31.3.14

Notas do Braga - Benfica

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Prioridade à estratégia, com prejuízo para o entretenimento
Apesar da importância da vitória, claramente, este foi um jogo que não entusiasmou os adeptos do Benfica, que provavelmente esperariam outra exibição perante um Braga muito descaracterizado. Aqui, parece-me, há duas vertentes a considerar. Uma, que é inquestionável, tem a ver com as dificuldades - também a meu ver, surpreendentes - que o Benfica teve em se aproximar mais claramente do golo ao longo dos 90 minutos. Outra, que não pode ser ignorada ou descontextualizada, é a prioridade estratégica que o Benfica assumiu na gestão do jogo. Analisando o jogo por partes, na primeira o Benfica forçou mais a saída em apoio, mas encontrou sempre grandes problemas em entrar com eficácia no bloco do Braga que, com mérito próprio, foi conseguindo provocar o erro na posse do Benfica, o que oferecia um risco elevado para a segurança da equipa. Provavelmente por isto, o Benfica inverteu os papeis na segunda-parte. Ou seja, arriscou menos com bola, construindo preferencialmente de forma longa, o que lhe retirou fluidez e presença em posse, mas passando para o Braga o risco de exposição por perda em posse. O resultado foi que nem o Braga conseguiu tirar partido da sua maior presença em posse, nem o Benfica conseguiu capitalizar alguma das transições que o seu pressing iniciava, culminando num jogo de muito poucas ocasiões, o que retirou espectacularidade ao jogo, é verdade, mas que acabou também por convergir para aquelas que eram as pretensões essenciais do Benfica.
Esta abordagem estratégica e muito calculista não é nova no Benfica de Jesus e várias vezes se repetiu ao longo da época. Não quer isto dizer que o objectivo seja não marcar, mas antes que a prioridade é não sofrer. Depois, umas vezes consegue-se mais em termos ofensivos, outras vezes - como foi o caso - nem por isso.

Dificuldades na construção e o eclipse de Enzo
Grande parte das dificuldades de afirmação do Benfica no jogo resultam, de facto, do sucesso da estratégia do Braga no condicionamento pressionante sobre a construção encarnada. O Braga, aqui, reserva para si grande parte do mérito, já que nem sempre é fácil conseguir fazer o que a equipa de Jorge Paixão fez frente ao Benfica, nesta fase especifica do jogo. O Benfica usa muito bem a largura da sua primeira linha para atrair o adversário e depois potenciar espaços para verticalizar e entrar no bloco contrário, como aconteceu por exemplo frente ao Sporting.
O sucesso da estratégia do Braga, na minha leitura, teve 2 pontos chave. O primeiro foi o condicionamento lateral, feito por Rusescu e Micael, que limitou o uso da largura por parte do Benfica. O segundo foi a neutralização da acção de Enzo, uma unidade essencial na dinâmica da equipa, mas que, como o próprio Jesus comentou no final da partida, não conseguiu a sua habitual influência no jogo. Aqui, parece-me ter havido uma nuance estratégica por parte de Paixão para o condicionamento de Enzo, com Luiz Carlos a posicionar-se muitas vezes em função do médio argentino e a limitar muito a sua acção, praticamente desde o momento da recepção. Não se tratou de um acompanhamento individual a todo o campo - Luiz Carlos jogou sempre como interior-direito - mas de uma valorização especial dada à referência individual quando a equipa assumia uma presença mais pressionante. O Benfica e o próprio Enzo poderiam ter respondido de outra forma a esta estratégia, é verdade, mas o facto é que o Braga acabou por retirar proveito desta iniciativa do seu treinador. Já agora, relembrar que também em Alvalade Paixão havia definido um acompanhamento individual - aí ainda mais claro - com Alan a limitar a acção de William. A meu ver, porém, Enzo tem uma importância maior na saída de bola do Benfica - que fica habitualmente só com 1 médio na frente da primeira linha - do que William no caso do Sporting - que é uma equipa que sai muito pelos corredores laterais, sem passar por algum dos médios.

Ruben Micael e o Braga
No vídeo incluí uma jogada onde é evidenciada a boa leitura dos espaços de Ruben Micael, aproveitando para fazer uma referência ao jogador. Penso que a antipatia que se generalizou em seu redor tem mais a ver com aspectos clubísticos e incidências extra-jogo do que propriamente com aquilo que faz em campo, o que é pena porque acaba por não se dar o valor devido às suas características e à especificidade do seu caso. Micael é dos jogadores a quem reconheço mais fragilidades em termos físicos em todo o campeonato, e não me parece sequer um extraordinário executante em termos técnicos. No entanto, e apesar de tudo isso, conseguiu fazer uma ascensão meritória e ao alcance de muito poucos, praticamente apenas devido à sua capacidade de movimentação e leitura dos espaços, o que o torna num caso muito raro e que justificaria, a meu ver, mais apreço mediático. Também não penso que seja a solução ideal para a Selecção e para o nível que esta se propõe, mas não partilho de forma nenhuma da visão de que existam muitos médios com mais qualidade do que ele no futebol português. Talvez diferentes, mas não necessariamente melhores, infelizmente!
Sobre o Braga, de referir que para além da já abordada eficácia no condicionamento pressionante, a equipa conseguiu muito pouco no total do jogo. Aqui, tem de se salientar as grandes fragilidades da equipa, perante as ausências de Alan, Rafa, Baiano e Joazinho, com muito pouca qualidade nos corredores laterais. As lesões, de resto, têm condicionado também o trabalho de Jorge Paixão. O mais provável é mesmo que a passagem do treinador pelo Braga venha a ser recordada pelas lesões dos seus jogadores, e não pelas ideias do seu futebol.

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28.3.14

Porto - Benfica (II): Análise individual

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Porto
Fabiano - Mais um jogo muito conseguido, ainda que desta vez sem o trabalho que havia tido em Nápoles ou frente ao Sporting, para a Taça da Liga. Nota menos positiva para o jogo de pés, onde previsivelmente não oferecerá a mesma qualidade de Hélton. Seja como for, se conseguir a difícil missão de manter o nível actual, será não apenas uma grande referência da baliza portista, mas mesmo um nome a ter em conta no plano internacional. Mas, ainda é cedo para euforias.

Danilo - Não teve grandes problemas defensivos - contrariando aquela que é a sua tendência em jogos de maior grau de dificuldade - mas também não conseguiu o impacto ofensivo de outras ocasiões. Tudo somado, foi uma exibição regular, mas abaixo do nível dos restantes companheiros de sector.

Alex Sandro - Muito interventivo, nomeadamente travando um duelo muito apertado com Salvio e em que ambos se anularam, o que equivale a dizer que esteve bem melhor defensivamente do que ofensivamente. Na retina ficou um passe menos conseguido para Jackson, numa jogada de grande potencial, mas no cômputo geral fez um bom jogo.

Reyes - As primeiras jogadas deram a entender alguma intranquilidade perante o pressing do Benfica, mas com o golo, e tal como toda a equipa, partiu para uma exibição conseguida e praticamente sem reparos.

Mangala - Mais um bom jogo, na sequência do que havia feito em Nápoles. Com muito boa presença defensiva, sendo dominador nos duelos que travou, e desta vez sem comprometer com bola.

