30.8.06

Liga 06/07 – Façam-se as apostas!

ver comentários...

Não foi para todos, mas começou! À margem do caso “Mateus” e no respeitante ao simples “pontapé na bola”, o campeonato deu-nos uma visão ainda distorcida daquilo que será a realidade da época 06/07 – a agitação final do mercado e as peripécias de pré-temporada condicionaram, nuns casos mais do que noutros, um arranque já coincidente com as pretensões dos mais variados treinadores... Entre os três grandes, o ponto de situação é diferente caso-a-caso, não havendo porém nenhum que possa reclamar uma total tranquilidade: Façam-se as apostas!

FC Porto – Uma questão filosófica
“O FC Porto tem uma estrutura que conhece bem, e vamos evoluir para outra... temos de equilibrar mais esta equipa.” (Jesualdo Ferreira, após a estreia vitoriosa com o Leiria)

Da confirmação de Jesualdo Ferreira como treinador do FC Porto adveio a certeza de que o futebol no Dragão iria forçosamente mudar em 06/07. Muito mais do que o sistema – o 3x4x3 de Adriaanse ou o 4x3x3 normalmente adoptado por Jesualdo – trata-se de uma questão quase filosófica.
Adriaanse passava as suas conferências de imprensa a falar de espectáculo, de golos e de goleadas e, embora o seu FC Porto fosse mais vezes eficaz do que entusiástico, a verdade é que as palavras do teimoso Holandês encontravam eco no modelo de jogo por si implementado: avançados, extremos, pressão alta e posse de bola sempre no meio campo adversário eram alguns dos ingredientes da “fórmula Co”.
Jesualdo Ferreira tem uma visão diferente – quase radicalmente diferente. O futebol para o “professor” faz-se de trás para a frente ou seja, primeiro há que garantir a interiorização dos processos defensivos, vindo apenas posteriormente a preocupação pelo golo. Expressões como “equilíbrio defensivo” e “reconhecimento do momento de transição” são comuns no discurso de Jesualdo e dizem muito sobre um ideal futebolístico bem distante daquele que marcou as palestras no Dragão durante o último ano.
Face ao exposto, as próximas lições do “professor” no Olival deverão ser, mais do que trabalhosas, importantes: importantes no curto-prazo desportivo e no médio-prazo financeiro. Isto é, a rápida assimilação dos processos pretendidos por Jesualdo Ferreira influenciará não só o número de pontos do clube no primeiro terço da época, mas também (e mais importante) a receita que a SAD portista recolherá da sua presença na Champions League deste ano – tendo em conta a proximidade do ínicio da prova, os riscos de uma não tão rápida adaptação colectiva aos processos de Jesualdo são evidentes. Num mero exercício especulativo aqui ficam alguns dos potenciais problemas (uns mais saudáveis do que outros) do ex-lider bracarense:

- Duelo Helton/Baía
- Re-adaptação de Pepe a uma defesa a 4 (onde ainda não se revelou tão capaz como nos sistemas a 3)
- O outro elemento da dupla de centrais (face à ausência de Pedro Emanuel, a capacidade de Bruno Alves e Ricardo Costa levanta algumas dúvidas)
- Falta de competitividade nas laterais defensivas
- Um meio-campo a 3 diminui o número de vagas num sector já muito concorrido

