27.11.13

Porto - O mau momento e suas responsabilidades

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Talvez não seja o 'timing' mais justo para os lenços - O empate na recepção ao Austria Viena é, obviamente, mais do que um mau resultado, um resultado proibido em função da situação do clube na competição. Ainda assim, não me parece que seja o jogo mais justo para questionar o rendimento da equipa. Aliás, se compararmos com as restantes exibições do Porto nesta temporada, este terá sido até dos jogos onde a equipa mais conseguiu produzir e onde foi mais traída pelo aproveitamento das ocasiões criadas, quer numa baliza quer na outra. O Porto terá perdido uma oportunidade soberana para sair de uma posição comprometedora, é certo, mas se chegou até ela foi porque não se conseguiu impor perante adversários directos na luta pelo apuramento. Seja como for, não há aqui da minha parte uma censura em relação aos apupos e lenços brancos mostrados à equipa no final do jogo. As manifestações de apoio/protesto resultam sempre de reacções emocionais, pelo que são sempre genuínas e bem fundamentadas desse ponto de vista. Absurdo seria esperar delas uma grande dose de racionalidade e ponderação.

As responsabilidades de Paulo Fonseca - O treinador, e no caso do Porto especialmente, é sempre o primeiro alvo, e é sobre ele que nesta altura mais apontam as criticas. Até que ponto será justo? Na minha leitura, Paulo Fonseca terá a responsabilidade de alguns escolhas individuais que me pareceram equivocadas, mas não mais do que isso. Na aposta em soluções para os corredores laterais (extremos) que teriam uma possibilidade de sucesso muito duvidosa a este nível (e escrevi-o na sequência das análises de pré-época, por isso não se trata de uma constatação à posteriori), e na forma como reagiu passivamente aos erros individuais que se iam repetindo e que são, a meu ver, o grande motivo da recente onda de maus resultados, já que o rendimento ofensivo da equipa vem sendo medíocre praticamente desde as primeiras jornadas. Concretizando, parece-me que deveria ter feito outra aposta nos extremos, e que deveria ter sido mais reactivo a mexer na dupla de centrais, que foi acumulando erros jogo após jogo, sem ser alterada.
Mas, na minha leitura as responsabilidades do treinador ficam por aqui, e não podem entrar no plano táctico. É um hábito que não é exclusivo do Porto, mas sempre que uma equipa passa por uma crise de resultados, surge imediatamente a pressão para que se mude de 'táctica', dando como certo que com outra 'táctica' a equipa teria um rendimento radicalmente diferente (e por 'táctica', entenda-se sistema táctico, porque é raro que este tipo de observação incida com pertinência sobre dinâmicas ou comportamentos colectivos, frequentemente bem mais relevantes do que o sistema em si mesmo). Ora, no caso de Paulo Fonseca e do Porto, nem me parece que o modelo de jogo seja assim tão desajustado às características dos jogadores que tem ao seu dispor. Analisando, o facto é que tem conseguido retirar bom partido dos laterais, de Lucho e de Jackson e que para além destes, convenhamos, não sobram muitas unidades que se possam afirmar estar longe do potencial que lhes é reconhecido. É possível - admito - que com um triângulo invertido (um pivot e dois médios interiores), o Porto pudesse envolver mais gente nas alas, ajudando a contornar o ponto fraco da equipa em termos ofensivos, mas tudo isso são apenas conjecturas que estão longe de poderem ser dadas como adquiridas. O ponto principal sobre Paul Fonseca e o seu modelo, porém, tem a ver com o facto de ele ser o mesmo que o treinador subir todos os degraus até à porta do Dragão. Ou seja, quem contratou Paulo Fonseca, contratou implicitamente este modelo e estas ideias de jogo, não fazendo sentido algum estar agora a pedir que o treinador jogasse de outra maneira ao fim de 3 ou 4 meses.
É curioso como, em abstracto, se ouve sempre dizer que os treinadores devem acreditar nas suas ideias e não mudar em função dos resultados, mas depois quando as coisas acontecem quase ninguém sugere outra coisa que não seja a mudança.

As responsabilidades da 'estrutura' - No futebol, invariavelmente se aponta a 'estrutura' como o factor mais decisivo para o sucesso. Confesso que quase nunca fico a saber exactamente do que é que se está a falar quando alguém se refere à 'estrutura', mas aqui vou-me referir à 'estrutura' como a quem tem poderes para tomar decisões técnicas na contratação de treinadores e jogadores, porque este é no meu entendimento o factor verdadeiramente decisivo para o sucesso desportivo a prazo (e, já agora, aquele que explica o domínio do Porto no futebol português nos últimos 20 anos).
Aqui, parece-me que a responsabilidade da 'estrutura' é bem maior do que a do treinador - desde logo porque foi quem decidiu a contratação do treinador, para o bem e para o mal.
Se o Porto tem uma fragilidade facilmente identificável nos extremos, é muito questionável a forma como o seu recrutamento tem lidado com essa posição, historicamente determinante no sucesso do modelo do Porto. Vejamos, há 2 temporadas o Porto tinha Hulk, James e Varela. Hoje, Varela é provavelmente o extremo que garante melhor rendimento entre todas as soluções disponíveis. Se o Porto sempre foi um clube vendedor, também é um facto que foi sempre um clube capaz de substituir à altura as suas principais mais valias, e isso é o que justifica o sucesso continuado apesar de tantas vendas. Nos últimos dois anos, e no que respeita a extremos, isso simplesmente não aconteceu.
Depois, há que questionar - e não sou certamente eu o primeiro a fazê-lo - o recente critério de aquisições do Porto, em particular a incidência do investimento em termos de posição do terreno. Os grandes negócios do Porto, historicamente, foram em posições defensivas. Fernando Couto, Ricardo Carvalho, Bruno Alves, Pepe, Bosingwa, Cissokho e Paulo Ferreira não foram apenas grandes vendas, mas foram sobretudo jogadores de elevado rendimento que surgiram directamente da formação ou de 'achados' em clubes de dimensão inferior. Ora, nos últimos anos o Porto inverteu essa estratégia e passou a canalizar grande parte do seu investimento para posições defensivas. Se é verdade que Danilo, Alex Sandro, Otamendi e Mangala são jogadores de indiscutível valor, convém também perceber que para os ter o Porto teve de pagar quantias que faltaram depois para investir noutras posições agora carenciadas, sendo que no passado o clube havia sido capaz de manter idêntica qualidade no sector defensivo, mas com um investimento incomparavelmente mais reduzido. Ou seja, a famosa formação de defesas do Porto foi - aparentemente por motivos estratégicos - abruptamente interrompida, com todos os prejuízos que daí resultam.
Enfim, algo está diferente na política de contratações do Porto, e esta não é uma constatação que resulte do último defeso e das vendas de Moutinho e James, mas antes de uma linha de actuação continuada e que culminou nas fragilidades que facilmente se identificam actualmente no plantel portista. E é por isso que é a 'estrutura' - muito mais do que o treinador - quem me parece ser quem tem mais responsabilidades no menor rendimento presente da equipa.

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