Fernando - Exceptuando Jackson, terá sido a melhor exibição do jogo. Foi o jogador com maior presença em posse, usufruindo das dificuldades que os médios do Benfica tiveram em pressionar o seu espaço, e também defensivamente conseguiu um jogo muito conseguido. Como se não bastasse, ainda se distinguiu no plano ofensivo, assistindo Varela numa das melhores ocasiões do jogo.

Defour - Menos impulsivo, quando comparado com Herrera, foi também mais regular do que o mexicano. Ainda assim, nem sempre se deu bem com a necessidade de uma presença mais profunda ao longo do corredor central, parecendo ter maior vocação para assumir um envolvimento mais constante no jogo. Também defensivamente, não conseguiu o mesmo impacto de Herrera no pressing sobre a primeira fase de construção do Benfica.

Herrera - A sua postura no jogo está sempre perto de colocá-lo como um protagonista, mas não necessariamente pela positiva. Faz tudo com grande convicção e agressividade, o que lhe permite ser incisivo nas suas chegadas ao último terço e contundente no seu comportamento pressionante. Por outro lado, porém, o seu critério nem sempre é o melhor quando tem de aparecer em zonas mais recuadas, o que já lhe valeu alguns dissabores esta época, e que neste jogo ditou também alguns erros em posse que deverá evitar. Concretamente, no jogo, teve uma acção importante em termos estratégicos, com movimentos nas costas de Quaresma, que criaram grande impacto nos primeiros minutos mas que foram depois mais bem controlados por Fejsa.

Quaresma - Mais um jogo em que o impacto mediático de algumas das suas acções não tem reflexo correspondente na utilidade do que realmente oferece à equipa. Foi assim, com algumas jogadas de grande mérito individual mas que, tudo somado, valeram desta vez pouco à equipa. E foi assim, também, pela dificuldade no desempenho defensivo e, com bola, por uma série de decisões muito questionáveis. O seu grande contributo esteve reservado para as bolas paradas, sendo seu o canto que esteve na origem do golo decisivo.

Varela - Um jogo de muito pouco envolvimento e, quando o fez, com muitas dificuldades ao nível da eficácia. Reservou maior protagonismo para a zona de finalização, onde foi novamente uma presença importante, nomeadamente estando muito perto de marcar o 2-0, que lhe foi negado por Artur.

Jackson - Um grande jogo, interrompendo claramente uma fase menos entusiasmante daquele que é, apesar de tudo e a meu ver, o jogador mais desequilibrador do futebol português nesta temporada. Muito bem no envolvimento colectivo, onde vinha mantendo uma presença mais discreta nos últimos tempos. Também muito útil no trabalho defensivo, conseguindo algumas intercepções importantes e sendo muito útil nas bolas paradas defensivas. Finalmente, claro, a capacidade que tem para ser um jogador decisivo dentro da área, o que lhe valeu o golo e ainda um lance notável que apenas por infelicidade não fez o duplicar o seu nome na lista dos marcadores.

Benfica
Artur - A época não tem sido fácil para ele, vendo a sua saída da baliza coincidir com uma melhoria clara ao nível de golos sofridos. A verdade é que esteve muito bem neste seu regresso, com boas intervenções e sem responsabilidade no golo. Em destaque positivo, claro, a defesa que evitou o golo de Varela. Menos positiva foi a sua prestação no jogo de pés.

Maxi - Não teve grandes problemas de controlo do seu corredor, mas isto não quer dizer que justifique grandes elogios no plano defensivo. No plano ofensivo, teve uma prestação contrastante. Por um lado, foi das unidades da equipa com menor envolvimento em posse. Por outro, teve algumas aparições de realce no último terço, destacando-se uma finalização contrariada por Reyes e um lance, já no tempo de compensação, em que ficou a ideia que com outra decisão no passe teria criado uma boa ocasião para que o Benfica conseguisse resgatar o empate.

Sílvio - Conseguiu maior envolvimento do que Maxi e teve também mais trabalho defensivo, inclusivamente com algumas intervenções determinantes e que impediram o isolamento de alguns adversários. Por outro lado, não ficou à margem das dificuldades que a equipa sentiu em ter bola na fase de construção.

Luisão - Defensivamente, fez um bom jogo, conseguindo algumas intervenções de grande valor. Com bola, por outro lado, sentiu muito a pressão do Porto, não conseguindo emprestar grande qualidade ao seu contributo na fase de construção.

Garay - Fica na fotografia do golo, mas não me parece justo responsabilizá-lo em demasia. A bola é colocada numa zona mais atrasada, relativamente à linha de jogadores do Benfica, o que ofereceu toda a vantagem a Jackson no ataque à trajectória. De resto, também ele não respondeu bem ao pressing do Porto, não conseguindo oferecer a qualidade habitual ao jogo ofensivo da equipa. Defensivamente, acabou por fazer um jogo mais discreto do que Luisão, mas nem por isso menos interventivo ou eficaz, estando bastante bem nesse plano.

Fejsa - Muito interventivo no jogo, mas também ele a ter um contributo contrastante. Com bola, e tal como os centrais, sentiu muitas dificuldades perante o pressing portista, nomeadamente com 2 perdas de bola mais comprometedoras e sem grande capacidade para encontrar soluções para os problemas colocados. Defensivamente, voltou a revelar a sua invulgar capacidade de trabalho, sendo o jogador com mais intervenções defensivas no jogo. Em destaque, a forma como reagiu à ameaça dos movimentos dos médios do Porto nas costas dos extremos, começando por não perceber essa ameaça, mas corrigindo depois muito bem esse aspecto.

Rúben Amorim - Como escrevi ontem, parece-me que a ausência de Enzo poderá ter sido determinante no jogo, mas isso não implica que Rúben tenha estado mal. Apenas, não foi capaz de oferecer a mesma capacidade de envolvimento e transporte de bola do argentino, que tanta importância tem para o Benfica em situações deste género. Aliás, foi quando Ruben assumiu esse protagonismo que a equipa melhor atacou, destacando-se o lance que culmina no cruzamento do próprio para Rodrigo, no final da primeira parte. Mais tarde, haveria de ser novamente ele o protagonista da melhor ocasião da equipa, negada por Fabiano. Defensivamente, não conseguiu um grande impacto na sua acção pressionante, o que acabou por permitir que o Porto se sentisse mais confortável com bola.

Salvio - Um jogo muito difícil e onde raramente teve espaço. Travou um duelo muito intenso com Alex Sandro, de quem teve algumas dificuldades em se libertar. Por outro lado, a sua prestação defensiva foi muito boa e reveladora da sua capacidade de trabalho, o que determinou que Alex Sandro não conseguisse também ele grande impacto nas suas acções ofensivas. Teve alguns movimentos sem bola muito interessantes, e alguns pormenores que revelam a qualidade que a meu ver tem, e que fazem dele um dos jogadores de maior rendimento do futebol português.

Sulejmani - Teve quase sempre mais espaço do que Salvio, e o duelo com Danilo não foi tão apertado como aconteceu do outro lado. No entanto, Sulejmani não conseguiu emprestar grande mais-valia ao jogo colectivo, tanto em termos criativos como no envolvimento em fases mais precoces do jogo ofensivo, por onde se aventurou, mas sem grande eficácia e até com algum risco acrescido para a segurança da equipa.

