28.6.06

O colectivo "caça-fantasmas"

ver comentários...
Apesar das gerações de futebolistas talentosos que lhe sucederam, o fenómeno Maradona nunca foi superado pela pátria Argentina, tornando a memória do astro numa espécie de “fantasma” sempre presente... Na Alemanha e quando tudo apontava para mais uma aparição do “fantasma Maradona”, a Argentina de Pekerman apresentou-se colectivamente bem organizada, com um sistema de jogo definido e com princípios de jogo adequados e ajustados às características dos seus intérpretes...

País de sangue latino e muito talento futebolístico, a Argentina depressa se tornou num crónico candidato à conquista de qualquer campeonato do mundo, fruto de sucessivas e abundantes gerações de jogadores de qualidade. Embora a dimensão do país, a sua paixão pelo jogo e a evidente empatia genética existente entre os jogadores argentinos e a bola sempre fosse suficiente para compor selecções fortes, a história do Futebol argentino é particularmente marcada por um jogador: Maradona. “El Pibe” tornou-se num Deus do Futebol argentino ao comandar a selecção à brilhante conquista de 86 e ao heróico segundo lugar no Itália 90. Maradona foi a referencia inevitável das selecções que integrou, sendo não só o centro de cada jogada mas a estrela de todos os momentos, numa hierarquia reconhecida e aceite por todos, quer dentro, quer fora do campo.
Apesar das gerações de futebolistas talentosos que lhe sucederam, o fenómeno Maradona nunca foi superado pela pátria Argentina, tornando a memória do astro numa espécie de “fantasma” sempre presente, sobretudo quando as camisolas alvi-celestes subiam ao relvado. A necessidade que a nação tinha em identificar uma figura que pudesse substituir Diego Armando Maradona em talento e protagonismo tornou-se uma obsessão (a alcunha “novo Maradona” foi desmesuradamente atribuída a jogadores como Ortega, Gallardo, Aimar ou Saviola) que passou para segundo plano questões fundamentais para uma eficiente regeneração da selecção, como a implementação de princípios de jogo colectivos que potenciassem o talento das novas gerações. O “fantasma Maradona” assombrou os colectivos argentinos nos anos que marcaram a viragem do milénio fazendo-os parecer órfãos de uma visão colectiva solidificada e demasiado reféns de desiquilíbrios individuais que nunca surgiam quando os momentos decisivos chegavam.
Na Alemanha e quando tudo apontava para mais uma aparição do “fantasma Maradona”, a Argentina de Pekerman apresentou-se colectivamente bem organizada, com um sistema de jogo definido e com princípios de jogo adequados e ajustados às características dos seus intérpretes, sendo por isso e, aos meus olhos, uma séria candidata ao erguer da “Copa”.




Princípios de jogo
A Argentina valoriza a posse de bola, não por uma ânsia “naif” de dominar as partidas mas por uma necessidade lógica de as controlar. A percentagem de posse de bola nem sempre define quem tem o controlo real do que se passa nas quatro linhas e no caso da selecção Argentina é frequente não ter a supremacia desta estatística controlando, ainda assim, as operações.
Quando não tem a bola a Argentina procura criar problemas à primeira fase de construção de jogo dos adversários colocando os dois homens da frente, mais o 10 na primeira linha do bloco (normalmente apenas uns metros acima da linha de meio campo) com o objectivo de reduzir linhas de passe e forçar o erro do adversário. O restante bloco, mais preocupado em manter a segurança defensiva do que em fazer uma recuperação rápida da bola, espera os adversários à frente da sua área, com 2 linhas compostas por 4 + 3 homens que pressionam lateralmente com a preocupação de colocar sempre mais homens na zona bola e evitar quaisquer possibilidade de desiquilíbrios individuais (particularmente os 1x1 nas alas).
Com bola, os argentinos procuram essencialmente duas formas de perigar a baliza contrária. Em transição, com a capacidade de desdobramento rápido dos médios em apoio aos avançados, e em ataque organizado, sem bolas pelo ar, fazendo “campo grande” (em largura e profundidade) e criando espaço para que o 10 (Riquelme) receba a bola e “comande” o ataque. Os argentinos são pacientes e podem trocar a bola repetidamente até porque se sentem confortáveis com ela, no entanto a posse de bola pretende a ser objectiva e a procurar roturas na defesa contrária, quer através de diagonais dos homens que partem das alas, quer pelas entradas nas costas de um dos laterais, procurando o desiquilíbrio na linha de fundo.

Sistema de jogo
Esqueleto em 4x1x2x1x2. Os laterais são os únicos com ordem para “tentar” a linha, explorando as costas dos extremos, que entram por regra em diagonal. O “trinco” (Mascherano) tem como missão, a defender, proteger a zona central e, a atacar, garantir o equilíbrio nas eventuais transições defensivas, bem como a conquista das segundas bolas. Os médios “interiores” têm missões distintas em posse de bola: um abre na ala (Maxi Rodriguez) dando largura ao ataque, o outro fica em zonas mais interiores (Cambiasso), de forma a oferecer linha de passe e dar continuidade à posse de bola ou a criar ropturas através de movimentos verticais. Estes jogadores são fundamentais nas transições, quer no desiquilíbrio que podem criar (transições ofensivas), quer no balanceamento que devem ajudar a garantir (transições defensivas). O 10 tem uma função tradicional, procurando a bola em construção para poder ser a mais valia na distribuição (quer em qualidade, quer em “tempo”). Os avançados pressionam e, em posse de bola, um (Saviola) dá largura colocando-se numa das alas e entrando em diagonal. O outro (Crespo) procura os espaço na zona central, podendo procurar aproveitar o espaços que a estratégia defensiva adversária conceder, seja nas costas dos defesas, seja no espaço interior, funcionando como “pivot”.