Benfica – Novas ideias sobre o mesmo esqueleto
Protagonista indirecto do deprimente caso “Mateus”, o Benfica dificilmente poderá invocar qualquer prejuizo desportivo (financeiramente, a história não será bem a mesma) proveniente do adiamento do seu primeiro jogo. A extensa lista de lesões e as dificuldades que Santos tem sentido para impôr o seu modelo conseguem enganar tanto como o algodão do anúncio: qualquer momento seria melhor do que este para a estreia na liga, tanto mais que com a redução do número de clubes haverá certamente espaço para uma recalendarização confortável...
Calendários à parte, na Luz a saga Simão parece ter tido como efeito prático a reintegração do capitão no plantel de Fernando Santos, transformando o regresso ao 4x3x3 em, mais do que uma opção, numa inevitabilidade! Assim, o relvado da Luz voltará a “descair” para o lado em que o capitão alinha, concentrando na velocidade e técnica do extremo grande parte das esperanças para desbloquear as defesas numerosas que se lhe oporão – Simão é um jogador demasiado valioso no futebol português, não sendo possível que uma equipa como o Benfica menospreze de alguma forma o seu papel no processo ofensivo. De resto, a formação de Santos será na sua natureza aquilo que usualmente é designado por “equipa ofensiva”, tendo como princípios orientadores do seu jogo a recuperação e posse de bola no meio-campo adversário, pretendendo ter uma postura dominadora nas partidas em que intervém.
As exibições de ínicio de temporada mostraram uma equipa ainda longe dos níveis exigiveis para um verdadeiro candidato e aparentemente desenquadrada com a sua própria orientação estratégica. Não creio que estes possam ser problemas minimamente negligenciaveis, no entanto não constituem ainda motivo suficiente para excluir à partida o Benfica da linha da frente da corrida para o título: na Luz moram, salvo melhor opinião, o mais capaz quarteto defensivo do campeonato (embora não preveja que venha a ser a defesa mais eficaz), um meio campo completo, talentoso e experiente e um ataque com alternativas em quantidade e qualidade. O futebol tem porém poucas memórias de problemas colectivos resolvidos sustentadamente por soluções individuais, e é por aqui que ganha importância o muito trabalho que Fernando Santos tem ainda pela frente, num clube onde as ocorrências de pré temporada dificilmente poderiam ter sido mais desestabilizadoras... Aqui ficam alguns dos potenciais dilemas de Fernando Santos:


- A luta “a três” pela baliza (resultará em frustração de pelo menos um dos competidores)
- Os princípios de Santos resultarão em situações de exposição espacial nas costas da defesa – situação menos confortáveis para defesas como Luisão
- O estatuto “super-vedeta” de Simão perante si próprio e o grupo (eventual desmotivação)
- A adaptação de Rui Costa ao 4x3x3 e a Simão – O 10 sempre pareceu mais talhado para jogar descomprometido de tarefas defensivas e a servir (magistralmente) ataques compostos por 2 atacantes, servindo bolas para as costas dos defesas adversários
- Plantel construido para o 4x4x2 parece ter excesso de avançados e carência de extremos de qualidade – Miccoli dificilmente poderá ser utilizado como extremo clássico, sendo uma alternativa a utilização de um 4x3x3 “à Barcelona” (com extremos geneticamente diferentes um do outro)

Sporting – Do pragmatismo à concentração
Sven Goran Erikson disse uma vez que a realidade tem o seu lugar algures no espaço intermédio entre a optimismo proveniente das vitórias e a pessimismo inevitavelmente resultante das derrotas. A pré época do Sporting terá precisamente desenvolvido algum exagero em torno de uma equipa que dentro das suas limitações, tem de facto muito de bom! Se há uma palavra que pode descrever este Sporting versão 06/07, essa palavra é “pragmatismo”. Pragmatismo nos recursos utilizados na construção da equipa (composto a partir de um orçamento realista e limitado, de aquisições a “custo zero” e tirando o máximo partido daquilo que melhor o clube tem: a sua formação) e pragmatismo na forma como a equipa aborda os seus jogos (tendo no equilíbrio e concentração os seus predicados e esperando sempre matar o jogo nos erros do adversário).
O jogo com o Boavista terá, neste contexto, representado um importante alerta para a equipa: Em competição (muito mais do que em fase meramente preparatória) é preciso estar-se altamente concentrado, ser agressivo e dinâmico, dependendo o sucesso do Sporting na época desportiva que agora se ínicia do cumprimento estrito destas premissas. É precisamente por aqui que residem as principais ameaças para Paulo Bento - É certo que uma recriação em 06/07 do “seu” Sporting de 05/06 dificilmente será batida, tal a regularidade e eficácia demonstradas (apenas 5 golos sofridas na 2ªvolta). Os desafios da nova época são porém bastante mais abrangentes, exigindo a manutenção de um alto nível competitivo durante mais jogos, mais competições e, essencialmente em mais jogadores. Paulo Bento terá então como missão passar as suas ideias e os seus processos de forma igualmente fiável a um número elevado de jogadores, desenvolver anti-corpos para as oscilações psicológicas que inevitavelmente atingem as equipas num espaço tão largo como uma temporada e manter os níveis de concentração constantemente elevados em jogos com intensidades motivacionais profundamente dispares. Aqui ficam alguns dos problemas que se podem perspectivar para Paulo Bento:

- Os centrais
– Apesar da eficácia colectiva, o Sporting não possui nem em quantidade nem em qualidade grandes soluções nesta posição - Gestão de expectativas num meio-campo onde existem variadas opções - A qualidade criativa do meio-campo está amplamente dependente de jogadores cuja história não deixa perspectivar grande regularidade: Carlos Martins e Romagnoli
- O ataque para além de Liedson – O modelo táctico de Paulo Bento faz depender muito a sua dinâmica ofensiva da capacidade dos seus avançados (não só de finalizar mas também de criar). Nesse aspecto, Paulo Bento ainda não conseguiu encontrar opções de clara credibilidade


ler tudo >>

23.8.06

“O Maior Espectáculo do Mundo”

ver comentários...
A Premier League é hoje a competição desportiva mais vista em todo o mundo e os seus clubes respiram uma saúde económica e financeira invejável... no inicio da década de 90 o campeonato inglês sofreu uma alteração estrutural de relevo que passou a direccionar a organização do jogo no sentido da profissionalização, fomentando uma cultura de espectáculo do futebol e percebendo a necessidade de, colectivamente promover e desenvolver o “produto futebol” dentro e fora das fronteiras britânicas... Em Portugal a visão sobre esta problemática é limitada - quase nula – prevalecendo uma cultura clubista, sem estratégia comum e onde apenas os grandes clubes vão modernizando o seu relacionamento com a respectiva massa adepta... as consequências do “agigantamento” inglês são uma ameaça bem real!


As aparências iludem de facto - diversas vezes somos confrontados com situações que em quase tudo se aparentam mas que em quase nada são verdadeiramente iguais. Em certa medida é também isso que acontece quando descontraidamente assistimos ao início de cada um dos campeonatos que nesta altura protagonizam a “reentre” futebolística, sem percepcionar a importância que diferencia cada um dos momentos observados... Abandonado ao seu próprio destino depois da tragédia de Heysel Park e desconsiderado durante por mais de uma década pela pobreza técnica do seu estilo “Made in England” – o “Kick n’ Rush” – o Campeonato Inglês é hoje um caso de inegável sucesso no panorama desportivo mundial, tornando-se em muito mais do que uma competição atractiva: no “Maior Espectáculo do Mundo”...
O acórdão Bosman e o “boom” das receitas televisivas formam um cocktail que reorientou radicalmente as coordenadas na Europa do futebol, gravando para sempre a importância do final da década de 90 na história do jogo. Como em qualquer mudança, saem reforçados (ou em última análise, sobrevivem) aqueles que mais rapidamente a ela se adaptam. No caso do futebol inglês, a grande virtude estará, mais do que na adaptação, na antecipação da mudança – no inicio da década de 90 o campeonato inglês sofreu uma alteração estrutural de relevo que passou a direccionar a organização do jogo no sentido da profissionalização, fomentando uma cultura de espectáculo do futebol (não confundir este conceito com “futebol espectáculo” – um erro de muitos!) e percebendo a necessidade de, colectivamente promover e desenvolver o “produto futebol” dentro e fora das fronteiras britânicas.
A paixão pela modalidade e a dimensão socioeconómica do país representavam uma vantagem natural, sem dúvida, contudo não poderá ser esta uma explicação suficiente para justificar todo o caminho percorrido desde o inicio da década de 90: a Premier League é hoje a competição desportiva mais vista em todo o mundo (mais de mil milhões de telespectadores repartidos por 195 países) e os seus clubes respiram uma saúde económica e financeira invejável. A lógica é simples: quanto mais visto for o campeonato, mais interesse gera nos patrocinadores, mais receitas conseguem os clubes, mais disponibilidade existe para pagar a (muitos e bons) jogadores e maior interesse é gerado no público. Trata-se pois de um ciclo de valor que há muito foi percepcionado pelos responsáveis ingleses tendo estes implementado uma estratégia que, a tempo e horas começou a colher os seus frutos. Acções promocionais levadas a cabo em todo mundo (particularmente no mercado asiático onde já se realizaram torneios especiais com equipas inglesas em 2003 e 2005), a criação de magazines semanais sobre a competição e uma cultura de defesa e valorização do jogo e do espectáculo são apenas algumas das diligências que aos olhos de toda a gente foram postas em prática.
Não sendo, a meu ver, o melhor dos campeonato sob ponto de vista estritamente futebolístico, a Premier League consegue, para a maioria de nós, ser hoje o mais atractivo – algo apenas alcançado através do respeito e culto de um valor essencial: o espectáculo do futebol (mais uma vez, não confundir “futebol espectáculo”).