Rodrigo - Foi o único jogador a aproveitar as costas da linha média do Porto, que se adiantava muito, mas nem por isso conseguiu explorar esse espaço com grande frequência. Em parte, claro, porque a bola raramente saía de forma útil da primeira fase de construção. Com o tempo, e particularmente na segunda parte, foi conseguindo maior envolvimento, com o sua mobilidade a parecer sempre uma das armas mais eficazes da equipa. Saiu com muito tempo ainda por jogar, e claramente por razões que não tinham a ver com as aspirações da equipa neste jogo específico. Nota ainda para o cabeceamento no final da primeira parte, não parecendo abordar bem um lance de enorme potencial.

Cardozo - Jogo muito fraco onde apenas dá para realçar as piores características do seu perfil. Mas, da mesma forma que, na sua melhor fase, era exagerado ver nele um insubstituível, hoje será também excessivo considerá-lo dispensável.

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27.3.14

Porto - Benfica (I): Aspectos colectivos

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Vitória justa e de quem mais a desejou
A vitória coube de facto bem ao Porto que foi quem melhor esteve no jogo, e praticamente durante a totalidade dos 90 minutos. Ainda assim, não me parece avisado analisar o jogo e as suas incidências sem ter em conta alguns factores que, a meu ver, foram muito importantes para a sua definição. Em primeiro lugar, claro, a diferença na importância que as duas equipas atribuíram ao embate, que pareceu prioritário para o Porto, mas de uma importância secundária para o Benfica. Depois, e igualmente relevante, o facto do Porto ter conseguido extrair cedo eficácia das suas acções ofensivas, o que nem sempre é possível, mas que neste caso em concreto me parece ter oferecido à equipa de Luís Castro um capital de confiança importante e que possivelmente não conseguiria sem a vantagem no marcador. Não quero com isto retirar mérito ao triunfo portista - cujos méritos abordo no ponto seguinte - mas, como referi, há factores que não me parecem poder ser desprezados.

A estratégia de Luís Castro
Abordando mais concretamente o jogo, e os pontos que ajudaram a definir a superioridade do Porto, penso que é incontornável a referência à importância estratégica dos médios em organização ofensiva. O Porto vinha sentindo muitos problemas no início de construção, o que face à vocação pressionante do Benfica se constituia num risco previsível para a equipa neste jogo. A resposta de Luís Castro, que me pareceu estratégica, foi pedir maior profundidade aos seus médios, com movimentos nas costas, quer dos extremos, quer do próprio Jackson. Este comportamento não foi imediatamente assimilado pelo Benfica, nomeadamente com a perda de controlo sobre a acção de Herrera nos minutos iniciais. No entanto, assim que a ameaça se tornou clara, os médios do Benfica (Fejsa e Amorim) permaneceram mais contidos no seu adiantamento posicional, o que por um lado ditou melhor controlo do Benfica no último terço, mas que, por outro, acabou por comprometer também a capacidade pressionante da linha média encarnada, isolando mais os avançados no condicionamento mais alto, e criando o tal espaço que poderia faltar à construção portista. Assim, o Porto acabou por respirar relativamente bem na totalidade do jogo, ao contrário do que havia acontecido, por exemplo, em Alvalade, expondo-se muito menos a erros comprometedores na sua fase de construção.
Outro aspecto importante para o sucesso do Porto surgiu no momento táctico inverso, ou seja no efeito do seu próprio pressing perante a construção do Benfica, que causou quase sempre muitos problemas à circulação encarnada. Aqui, porém, não há qualquer surpresa, já que este é um comportamento habitual da equipa portista, nomeadamente adiantando muito os dois médios interiores na acção pressionante ao longo do corredor central. Neste sentido, parece-me que o Benfica respondeu relativamente mal a esta ameaça previsível (mais sobre isto no ponto seguinte).
Seja como for, e para além da importância que a vitória teve por si só, este pareceu-me um jogo muito positivo da parte do Porto. Como fui escrevendo, os jogos recentes da equipa - e apesar de algumas vitórias importantes - não me impressionaram muito, com muitos pontos que pareciam ser urgentes melhorar. Neste jogo, porém, o Porto não revelou vários desses problemas, desde logo com a questão - já abordada - da fase de construção, mas também com menor exposição das costas da sua linha defensiva e também com maior qualidade no movimento dos seus médios interiores. São bons sinais, que surgem numa altura em que o tempo para treinar é escasso, e que se constituem como pontos de interesse acrescidos para os próximos jogos.

Benfica: Incapacidade para ter bola, sem Enzo e Gaitan
De facto, e à margem do mérito que o Porto teve nas dificuldades que criou ao Benfica, é incontornável a forma como Jesus geriu este jogo, aparentando ter sempre a visita a Braga como prioridade. Isto, tanto ao nível das escolhas iniciais, como na gestão dos recursos ao longo do jogo e, até, pela forma como estrategicamente o Benfica se preparou pouco para um adversário cujo valor justificava outra atenção específica. Em particular, e na minha leitura, foi marcante a ausência de Enzo Perez para responder ao pressing que o Porto implementou e que, durante grande parte do tempo, reduziu muito a qualidade das acções ofensivas do Benfica. Não se trata tanto de fazer incidir a critica sobre Ruben Amorim, que até foi das unidades de maior rendimento individual no jogo se considerarmos todos os planos de avaliação, mas parece-me inegável que nenhuma outra solução oferece a mesma capacidade de envolvimento e qualidade no transporte de bola de Enzo Perez. Neste sentido será, até, das unidades mais difíceis de substituir na equipa base de Jesus. E podemos relembrar vários episódios nesta época onde a presença de Enzo foi fundamental neste aspecto. Por exemplo, frente ao Sporting - que também fazia do condicionamento pressionante uma prioridade estratégica, mas que nunca conseguiu lidar com a resposta individual de Enzo - ou mais recentemente em White Hart Lane, onde apesar do bom controlo defensivo o Benfica teve muitas dificuldades em ter bola, invertendo completamente esse cenário assim que Jesus lançou Enzo e Gaitan. O extremo argentino, aliás, era outro elemento que poderia ajudar a criar soluções de qualidade para "saltar" o pressing portista, e a sua mais-valia em termos de capacidade para ter a bola, relativamente a Sulejmani, sentiu-se sem surpresa após a sua entrada. Com tudo isto, e mesmo não discutindo a prioridade que Jesus oferece ao campeonato, fica clara a minha opinião de que o treinador teria tudo a ganhar em fazer uso de Enzo, nem que fosse apenas para uma parte da partida como fez em Londres.
Relativamente à opção de Jesus não dar prioridade a este jogo, este era um dilema que já havia antecipado, no sentido em que se a gestão é bem aceite pelos adeptos até na Liga Europa, tudo fica mais complicado quando se trata de um embate com um rival. Essa era a tentação de Jesus, romper com a rotatividade que oferece toda a prioridade ao campeonato, em razão do maior impacto mediático do clássico. O treinador não cedeu e manteve-se fiel ao plano, independentemente do adversário, e se muitos gostariam de outra conduta, esta parece-me no mínimo uma opção respeitável. Se havia dúvidas para alguém, fica agora claro: a prioridade é, mesmo, o campeonato! Olhando um pouco mais para a frente, não fica difícil de antever uma inversão de prioridades assim que a liga interna fique garantida - e na hipótese de isso acontecer antecipadamente. Por exemplo, não é de excluir um cenário em que o Benfica jogue todos os seus trunfos na segunda mão desta eliminatória para, depois, vir de novo ao Dragão com algumas segundas linhas, mas agora para o campeonato.