Individualidades
- Abbondanzieri é o guarda-redes, quase incógnito para quem “vive” essencialmente o futebol europeu... um potencial ponto fraco.
- Scaloni e Sorin, nas laterais, são dinâmicos a atacar e rápidos a recuperar posições. A debelidade que ambos sentem no 1x1 pode ser um problema, mas é amplamente disfarçada pela movimentação zonal do bloco. Sorin é um exemplo quase único pela diversidade de movimentos ofensivos que protagoniza!
- Também os centrais, Heinze e Ayala beneficiam da boa cobertura lateral desta selecção. São centrais que jogam de “dentes cerrados”, fortes no posicionamento e no desarme, mas sem grande estatura...
- Mascherano é o “trinco”. A dureza, própria dos genes argentinos e o grande sentido posicional são as suas características.
- Cambiasso e Maxi marcam os equilíbrios e desiquilíbrios da equipa. São a principal força do “motor” Argentino. Exemplares no cumprimento das suas funções tácticas, têm excelente sentido de desmarcação e as suas movimentações já resultaram em vários golos.
- Riquelme é um 10 nato, o “timoneiro”. Encanta pela forma “à Zidane” como trata a bola e pelos passes que consegue. Tem como pontos fracos alguma “sonolência” defensiva e alguns momentos em que “absorve” a posse de bola impedindo uma circulação mais dinâmica da mesma.
- Na frente, Crespo é um matador nato e Saviola um jogador fortissimo em espaços curtos, capaz de furar sozinho as defesas. A Saviola faltará naturalidade nas diagonais que lhe são pedidas, já que não é essa a sua função de origem.
- No banco, Pekerman tem alternativas de sobra em todas as posições. Destacam-se Tevez e Messi os jogadores “da moda” desta selecção tal o virtuosismo que sai dos pés dos dois jovens. São alternativas habituais para o ataque e concedem sobretudo mais mobilidade ao ataque.



ler tudo >>

21.6.06

Scolari - Um legado para o futuro

ver comentários...


Quando a FPF apontou Scolari para o cargo de seleccionador nacional achei, como muitos, que o nosso país tinha cultura, tradição e talento mais do que suficientes para não ter de importar “know-how” estrangeiro em matéria de futebol... O Europeu passou, também a qualificação para o Mundial e ao longo deste tempo a minha opinião sobre o “Sargentão” alterou-se radicalmente!... Com ele não se repetiram casos “Saltillo”, Paula ou o caso do Mundial da Coreia... Scolari mostrou parte de um caminho que deve continuar a ser percorrido para que a Selecção se torne cada vez mais não só o “Clube de todos nós”, mas também um Clube ganhador.

Quando a FPF apontou Scolari para o cargo de seleccionador nacional achei, como muitos, que o nosso país tinha cultura, tradição e talento mais do que suficientes para não ter de importar “know-how” estrangeiro em matéria de futebol. As exclusões de históricos como Baía e João Pinto sem que tivesse sido dada qualquer justificação e as embaraçosas exibições da Selecção na preparação para o “nosso” Europeu foram-me convencendo de que as minhas desconfianças iniciais não eram desprovidas de razão. Afinal Scolari tinha sido Campeão Mundial, sim senhor, mas pelo Brasil e num Mundial em que os seus principais adversários foram caindo antecipadamente (França e Argentina nem sequer passaram da primeira fase...). Para mais, era um treinador Sul-Americano sem qualquer experiência europeia com a responsabilidade de preparar um Campeonato...Europeu!
O Europeu passou, também a qualificação para o Mundial e ao longo deste tempo a minha opinião sobre o “Sargentão” alterou-se radicalmente! A Selecção Portuguesa sempre sofreu de vários males, uns muito próprios da nossa realidade cultural e futebolistica como a indisciplina vivida nos estágios e a “clubite” sentida aos mais variados níveis, e outros próprios de todas as selecções e que têm a ver com a escassez de tempo para trabalhar, quer o modelo de jogo, quer o próprio espirito de grupo, essencial para a criação uma dinâmica colectiva. Scolari não terá sido um milagreiro mas a sua conduta conseguiu resolver muitos destes problemas: Com ele não se repetiram casos “Saltillo”, Paula ou o caso do Mundial da Coreia e foram excluidos pela primeira vez jogadores dos planos de preparação por motivos ligados à indisciplina e à falta de atitude para com a Selecção (Conceição, Meira e Maniche foram afastados depois do jogo com a Espanha na preparação para o Euro). Adoptou um modelo e sistema de jogo (4-3-3) e compôs um grupo para o fazer evoluir. Um grupo que não era composto por uma selecção dos jogadores que estavam em melhor forma nos mais variados momentos, uma espécie de prémio de performance, mas um grupo de pessoas que trabalham a prazo para um atingir um objectivo comum.
Scolari mostrou parte de um caminho que deve continuar a ser percorrido para que a Selecção se torne cada vez mais não só o “Clube de todos nós”, mas também um Clube ganhador. Um caminho cujo próximo trilho deverá ser preparado quando Scolari abandonar a selecção (julgo não ser conveniente que fique para além de 2006) e poderá passar pela implementação de algumas ideias que têm sido expostas por Mourinho em relação à metodologia de trabalho nas selecções... Esta evolução não será porém fácil. É preciso
visão e coragem, dois atributos que não estou certo que abundem em quem manda...

ler tudo >>

AddThis