Uma ameaça real...
Para o futebol português as consequências do “agigantamento” inglês são uma ameça bem real!
Em Portugal a visão sobre esta problemática é limitada - quase nula – prevalecendo uma cultura clubista, sem estratégia comum e onde apenas os grandes clubes vão modernizando o seu relacionamento com a respectiva massa adepta (as campanhas promocionais vistas nos três grandes não encontram paralelo na generalidade dos clubes nacionais). Os grandes clubes europeus estão assim a conquistar lenta mais seguramente o seu espaço entre as preferências dos adeptos lusos, sendo esta uma situação evidentemente preocupante: o maior prejuízo recairá, sem surpresas, sobre os mais pequenos que dificilmente poderão manter a sua condição de profissionalismo face à escassez de receitas que inevitavelmente resultará de uma redução progressiva do número de adeptos. Os clubes grandes, por seu lado, manterão o seu estatuto aquém fronteiras, mas ficarão cada vez mais isolados e distantes do poderio económico (e por conseguinte, desportivo) dos grandes europeus.
Este é um cenário que assombra o futuro dos países (uns mais do que outros) fora do poderoso quinteto formado por Inglaterra, Espanha, Itália, Alemanha e França e que deverá alterar ainda mais a forma como até hoje percepcionamos o futebol europeu.

ler tudo >>

14.8.06

O "Xeque ao Rei" de Adriaanse

ver comentários...

O FCP viu-se na posição embaraçosa de estar “de mãos atadas” perante os desabafos provocatórios do seu treinador... O “embaraço Adriaanse” não é então mais do que uma inevitabilidade lógica de uma gestão pouco avisada da SAD portista...a obtenção dos objectivos desportivos em 06/07 não estão ainda em nada comprometidos, no entanto existe um risco inerente a uma não tão rápida adaptação do próximo treinador ao clube e aos jogadores...o que realmente conta são as vitórias e será essencialmente delas que Pinto da Costa, mais do que nunca nesta altura dependerá.

Atentemos à sequência das afirmações:
- "não vamos contratar ninguém" (Pinto da Costa, 27-07-2006)
- "Se não comprarmos um avançado continuaremos a jogar bonito e a perder" (Co Adriaanse, 05/08/2006)

Contextualizando-as é intuitivo perguntar:
- Perante tão evidente rotura entre treinador e direcção, porque razão não foi Adriaanse dispensado a tempo de um planeamento mais eficaz da próxima temporada?

A resposta será a mesma que foi dada pelo presidente azul e branco quando indagado sobre os motivos da não contratação de Hesselink: Dinheiro, ou melhor, a falta dele!

Apenas dois anos após a apresentação do relatório e contas anual mais lucrativo da história das SAD do futebol português, o FCP viu-se na posição embaraçosa de estar “de mãos atadas” perante os desabafos provocatórios de um treinador em clara rotura com a direcção e blindado pela extensão plurianual do seu contrato, altamente valiosa em caso de despedimento antecipado.


(Carregar na imagem para ver evolução das contas da Porto SAD)