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25.3.14

Chelsea-Arsenal e Real-Barça (análise)

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Chelsea - Arsenal
Já tinha abordado a questão do Arsenal, nomeadamente relativamente à qualidade da sua liderança técnica, que me parece insuficiente para que a equipa se possa superar e discutir realmente títulos com adversários com mais capacidade de investimento. Não quero com isto dizer que Wenger seja "o" problema, quer dizer apenas que, neste contexto, me parece claramente insuficiente.
O que se viu em Stamford Bridge foi, em traços gerais, uma repetição do filme de Anfield, onde o Arsenal também acabou goleado e de forma muito semelhante. Em particular, destaque flagrante para a péssima gestão do risco em posse e para a má reacção defensiva da equipa, em situações de transição e ataque rápido. Aliás, é interessante notar como a abordagem de Wenger foi completamente oposta nestes jogos, relativamente ao que fez frente ao Bayern. Na eliminatória da Champions, o Arsenal pareceu avesso a qualquer tipo de risco na sua construção e acabou por procurar sistematicamente a construção longa, tentando jogar quase exclusivamente a partir da segunda-bola. Uma espécie de oscilação entre o 8 e o 80, que parece inevitavelmente atirar a equipa para cenários extremos, ora expondo-se de forma flagrante ao risco da transição, ora abdicando quase que por completo do potencial que a qualidade técnica das suas individualidades lhe oferece.

Real Madrid - Barcelona
Um jogo excelente do ponto de vista do entretenimento, com inúmeras situações de golo, e constante superioridade dos ataques relativamente às defesas. É óbvio que há aqui muito mérito de quem ataca - desde logo pela riqueza de recursos de ambas as equipas - mas também me parece que ambos os conjuntos ficam a dever alguma coisa a si próprios em termos defensivos. Certamente ficarão, se as compararmos com as respectivas versões de um passado recente.

Relativamente ao Real Madrid, claramente melhor a atacar do que a defender. Ofensivamente, é uma equipa que trabalha bastante bem a sua posse e a entrada no último terço contrário, nomeadamente através da circulação lateral e do uso da largura dos seus médios, Modric e Di Maria (fica aqui, a propósito, a recomendação de um post sobre o tema, no blog Segunda-bola). No mesmo sentido, tem também a capacidade de se desdobrar muito rapidamente em termos ofensivos, especialmente através da movimentação de Ronaldo, que rapidamente se junta a Benzema no corredor central, criando muitos problemas para o equilíbrio das defesas contrárias. Defensivamente, porém, mostrou-se excessivamente débil para o desafio que se lhe deparava, parecendo estranhamente impreparada para a especificidade do Barça e de Messi. A equipa apostou quase sempre muito no condicionamento pressionante em toda a extensão do terreno, conseguindo bons resultados neste particular. No entanto, isto implicou também alguma perda de rigor no controlo de alguns espaços fundamentais por parte da sua linha média, que frequentemente se viu exposta pela qualidade do jogo de posse do Barcelona e, de forma muito flagrante, pelas movimentações de Messi. Veremos quais as implicações desta imprudência estratégica nas contas finais do campeonato e, já agora, fica também o aviso para a Champions, onde para vencer o Real terá certamente de se confrontar com outros adversários de grande valia técnica.

Quanto ao Barcelona, e tal como venho escrevendo ao longo da temporada, continua a ser, na minha opinião e com alguma distância, a equipa com o melhor conjunto de jogadores do mundo. O que não quer dizer que seja imbatível, ou que tenha de ganhar tudo, obviamente. Mas, quando os adversários não se protegem bem, e mesmo que tenham a qualidade que tem o Real, o risco de derrota torna-se de facto muito elevado. O grande destaque da equipa é, claramente, Messi que foi a chave do jogo - e não valorizo aqui sequer os 3 golos que marcou, já que 2 foram de penálti. Já havia escrito que esta equipa parece, mais do que nunca, obcecada por Messi, procurando-o talvez até em demasia. A verdade é que como a protecção do Real para essa especificidade foi pouca, o Barça retirou grandes proveitos desse apelo previsível ao seu maior astro. Ainda assim, e apesar da vitória, há vários aspectos que se continuam a identificar e que marcam uma quebra qualitativa em relação a épocas anteriores. Neste jogo, identificaria a maior exposição ao risco em posse, com a equipa a não ter grandes respostas colectivas para as situações de pressing alto do Real (isto claro, para além da qualidade que oferecem naturalmente os seus jogadores), e também os problemas na resposta defensiva, em particular sendo menos eficaz no pressing e reacção à perda, relativamente ao tempo de Guardiola. Em suma, o Barcelona terá hoje mais pontos fracos, sem dúvida, mas os seus pontos fortes continuam a ser únicos e provavelmente inacessíveis a qualquer outra equipa do planeta, parecendo-me por isso bastante imprudente que sejam menosprezados.

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24.3.14

Marítimo - Sporting: Estatística e opinião

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Este era um jogo obviamente importante para que o Sporting pudesse continuar a manter alguma margem de conforto na corrida pelo segundo lugar. A equipa voltou a não fazer, de forma nenhuma, um jogo exuberante, e tal como frente ao Porto sentiu dificuldade em materializar em proximidade com o golo a superioridade que quase sempre manteve na afirmação da sua estratégia. Desde o inicio, foi o Sporting quem errou menos e mais potenciou as lacunas do seu opositor, mas foi também faltando quase sempre esclarecimento nas decisões do último terço, o que determinou que a equipa fosse mantendo uma vantagem apenas tangencial que, com o passar dos minutos, foi fazendo acreditar cada vez mais o Marítimo. Valeu, enfim, o golo de Jefferson, a evitar um final de jogo que certamente seria de grande ansiedade e incerteza para ambos os lados.

Relativamente a aspectos mais concretos do jogo, destacaria dois pontos que me pareceram importantes para que o Sporting se superiorizasse: 1) Na primeira parte, a exposição do corredor esquerdo do Marítimo, com Heldon a tirar partido da menor vocação de Márcio Rozário para a função de lateral, e com um ajustamento posicional nem sempre ideal por parte do Marítimo. 2) Na segunda parte sobressaíram as dificuldades de construção do Marítimo, com o pressing do Sporting a potenciar muita hesitação e alguns erros em zonas de grande risco. Foi a partir desta fragilidade que o Sporting criou as suas principais ocasiões neste período.
Do lado do Marítimo, e para além dos destaques negativos já referenciados, tanto relativamente a alguns aspectos defensivos como à própria lucidez da equipa na fase de construção, o grande destaque - positivo, neste caso - vai para Derley. À margem do golo, onde participa apenas pela movimentação sem bola, foi sempre através de Derley que o Marítimo causou problemas ao Sporting. Muito confortável no confronto físico, não permitiu que Maurício fosse tão dominador como é hábito neste particular. Dentro da área, soube sempre fugir da linha dos defesas para ganhar posição para cabecear. Finalmente, saiu igualmente com muito propósito da zona dos centrais, baixando ou abrindo na ala, para provocar - quase sempre em drible e com sucesso - os defensores contrários. 

