20.10.14

Porto - Sporting (I): aspectos colectivos

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A importância da eficácia - O balanço mediático destes jogos de maior carga emocional tende invariavelmente para acentuar as virtudes dos vencedores e defeitos dos vencidos, um pouco independentemente do que foi a história do jogo. Repete-se muito que não se analisa em função dos resultados, mas a meu ver esse continua a ser um viés dominante nas análises que são feitas, o que é perfeitamente normal tendo em conta o peso emocional que os resultados acarretam. Quer isto dizer, como facilmente se antecipará, que não concordo com a ideia de um jogo desequilibrado ou em que uma equipa tenha sido muito melhor do que a outra. Na minha leitura, este foi um jogo dividido, muito mais homogéneo do que o do campeonato, em que o Sporting venceu fundamentalmente pelo melhor aproveitamento que fez das situações que criou. De resto, ambas as equipas continuam a revelar-se aquém do seu potencial. O que é obviamente negativo, por um lado, mas que indica também que existe uma margem de progressão para que ambas possam vir a ser melhores num futuro próximo. Quer num caso quer noutro, porém, essa evolução não me parece fácil de acontecer...

Porto, a estratégia de Lopetegui - Lopetegui surpreendeu ao colocar Adrian Lopez ao lado de Jackson, mas não demorou muito a que se percebesse a ideia do treinador basco. Lopetegui, no fundo, viu o que todos vemos no jogo do seu adversário, ou seja, as dificuldades da sua linha defensiva, e tentou explorar ao máximo essa lacuna. Assim, a sua fase de construção convidava o bloco do Sporting a subir, Jackson baixava para atrair um dos centrais e Adrian fazia o movimento nas costas, solicitando o correspondente lançamento na profundidade. Isto viu-se inúmeras vezes e logo desde as primeiras jogadas. Em parte, a ideia de Lopetegui é perfeitamente lógica, em face dos problemas que o Sporting revela na resposta a este tipo de comportamento. Por outro lado, ao exacerbar tanto o recurso a esta solução, o Porto acabou por desvirtuar aquele que é habitualmente o seu ponto forte, que é capacidade de ter bola, aumentando os tempos de ataque, trabalhando bem a circulação baixa e desgastando o bloco defensivo contrário. Mas isto apenas explica o porquê do Porto ter permitido que o Sporting tivesse mais bola em sua casa do que havia feito, por exemplo, recentemente em Alvalade, mas não explica a desvantagem ao intervalo. Aí, temos de recorrer aos incontornáveis erros individuais, que custaram os dois primeiros golos do Sporting. O que é certo é que perante a derrota parcial ao intervalo, Lopetegui fez marcha atrás, encostou Adrian a uma faixa e acrescentou um médio. Só que aí o Porto não voltou a recuperar a tranquilidade para circular e valorizar a posse a partir de trás como é seu hábito, parecendo a pressão do resultado ter um efeito nefasto na lucidez e critério dos jogadores. E isto, assinale-se desde já, pode não ser um bom indicador para uma equipa que depende tanto desses dois atributos para a afirmação do seu modelo de jogo, e começa a estar cada vez mais colocada num contexto de pressão mediática. É facto que na segunda parte o Porto voltou a ter as suas oportunidades para empatar, mas voltou a não ser feliz no aproveitamento e acabou, também novamente, por conceder demasiado tempo de jogo ao Sporting, que foi progressivamente conseguindo controlar mais o jogo com bola e acabou por capitalizar o risco que o Porto assumia por uma postura defensiva que, na segunda parte e muito pela ânsia de chegar ao empate, foi bastante displicente.

A situação não está obviamente fácil para Lopetegui. A taça não é, sejamos claros, uma competição especialmente relevante, nem suficiente para salvar uma eventual perda do campeonato, mas esta é uma derrota que vem acentuar muito a pressão mediática em torno da equipa e do seu treinador. Lopetegui tem agora um desafio reforçado, porque se já era claro que a equipa precisava de trabalhar alguns aspectos do seu jogo - nomeadamente os movimentos na sua zona criativa -, agora terá também de ser capaz de isolar os jogadores da pressão e das dúvidas que estão colocadas sobre o processo. Ou seja, agora não há apenas o risco de não melhorar, há também o risco de piorar.

