curtos, e o lance do terceiro golo foi um exemplo disso mesmo. Este tipo de jogadas, com simulações a fazer dançar os defesas em zonas próximas da baliza, poderão mesmo vir a ser a imagem de marca do jogador. Mas, a par dos golos de Montero, também as acções dos extremos devem ser realçadas, sendo a meu ver fundamental que os jogadores destas posições mantenham um rendimento elevado. Por fim, o destaque para William Carvalho que, embora evidentemente longe do protagonismo de outros jogadores, teve mais um jogo onde mostrou as características que entendo defini-lo nesta altura. Sem impressionar a nível defensivo (cometeu inclusivamente um erro importante na última ocasião do Arouca, ao ignorar a ameaça que representava a diagonal de Serginho), mas com um critério em posse que continua a espantar. Não se trata de realçar a capacidade de passe, mas antes a forma como não se deixa condicionar pela pressão, mantendo uma grande capacidade de decisão e conseguindo tirar a bola das zonas de pressão com uma tranquilidade de todo invulgar.