Individualidades (Sporting)
Rui Patrício - Jogo sem grandes motivos, nem oportunidades de resto, para destaque.

Cedric - O Sporting conseguiu quase sempre mais profundidade pelo seu corredor, mas desta vez isso não lhe permitiu ter um protagonismo no último terço de outras ocasiões. O principal destaque vai para o seu contributo na reacção à perda, onde foi das unidades que mais contribuiu para que a equipa se mantivesse instalada no meio-campo contrário. Mas, no global, foi uma exibição regular, e sem grandes motivos de destaque.

Jefferson - Teria sido provavelmente a sua melhor exibição dos últimos tempos, não fosse a sua reacção no lance do golo do empate do Marítimo. Primeiro, leu mal a jogada e perdeu o tempo de antecipação, depois tentou corrigir o posicionamento, mas fê-lo mal, acabando perdido na jogada e sem perceber o espaço que deveria ocupar. Mas, como referi, à margem desse lance foi um jogo bem conseguido, com boa participação defensiva - foi dos mais activos neste particular - e o golo que terminou com as dúvidas do jogo.

Maurício - Provavelmente uma das exibições menos conseguidas da época, muito por força da acção meritória de Derley. Fazendo-lhe alguma justiça, convém referir que não foi apenas ele quem teve problemas com o avançado brasileiro, mas como lhe calhou a si a missão de travar um maior número de confrontos com Derley, acabou por ser ele a principal vitima da exibição inspirada do seu opositor. O principal destaque - e único reparo mais importante, também - vai para a forma como se deixou bater no 1x1 com Derley num lance junto à lateral, onde perdeu o equilíbrio e a presença defensiva na jogada.

Rojo - Também teve dificuldades perante Derley, mas como chocou muito menos com o avançado do Marítimo, acabou por fazer um jogo mais livre de apertos, partindo para uma exibição - mais uma - positiva.

William - O golo que marcou confere-lhe uma importância decisiva no triunfo conseguido. À margem desse lance capital, fez um jogo mais discreto do que é habitual. A sua mais-valia voltou a estar na qualidade das suas aparições no jogo e não tanto na frequência com que interveio - um aspecto que venho realçando repetidamente - com a equipa a focar mais a sua construção nos corredores laterais. Em destaque, a qualidade do seu contributo no momento de transição defesa-ataque, onde foi o jogador mais bem sucedido.

Adrien - Foi provavelmente o grande protagonista no jogo. Marcou o penálti - embora eu, pessoalmente, dê pouca importância a esse aspecto - esteve na origem de duas das principais ocasiões da equipa (tirando partido do seu bom sentido posicional e presença pressionante), e foi ainda o jogador com maior envolvência em posse. Como nota negativa, duas perdas de bola em situação algo comprometedora.

Mané - Jogou no lugar habitualmente desempenhado por André Martins. Não teve a mesma presença pressionante, não conseguiu grande qualidade no seu envolvimento em posse, nem tão pouco o mesmo timing de movimentos sobre o corredor direito. Ainda assim, factualmente, está na origem do primeiro golo, retirando novamente partido da sua rapidez para ganhar mais um penálti, e ainda na ocasião que Slimani desperdiçou na cara de Salin, cabendo-lhe o último passe. Se no futebol o objectivo são os golos, convém não desvalorizar quem consegue aproximar a equipa desse propósito. Jardim pareceu concordar com esta visão mais pragmática do jogo e deu-lhe os 90 minutos.

Capel - Voltou a repetir o mesmo tipo de exibição que havia feito frente ao Porto. Ou seja, destacou-se pela capacidade de envolvimento, retirando partido da sua facilidade em segurar e transportar a bola para dar sequência útil à esmagadora maioria das suas aparições. No entanto, tanto em termos defensivos como em termos de capacidade de desequilíbrio voltou a ficar aquém do que Jardim certamente esperará dos seus extremos. Na retina ficou um lance, já na segunda-parte, em que perdeu o tempo de passe para Heldon.

Heldon - Uma exibição algo ingrata porque foi durante muito tempo o grande agitador do ataque da equipa, mas acabou por não conseguir grande impacto em qualquer das suas acções. Esteve particularmente bem ao aproveitar a diferença de características no duelo com Marcio Rozário e, também, a pouca qualidade nas coberturas defensivas do Marítimo, o que lhe permitiu potenciar duelos individuais onde o seu repentismo lhe oferecia vantagem.

Slimani - Desta vez não marcou e não teve qualquer lance de destaque no jogo aéreo, o que é novidade. Ainda assim, e mesmo num jogo onde não conseguiu fazer valer as suas características, Slimani esteve novamente perto de deixar a sua assinatura na ficha de marcadores. O ponto positivo da exibição vai, obviamente, para o trabalho que deu à defensiva do Marítimo, intervindo com frequência no jogo e ganhando alguns duelos de relevo e que foram ajudando a equipa ainda em zonas distantes da área. O ponto negativo vai, claro, para a sua modéstia de recursos técnicos, o que retira sempre um potencial importante à equipa. Slimani vem mantendo a titularidade, mas as suas hipóteses de ser uma solução de qualidade no longo-prazo, numa equipa como o Sporting, estão exclusivamente confinadas à real mais-valia do seu jogo aéreo, que continuará a ser apurada à medida que for acumulando minutos como titular. Slimani não será nunca um "novo-Jardel", mas não tenho dúvidas que será sempre dentro desse perfil que as suas hipóteses de afirmação se colocarão.

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21.3.14

Nápoles - Porto: Estatística e opinião

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Repetindo uma ideia que venho passando com frequência, o futebol alimenta-se de estados de ânimo e estes são determinados, por completo, pelos resultados. Este jogo parece-me, a este respeito, mais um bom exemplo. O Porto qualificou-se, sobrevivendo a uma eliminatória muito difícil e frente a um adversário de grande valia individual, e por isso se multiplicam sorrisos e elogios à equipa. Na minha perspectiva, porém, e à margem de alguns contributos individuais positivos, o Porto não fez um bom jogo, nem tão pouco um jogo razoável. Fez, isso sim, um jogo bastante fraco do ponto de vista colectivo, e tanto no aspecto defensivo como ofensivo. Defensivamente, repetiu muitos dos problemas que aqui tenho discutido, permitindo que a sua baliza fosse constantemente ameaçada pelas iniciativas adversárias e com o Nápoles a desperdiçar um número muito elevado de ocasiões claras para marcar. De igual modo, ofensivamente, e mesmo beneficiando da generosidade de Benitez, que abdicou novamente de pressionar a primeira fase de construção portista, o Porto raramente chegou de forma útil ao derradeiro terço do campo. A qualificação é muito positiva, especialmente porque reabre a esperança de um êxito europeu numa época tão complicada a nível interno, e é também verdade que as dificuldades da equipa têm muito que ver com a qualidade do Nápoles, que tem um nível técnico que poucas mais vezes o Porto encontrará até ao final da época mesmo nesta competição. A confiança, todos suspeitamos, vem muito mais dos resultados do que das exibições, mas se ao ganho de confiança não corresponder, paralelamente, uma evolução qualitativa da equipa, então todo e qualquer reforço emocional servirá de muito pouco no que às aspirações da equipa diz respeito. O meu ponto aqui é que o resultado não deve servir para deturpar o que a equipa realmente mostrou, até porque faltam muitos jogos e 3 troféus por disputar, e se a equipa não melhorar em vários dos problemas que denota - e continua a denotar, independentemente de um ou outro resultado - então o mais provável é que acabe por festejar muito pouca coisa para além desta passagem aos quartos-de-final.