O “embaraço Adriaanse” não é então mais do que uma inevitabilidade lógica de uma gestão pouco avisada da SAD portista, incapaz de antecipar uma realidade iminente e previsível e que exigia que o caminho do equilíbrio orçamental fosse trilhado, sobretudo no que respeita ao peso desmesurado dos seus custos com o pessoal – ou seja, os salários de jogadores.
O problema do equilíbrio orçamental das SAD é comum aos três grandes do futebol português, e só a sua resolução permite a independência das receitas extraordinárias – vendas de passes de jogadores - que ano após ano condicionam o nível qualitativo dos planteis. A questão é conceptualmente simples: quando o que se ganha (publicidade, merchandising, direitos televisivos, bilheteira,...) não chega para pagar o que se gasta (salários, manutenção, prémios de jogo, ...), é necessário obter mais valias provenientes da venda de jogadores.
A peculiaridade do caso da Porto SAD deriva do facto do incontornável caminho do equilíbrio orçamental ter sido identificado há já alguns anos sem que, no entanto, tenha sido verdadeiramente percorrido pela sociedade. Por paradoxal que possa parecer, o problema aparenta derivar dos muitos milhões conseguidos no rescaldo das recentes glórias europeias, uma benesse que aparentemente terá ofuscado a visão pragmática da realidade e desviado a SAD do caminho inicialmente delineado ( a prioridade no final de 03/04 passou a ser a “componente variável” das remunerações). O resultado desta “miragem” da gestão portista é, à entrada de 06/07, uma forte dependência das mais valias em vendas de passe de jogadores – provavelmente será hoje a SAD que mais depende deste tipo de receitas entre os 3 grandes – e um valor de capitais próprios bem próximo do registo ao final de 02/03 (ou seja, antes da injecção milionária conseguida com a conquista da Champions). Nesta altura e face ao desequilíbrio corrente que a SAD azul e branca apresenta (-17M€ em 9 meses), o cenário de falência-técnica – capitais próprios negativos - tem de ser encarado como uma possibilidade, o que estando longe de ser um drama de sobrevivência, não deixa de ser um grande embaraço para a reputação da actual Administração.

O período pós-Adriaans
e

Face ao exposto não será dificil de perspectivar a importância que os próximos meses terão para Pinto da Costa. A qualidade e capacidade do plantel portista é indiscutível e a obtenção dos objectivos desportivos em 06/07 não estão ainda em nada comprometidos, no entanto existe um risco inerente a uma não tão rápida adaptação do próximo treinador ao clube e aos jogadores – a fase de grupos da Liga dos Campeões começa a decidir-se nos primeiros meses da temporada. Por outro lado, a exigente plateia do Dragão dificilmente tolerará mais uma época como aquela que sucedeu as glórias europeias de José Mourinho. O crédito do líder portista é, ao fim de quase 25 anos, muito e merecido mas o nível das recentes diligências do Presidente parecem distantes de um passado não tão longinquo quanto isso: Os casos da vida pessoal, o envolvimento no caso “apito-dourado”, a súbita incapacidade para gerir e escolher treinadores e a gestão duvidosa no período pós-Mourinho (contestada até pela principal claque portista) terão deixado as suas marcas. Nestas coisas do futebol, porém, o que realmente conta são as vitórias e será essencialmente delas que Pinto da Costa, mais do que nunca, nesta altura dependerá...


ler tudo >>

7.8.06

"Case study" do golo

ver comentários...
No habitual processo de intenções a que os treinadores se submetem no lançamento de cada temporada há sempre espaço para os discursos sobre a necessidade de jogar não só bem mas bonito, de entreter e essencialmente de enraizar a cultura do golo nas equipas como forma de trazer o público aos jogos (honestamente, essa é uma visão que sendo agradável me parece descontextualizada com as verdadeiras motivações dos adeptos, mas não é esse o ponto que proponho aqui abordar). Partindo para o objectivo da “cultura do golo”, qual será então o modelo que se deve adoptar?

Analisando 6 casos que no passado recente foram bem sucedidos no que ao balançar de rede diz respeito, chegamos à conclusão de que não existe uma fórmula exacta, um sistema chave, um conjunto de características que sendo satisfeitas garantirão a concretização de muitos golos. Outra das ilações a tirar é a de que o futebol ofensivo e concretizador nem sempre traz sucesso às equipas e nem sempre será o mais recordado pelos adeptos das respectivas equipas. Há porém alguns aspectos comuns aos 6 casos analisados: a procura de provocar o erro no adversário, a existência de padrões base na composição das equipas em termos ofensivos (sejam a mobilidade e criatividade – Arsenal e Sporting - a velocidade – Barcelona e Benfica – ou a intensidade elevada de jogo – Milan e Porto) e a definição implícita de um elemento chave nos processos ofensivos das equipas, esteja ele presente na construção (1ª ou 2ª fase) ou na finalização.