Sporting, a mesma identidade - Se Lopetegui apresentou uma estratégia específica para o jogo, Marco Silva voltou a revelar-se pouco flexível para fugir muito daquela que é a orientação fundamental do seu jogo. E isso traz coisas boas e coisas más, tal como se viu neste jogo e como já se vira também noutras ocasiões nesta temporada. Em particular, destacaria a abordagem defensiva da equipa, que não abdica de adiantar muita gente no pressing, conseguindo com isso diminuir os tempos de ataque do adversário, o que contribui decisivamente para que esta seja uma equipa muito difícil de dominar territorialmente. Por outro lado, ao fazê-lo o Sporting expõe muito o seu bloco e, em última análise, a sua linha defensiva, que não raras vezes tem sido confrontada com situações complicadas de resolver. Isso voltou a acontecer no Dragão, e inevitavelmente voltará a acontecer sempre que o Sporting defronte equipas com capacidade técnica para explorar as suas fragilidades. Aqui, volto a reforçar o problema que todos identificam, e que terá mesmo convidado Lopetegui a mudar a sua estratégia, que são as dificuldades de comportamento da linha defensiva. Tem-se focado muito o problema na questão individual, mas não me parece que isso seja correcto quando praticamente todos os jogadores denotam problemas no ajuste posicional. É uma forma de jogar nova para praticamente todos os defensores e cabe à equipa técnica ser capaz de os fazer evoluir no sentido que pretende ou, em última análise, encontrar comportamentos que possam ser interpretados com mais eficácia por todos. Mais, parece-me igualmente redutora a ideia de que o problema do Sporting reside única e exclusivamente na sua linha defensiva, porque se o processo defensivo funciona como um todo e envolve todos os sectores, muitos dos problemas que a linha defensiva vem sentindo resultam também das dificuldades que a linha média tem, tanto em garantir uma boa presença pressionante sobre o portador da bola, como em proteger alguns espaços importantes.
Enfim, talvez haja da minha parte alguma crueldade em começar por enfatizar os pontos negativos numa exibição com tanto feedback positivo, quer para a equipa, quer para os adeptos. O Sporting tem, de facto, e como venho escrevendo desde o inicio de época, motivos para acreditar numa boa época, porque tem um potencial técnico bastante elevado, o que se nota nomeadamente na capacidade da equipa para ter bola e gerir o jogo através da posse. Aqui, destacaria dois nomes. O primeiro é o mais óbvio, Nani. Já o escrevi várias vezes, mas não me canso de repetir que a sua aquisição foi um factor que mudou muito os destinos desta equipa. Tanto pela sua capacidade de desequilíbrio - e sobretudo por isto, não nos equivoquemos! - como pela sua capacidade para ter bola e em zonas onde os outros extremos do plantel não estão especialmente vocacionados para jogar. Depois, João Mário. O Sporting teve durante muito tempo em André Martins uma solução que trazia muito pouco à posição em que jogava. Nem acrescentava grande capacidade de presença em posse, nem capacidade de desequilíbrio. Com João Mário, o Sporting ganha outra capacidade para ter bola dentro do bloco contrário, e isso ajuda muito a equipa a afirmar-se territorialmente nos seus jogos. Por fim, falar dos centrais e da sua tão badalada falta de capacidade técnica. Neste jogo, o Sporting enfatizou muito pouco a circulação baixa, mas isso não impediu que tivesse feito um bom jogo com bola e num campo muito difícil de o conseguir. Aliás, não tem sequer impedido que o Sporting seja uma equipa de enorme presença em posse no campeonato (apenas superada pelo Porto, neste respeito). Ter maior capacidade técnica dos centrais ajudaria, sem dúvida, mas daí até se dizer que esse é um factor impeditivo para as aspirações da equipa vai um enorme e desmesurado exagero, como está bom de se ver...

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