As únicas notas positivas, na minha leitura, vão para o plano individual, e para as exibições de Fabiano (sem dúvida, o homem do jogo, com um número absolutamente invulgar de intervenções em ocasiões claras do adversário), Mangala (que se redimiu da má prestação em Alvalade), Fernando (combinando um bom jogo defensivo com uma assistência decisiva) e os suplentes Ghilas e Josué (ambos entraram muito bem, particularmente Ghilas). Falta aqui Quaresma, claro, que me merece também um comentário: o seu golo é, mais uma vez, a evidência da sua genialidade, e não serei eu certamente a desvalorizar, nem o peso que um golo tem num jogo, nem tão pouco a importância que pode representar ter um jogador com a capacidade decisiva de Quaresma. Ainda assim, uma boa jogada e um grande golo, não fazem uma grande exibição, e à margem do grande golo que marcou, Quaresma produziu pouco ou quase nada, inclusivamente estando envolvido em dois lances de grande falta de rigor defensivo, e que estiveram muito próximos de ter custos para a equipa. Tal como relativamente à performance colectiva, convém aqui não confundir a parte com o todo.

Uma nota, ainda, para o Nápoles e para a sua estratégia. Benitez abdicou de pressionar o Porto em praticamente 50-60 metros, parecendo quase condicionado por alguma regra oculta a defender apenas no seu meio-campo, e isto mesmo num jogo em que partia em desvantagem e jogava no seu terreno. É impressionante a obsessão pelo momento de transição que esta equipa e o seu treinador revelam, e só pode ficar a ideia de que muito do potencial do Nápoles fica por explorar com este tipo de comportamento restritivo. E este é mais um factor que não abona a favor do Porto, se tivermos em conta as dificuldades que, mesmo assim, a equipa sentiu em controlar o jogo e o seu adversário.

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19.3.14

Sporting - Porto (III): 5 jogadas

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1. Cruzamento Quaresma - A primeira nota vai, claro, para o mérito de Quaresma na criação do lance. Cedric poderia ter tido outra abordagem mas, face ao que fez Quaresma, parece-me de todo inapropriado centrar as atenções num eventual demérito do lateral. Uma segunda nota para a acção de William, ainda que dificilmente pudesse, também ele, evitar o sucedido. O médio está inicialmente preocupado com o passe interior, numa situação em que a bola circula lateralmente e a toda a largura do terreno, e que por isso exige grande rapidez no ajustamento posicional de quem defende. A critica em relação a William - embora, repito, sem que com isto esteja a estabelecer uma relação de causalidade com este desequilíbrio concreto - tem a ver com alguma lentidão no ajustamento posicional. A celeridade no ajustamento posicional e na definição da cobertura ao lateral, deveria ser uma prioridade estratégica do Sporting perante a presença de um jogador como Quaresma, para quem a cobertura defensiva é uma espécie de kryptonite, como aliás se viu na segunda parte quando o Sporting passou proteger-se melhor dos duelos individuais.
Num segundo momento do lance, e após o desequilíbrio estar já criado por Quaresma, resta ao Sporting tentar controlar o cruzamento. A situação é complicada porque o Porto tem boa presença numérica na área, mas a equipa leonina tinha, ainda assim, boas condições para ser bem sucedida. Os jogadores tentam estabelecer o seu posicionamento na área, e fazem-no bem, com excepção de Jefferson. O lateral esquerdo acaba por parecer alarmado pelo movimento de Carlos Eduardo e, talvez por isso, prolonga excessivamente o seu próprio movimento de ajustamento, acabando - de forma algo difícil de compreender - quase que a defender a baliza, em vez de defender o espaço que era suposto ser seu. A consequência é a desprotecção da zona do segundo poste, precisamente onde devia estar Jefferson, e onde estava Varela.

2. Desmarcação Mané - É uma jogada em organização ofensiva do Sporting, que se inicia com a tentativa do Porto condicionar o adversário em toda a extensão do terreno. Desde logo, saliência para a diferença de abordagem entre as equipas, com o Sporting a responder ao pressing com uma ligação mais directa e ao longo do corredor lateral, para depois tentar jogar a partir da segunda-bola. Uma solução muito característica na equipa de Jardim, em toda a época e não só neste jogo.
Num segundo momento, percebe-se a desprotecção do espaço entrelinhas por parte do Porto, com Fernando algo isolado à frente da linha defensiva. A acção do pivot portista é, no entanto, muito boa, porque condiciona o passe interior e cria condições para que a linha defensiva possa subir, retirando tempo e espaço de decisão a Cedric. Até aqui, a reacção defensiva do Porto parece-me ajustada, discordando no entanto da acção de Alex Sandro, que a meu ver é desfasada do enquadramento colectivo criado. Justificar-se-ia, neste sentido, que pressionasse também ele Cedric, fechando a linha de passe para Mané, enquanto a linha defensiva condicionava a profundidade do extremo do Sporting. Isso não acontece, e por isso Cedric acaba por se libertar de Fernando e recuperar condições para expor as costas da linha defensiva.
Finalmente, no final da jogada, a acção de Slimani carece de maior astucia, em face da valiosa vantagem com que o avançado partiu para a jogada. O argelino abdica, numa decisão que me parece muito questionável, da frente do lance, acabando por se esconder atrás do central portista e facilitando a sua acção.

3. Cruzamento Danilo - De novo Quaresma na génese da jogada, ainda que, desta vez, não do desequilíbrio. O extremo surge em zonas interiores e provoca a linha média do Sporting, ainda a tentar reorganizar-se após a perda da bola. Há uma indefinição entre Capel e Adrien, mas acaba por ser o médio português a fazer contenção sobre Quaresma. A consequência deste movimento é a abertura do espaço entrelinhas, precisamente nas costas de Adrien. Bem, Varela aproveita esse facto e cria uma linha de passe interior, forçando em paralelo a indefinição em Jefferson, também com a ameaça de Danilo sobre a sua zona e por isso impossibilitado de condicionar a presença interior do extremo portista. A minha leitura é que Capel lê mal o lance e, em vez de condicionar a linha de passe para Danilo, deveria ter tido como prioridade fechar o espaço interior, muito exposto face à saída em contenção de Adrien. Ao não o fazer, Capel acaba por ver também esfumar-se o seu controlo sobre Danilo, assim que a bola entra em Varela, definindo-se o 2x1 sobre Jefferson que posteriormente vai desequilibrar toda a defesa do Sporting.