FC Porto – 2002/2003 – José Mourinho – 73 golos no campeonato – 1º Lugar
Foi na época(completa) de estreia de José Mourinho à frente do FC Porto que, estou em crer, se viu o futebol mais atractivo da sua era de sucesso enquanto treinador principal. Ao contrário do que sucedeu em épocas posteriores o Porto versão 2002/2003 foi uma equipa com uma vocação ofensiva constante, tendo conseguido muitos golos em todas as competições em que participou (e venceu). Mourinho montou uma equipa à base de jogadores ex-Leiria, recuperou Maniche e Costinha e lançou Deco para a galáxia das “super-estrelas”. O Porto protagonizava um futebol intenso desde o primeiro minuto, minimizando o tempo de respiração dos adversários para depois lançar a criatividade mágica de Deco, as diagonais desconcertantes de Derlei ou os momentos de 1x1 de Capucho para conseguir as suas inúmeras ocasiões de golo (muitas vezes finalizadas por Postiga, o goleador da equipa no campeonato com 13 golos). Para além das virtudes ofensivas o Porto 2002/2003 era também equilibrado nos processos defensivos, tendo dominado internamente e conseguido a brilhante conquista europeia de Sevilha. Para a memória ficam, entre outros, a meia-final com a Lazio (4-1) ou a goleada em Barcelos (5-3).



Benfica – 2002/2003 – Camacho – 74 golos no campeonato – 2º Lugar
A época não começou bem na Luz com Jesualdo a ser demitido após a humilhante eliminação da Taça frente ao Gondomar. Seguiu-se um curto período em que Chalana descobriu o excelente lateral que havia em Miguel e, finalmente, Camacho. O ex-seleccionador espanhol conseguiu devolver ao Benfica um futebol como não se via há quase uma década, impondo as suas características de homem de balneário e desenvolvendo um modelo de jogo sem grandes complexidades, mas que respeitava aquilo que de melhor havia no plantel encarnado. A dinâmica das alas era a principal virtude da equipa e Simão a sua principal figura, um jogador capaz de arrancar desequilíbrios constantes e com uma veia goleadora assinalável (18 golos, sendo com Fary o melhor goleador da prova). Como alternativa às arrancadas de Simão a equipa contava com a classe de Nuno Gomes (9 golos), os momentos de Zahovic e Geovanni, mas sobretudo com os movimentos sem bola daquele que seria a grande revelação da temporada: Tiago (13 golos). As goleadas ao Paços de Ferreira (7-0) e Setúbal (6-2) foram exemplos da capacidade explosiva de uma equipa que acabou por ser uma das vítimas da passagem do “furacão Mourinho” pelo futebol português.

Sporting – 2004/2005 – Peseiro – 66 golos no campeonato – 3º Lugar
Não foi num ápice que a máquina ofensiva de Peseiro começou a carburar. Os discursos de intenção do treinador ribatejano não coincidiram com a qualidade das primeiras prestações do Leão 2004/2005. O tempo acabaria porém por provar que o trabalho estava a ser bem feito e o Sporting por protagonizar um futebol encantador quer interna, quer externamente. Com sede de bola, a formação de Peseiro procurava recuperá-la cedo para depois fazer aquilo que os seus jogadores mais gostavam: a circulação de bola em apoio - trocas de bola deliciosas que envolviam todos os elementos da equipa, desde Ricardo a Liedson. A ordem era para jogar bem e com muita mobilidade. A virtude da equipa estava claramente na qualidade e quantidade de soluções existentes no meio campo do Sporting para protagonizar este tipo de futebol: Custódio, Rochemback, Pedro Barbosa, Hugo Viana, Sá Pinto, Carlos Martins, Rogério, Tello, Douala e a “prenda de Natal” João Moutinho. À frente desta parada de artistas Peseiro contava com um homem que pela sua influência e particularidade se tornava na principal referência de todo o jogo ofensivo da equipa: o goleador Liedson (25 golos). Na retina terão ficado as exibições como as conseguidas com o Newcastle (4-1) ou Boavista (6-1). O Sporting de Peseiro ficará também conhecido pela rápida descida “do céu ao inferno”, tendo perdido o campeonato e a Taça UEFA no curto espaço de uma semana e pela desorganização em que a equipa era apanhada nos momentos de transição defensiva – tudo em prol do golo!