4. Golo Slimani - A minha primeira nota na jogada decisiva do clássico vai para a circunstância em que ela acontece, ou seja, na sequência de circulação lateral. Este pormenor potencia, momentaneamente, os espaços laterais intra-linhas (isto é, entre os jogadores das próprias linhas defensivas), e exige um reajustamento posicional de todo o bloco defensivo. A consequência deste contexto é que a linha média do Porto não tem condições para pressionar imediatamente William, devendo na minha leitura dar prioridade ao ajustamento posicional antes de voltar a assumir uma postura mais pressionante. E é isso que efectivamente faz. Menos correcto - mas determinante na jogada - parece-me ser o comportamento da linha defensiva, que perante a liberdade oferecida a William assume um risco elevado ao não cortar a profundidade. Este é, aliás, um comportamento que venho identificando e criticando na equipa portista em comentários recentes, por entender ser desajustado e excessivamente arriscado em situações deste tipo. Nota ainda para o movimento clássico, e tantas vezes aqui referenciado, de André Martins, aproveitando a atracção do lateral pela movimentação interior do extremo. Uma situação que, curiosamente, foi muito explorada pelo Porto de Villas-Boas, no caso através de Belluschi ou Guarin, e que resultou em golos importantes contra Benfica e Villarreal.
Mais à frente, a tarefa de Abdoulaye é muito complicada e, por isso, parece-me muito injusto pegar neste lance para criticar o central. Em recuperação, o defesa fica isolado no duelo com Slimani e na iminência do cruzamento. Abdoulaye tem de garantir a frente do lance, mas tentar paralelamente diminuir a distância para Slimani, ao mesmo tempo que recupera no terreno e mantém o contacto visual com a bola. Como se não bastasse, Abdoulaye acaba por ser também vitima do timing perfeito da jogada, já que o cruzamento acontece, não só na medida certa, mas também no tempo exacto em que o avançado faz o seu movimento de afastamento.

5. Jogada Jackson - Terá sido, provavelmente, a grande ocasião do Porto para chegar ao empate. É um lance simples, em que entram em confronto avançado e central, Jackson e Dier, no caso. Primeiro, Jackson solicita o apoio frontal, estando no entanto relativamente isolado para poder dar continuidade à progressão da jogada. Dier tem, aqui, uma primeira oportunidade para intervir no lance, mas não consegue antecipar nem, depois, evitar o passe de Jackson para Varela. A vantagem do avançado sobre o defesa ganha outras proporções quando Jackson vira e, depois de ganhar a frente, ganha também as costas de Dier. O passe de Varela é bom, mas a jogada tem todas as condições por ser controlada pelo central, com Dier a voltar a evidenciar algumas limitações na capacidade de reacção no espaço, tanto na antecipação com na recuperação. Posteriormente, fica a ideia que o próprio Patrício poderia ter feito mais, hesitando talvez pelo risco de fazer falta numa saída menos calculada, e também pelo facto de Dier se manter na jogada. O central acaba, finalmente, por conseguir evitar danos maiores na fase terminal do lance.

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18.3.14

Sporting - Porto (II): Análise individual

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Sporting
Rui Patrício - Foi determinante na defesa que realizou, a remate de Varela, e esteve também bem no jogo de pés, particularmente na ligação com Jefferson, ajudando a evitar o pressing portista. O lance que, obviamente, mancha a sua exibição é a hesitação que permite a Jackson ficar muito perto de marcar. Fica a ideia de que a comunicação entre Dier e o próprio Patrício poderá não ter sido a melhor.

Cedric - A sua exibição ficou marcada pela dificuldade nos duelos perante Quaresma, nomeadamente no primeiro tempo. Em parte, revela a dificuldade do próprio jogador em situações deste tipo, não podendo jogar em antecipação, onde é mais forte. Por outro lado, e como já escrevera ontem, foi vitima da pouca protecção colectiva da equipa perante a ameaça que representava Quarema, algo corrigido após o intervalo. Do ponto de vista ofensivo, não conseguiu o protagonismo habitual.

Jefferson - A meu ver, é questionável a forma como reagiu ao cruzamento de Quaresma, na primeira parte, acabando por perder o controlo sobre Varela. De resto, fez um jogo regular, com alguns problemas no controlo defensivo do seu corredor (o que vem sendo habitual), e sem grande capacidade para protagonizar os movimentos ofensivos que o caracterizam.

E.Dier - Fez um jogo sóbrio, longe do protagonismo de Rojo, mas quase sempre regular e a cumprir com aquilo que lhe foi sendo solicitado. Isto, tanto defensivamente como ofensivamente, o que no seu caso é novo sinal positivo, após a boa exibição de Vila do Conde, que interrompeu uma série de aparições onde constantemente expunha a equipa através de uma gestão pouco adequada do critério. O lance a justificar mais atenção é aquele em Jackson ganha as suas costas e acaba por evitar Patrício antes de ser contrariado pelo próprio Dier. É um lance muito semelhante àquele em que Ghilas se isolou, no jogo para a Taça da Liga, e uma situação que se repete de outros jogos (por exemplo, em Guimarães), sendo por isso um aspecto que deve rever e trabalhar.

Rojo - Um jogo de grande protagonismo no capítulo defensivo, com grande capacidade de intervenção em praticamente todos os capítulos do jogo defensivo. Com bola, não teve tanto protagonismo.

William - Voltou a fazer um jogo excepcional no que respeita à capacidade de gestão da posse, sobretudo em situações mais complicadas, onde a sua capacidade - fora-de-série - já encanta todos os que o vêem jogar. Repito, porém, que a sua virtude reside na qualidade do envolvimento, e não tanto na quantidade, com William a não ser um ponto de passagem obrigatório do jogo da equipa (pela própria natureza das orientações colectivas). No mesmo sentido, no capítulo defensivo - e ao contrário do que é tantas vezes sugerido - a sua prestação também não é excepcional. Por exemplo, neste jogo Adrien teve uma capacidade de intervenção bem mais expressiva, o que não me pareceu ter sido percepcionado. A sua grande dificuldade reside na dificuldade de ajuste posicional em lances de maior rapidez, e na primeira parte deveria ter sido mais previdente relativamente ao duelo entre Quaresma e Cedric, oferecendo poucas coberturas ao lateral do seu lado, algo que corrigiu após o intervalo. Para completar mais uma boa exibição, fez ainda a abertura para André Martins, no lance do golo.

Adrien - Tal como no jogo da Taça da Liga, tornou-se protagonista principal do pressing da equipa. Aliás, parece sentir-se muito confortável quando lhe é pedido que pressione em linhas mais adiantadas, sendo a capacidade pressionante, na minha leitura, o aspecto onde a sua época justifica mais elogios. Em posse, também esteve bastante bem, nomeadamente no momento de transição defesa-ataque (consequência da tal boa presença pressionante) onde realizou uns notáveis 11 passes completos. Apontou o canto para a finalização de Mané, na melhor ocasião da equipa para além do golo de Slimani.

André Martins - Foi, também ele, uma presença muito importante no pressing alto, isto apesar de em termos estatísticos isso não se ter reflectido tanto como acontece normalmente. Em termos de envolvimento ofensivo, o grande (e único, diga-se também) destaque vai, claro, para o golo, obtido através do tal movimento nas costas do lateral que tanto repete nas suas acções e que, curiosamente, esteve na origem dos golos contra Benfica e Porto (aliás, os dois parecem tirados a papel-químico).