Arsenal – 2004/2005 – Arsene Wenger – 87 golos no campeonato – 2º Lugar
Em 2004/2005 o Arsenal de Arsene Wenger partia para o campeonato como Campeão invencível e principal candidato à revalidação do seu titulo. As coisas podem não ter corrido da melhor forma para os Gunners que não contariam com a dimensão do “efeito Mourinho”, mas para história terá ficado a mais bem conseguida fórmula ofensiva engendrada pelo técnico Francês. Com a super-estrela Henry (sagrou-se goleador-mor da Premiership com 25 golos) como referência ofensiva, Wenger compôs uma formação capaz de baralhar qualquer defesa através da movimentação ofensiva dos seus homens, sem utilizar extremos-natos para conquistar a linha mas tendo como prioridade conseguir penetrações interiores com a “bola no pé”. Sem menosprezar a função de “suporte” realizada pelos sectores mais recuados, é impossível ignorar as soluções existentes para o quarteto ofensivo dos Gunners – Ljungberg, Pires, Henry, Bergkamp, Van Persie, Aliadere, Reyes, Pennant – todas elas com três denominadores comuns: técnica, mobilidade e repentismo.




Barcelona – 2005/2006 – Rijkaard – 80 golos no campeonato – 1º Lugar
2005/2006 ficará no registo como uma das épocas mais gloriosas do clube blaugrana deixando importantes títulos para o museu – o Campeonato e a muito ambicionada Champions League – e grandes jogadas para a memória dos adeptos “Culé”. Rijkaard, que não teve tempos fáceis nos primeiros meses como treinador, conseguiu em 05/06 a afirmação e consolidação definitiva de um modelo de jogo que tem por base uma equipa cuja técnica e velocidade não encontram, em muitos momentos da história, paralelo. De resto, o esqueleto 4x3x3 ganha dinâmica através de 4 premissas básicas impostas pelo ex-trinco do Milan: Pressão alta; Subida dos laterais, fazendo o “Overlapping”; Jogo apoiado no centro, com Deco como principal referencia nesta zona; Prioridade para “encontrar” Ronaldinho, pondo este toda o seu génio ao serviço da equipa, solicitando os movimentos de rotura de Giuly ou Eto’o ou encontrando ele próprio os desequilíbrios que possibilitem a penetração. Rijkaard teve o mérito de voltar a mostrar ao mundo uma equipa com genética de ataque, sendo simultaneamente dominadora à escala planetária e, paralelamente, de encontrar um modelo que potenciasse um “génio preguiçoso” (Ronaldinho Gaúcho) quando este tipo de jogadores pareciam marginalizados pelas exigências do futebol moderno.


AC Milan – 2005/2006 – Ancelotti – 85 golos no campeonato – 2º Lugar
No país do rigor táctico e do catenacio, não há memória de uma equipa com uma média de golos tão elevada como o Milan 2005/2006. Ancelotti compõs um modelo com uma dinâmica e eficácia ofensiva invulgar e destruidora quer através das letais transições ofensivas, quer através da sublime capacidade de encontrar espaços em quase todos os espaços defensivos dos adversários. Pirlo, o atipico pivot defensivo, é o principal responsável pela coordenação de todo o jogo ofensivo. Kaka e Shevchenko protagonizam movimentos imprevisíveis, quase caóticos, explorando quer o espaço entre linhas, quer a zona dos laterais. Inzaghi é o finalizador, um jogador que gosta de jogar no erro do adversário e de aproveitar as costas dos defesas quando estes colocam os olhos na bola. Seedorf oscila entre a largura, encostando sobre a esquerda, e o equilíbrio interior. Finalmente os laterais, elemento fundamental para a largura de jogo ofensivo da “squadra” de Ancelotti - uma vez que não existem extremos no esqueleto traçado: 4x3x1x2 – normalmente alinha apenas um lateral de características claramente ofensivas actuando quase como extremo (ou Cafu na direita, ou Serginho na esquerda). Não deixa de ser curioso que uma equipa tão invulgarmente concretizadora não tenha terminado em 1º Lugar – talvez seja esta apenas mais uma lição táctica

ler tudo >>

AddThis