Capel - Teve a rara oportunidade de jogar os 90 minutos, mas nem por isso se pode dizer que tenha tido um impacto especialmente relevante no jogo. Há que separar a sua prestação entre os momentos de organização e transição. Em organização (e mesmo sem que isso trouxesse grandes mais-valias ofensivas), conseguiu uma boa eficácia nas suas aparições no jogo. Em transição, por outro lado, foi bastante inconsequente, não conseguindo tirar partido das suas tentativas de aceleração do jogo.

Mané - O seu repentismo permite-lhe causar alguns estragos nas defesas contrárias, mas precisa claramente de evoluir no capítulo decisional, para se tornar um jogador mais consequente e útil em todas as circunstâncias do jogo. Algo que ainda não acontece. A grande nota de destaque da sua exibição vai para o cabeceamento, na sequência de um canto, que quase deu em golo.

Slimani - Segue na sua impressionante caminhada de bom aproveitamento ofensivo, desta vez com um golo a decidir um jogo de grande importância. Para além desse lance capital, mostrou muito empenho e conseguiu emprestar alguma utilidade à equipa com isso. Mas, claro, também se percebem todas as suas limitações.

Porto
Hélton - Sem hipóteses no golo, tinha evitado outro anteriormente. Mas a grande nota de destaque do jogo é, claro, a sua lesão. Fabiano conquistou um grande crédito nos últimos tempos, mas não será nada fácil substituir a qualidade que Hélton regularmente emprestava à equipa.

Danilo - Sempre com grande vocação ofensiva, projectou-se muito no seu corredor e conseguiu causar alguns estragos, nomeadamente quase oferecendo um golo a Jackson. Defensivamente, por outro lado, não tem grande intensidade e, sem surpresa, voltou a ter um desempenho bastante modesto.

Alex Sandro - Defensivamente, e à margem de um ou outro ajustamento posicional que tem de ser revisto colectivamente, esteve bem. Com bola, porém, foi dos elementos que mais expôs a equipa através de passes perdidos em zona defensiva.

Abdoulaye - Ficou na fotografia do golo, e isso valeu-lhe a crucificação popular. A meu ver, porém, será muito injusto apontar o dedo a Abdoulaye neste jogo, quando outros elementos estiveram bem pior. Aliás, Abdoulaye foi dos jogadores que menos errou dos elementos do quarteto defensivo, sendo por outro lado o jogador com mais intervenções defensivas em todo o jogo, algumas delas bastante importantes. Relativamente ao lance do golo, a sua acção era muito difícil, porque o lance se desenrola em velocidade e Abdoulaye é relegado para uma situação de 1x1 com Slimani, com toda a área por defender. Teria de garantir a frente do lance - que fez - mas em simultâneo manter proximidade espacial com o avançado, tudo isto sem perder contacto visual com a bola.

Mangala - É constantemente elogiado, sendo colocado num patamar que, como tantas vezes escrevi, não tem correspondência naquilo que objectivamente faz em campo (isto, à margem da capacidade aérea nos lances ofensivos). Em posse, foi um desastre, repetindo erros e um mau ajuste do critério, que vem de outras ocasiões. E, mesmo no que respeita à capacidade de intervenção defensiva, onde quase sempre é visto como um fora-de-série, a verdade é que o seu registo é muito pouco impressionante, sendo repetidamente menos eficaz do que os seus parceiros de sector.

Fernando - É certo que ganha bastante no regresso à função de pivot, mas tem feito uma época bem abaixo do que já fez, e este jogo é mais um exemplo disso mesmo. Particularmente, em posse, não tem capacidade para ser a resposta aos problemas da equipa, sendo necessário que o seu envolvimento seja facilitado pela qualidade colectiva - que actualmente é escassa.

Defour - Apesar de já não actuar a seu lado, fez um jogo bastante semelhante ao de Fernando, com grande envolvimento em posse, mas sem ser a resposta que a equipa precisava para evitar o pressing do Sporting. Ofensivamente, não conseguiu um grande envolvimento.

Carlos Eduardo - Mais um jogo onde a sua capacidade de envolvimento deixou muito a desejar, isto mesmo já não actuando numa posição tão escondida como acontecia com Paulo Fonseca. Essa é a sua principal lacuna, e quando os adversários bloqueiam a primeira fase de construção da equipa, Carlos Eduardo simplesmente desaparece do jogo.

Quaresma - Pareceu muito determinado e, até certo momento, inspirado. Com um pouco mais de sorte, aliás, poderia ter sido mesmo o grande protagonista da partida. Quaresma surgiu melhor do que eu próprio pensava neste regresso ao clube, nomeadamente em termos físicos. Este jogo, de resto, é bem revelador do impacto contrastante que pode ter. É um tremendo executante, e isso pode sempre causar estragos se lhe for concedido espaço para colocar a bola na área. Por outro lado, porém, as suas acções não têm qualquer enquadramento colectivo, e sempre que há uma reacção colectiva à sua presença, a sua utilidade reduz-se praticamente a zero, como aconteceu na segunda-parte. Pessoalmente, confesso, acho muito perigoso que uma equipa da dimensão do Porto se possa construir em redor de um jogador como Quaresma. No mesmo sentido, tenho muitas dúvidas sobre a sua utilidade para a Selecção.

Varela - Não terá sido um jogo extraordinário, mas em termos práticos foi claramente a unidade de maior rendimento da equipa. Muito útil defensivamente, com boa capacidade e eficácia no seu envolvimento, e estando presente em 3 das 4 principais ocasiões da equipa.

Jackson - O eclipse do jogo interior da equipa reduziu muito a sua envolvência na dinâmica colectiva. Hoje, é mais do que nunca um jogador de área e dependente da resposta a cruzamentos. Creio que ele e a equipa perdem com isso. Poderia ter marcado após cruzamento de Danilo, ou mais tarde quando ganhou as costas de Dier. Não foi feliz, em nenhuma dessas situações, mas creio que onde se poderá mais censurar a acção do colombiano é num cabeceamento falhado, na sequência de um pontapé de canto, e quando estava em muito boa posição.

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17.3.14

Sporting - Porto (I): Aspectos colectivos

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O Sporting venceu, e em jogos com esta carga emocional o resultado enviesa, inevitavelmente, a apreciação qualitativa sobre aquilo que as equipas fizeram. Naturalmente, com benefício para os vencedores. Frequentemente, discordo desta radicalização da percepção que se generaliza após estes jogos, quase sempre equilibrados e definidos em pormenores, sendo este mais um desses casos. Mais concretamente, não creio que o Sporting tenha desmerecido a vitória, sobretudo porque foi quem melhor potenciou os erros alheios, de acordo com aquelas que eram as suas intenções. Mas, se o Sporting pode chamar a si a superioridade na implementação do plano estratégico, também me parece incontornável que foi o Porto quem se aproximou do golo com mais frequência, e que o desfecho poderia, de forma igualmente natural, ter sido diferente. Aqui, há dois pontos que me parecem determinantes explorar, para efeitos de análise: 1) o confronto entre a fase de construção portista e o pressing do Sporting, por onde se definiu o balanceamento do jogo e onde os visitados ganharam clara vantagem; 2) a qualidade de definição no último terço, onde o Porto foi quem esteve globalmente melhor, apesar da má segunda-parte e com o Sporting a desperdiçar, consecutivamente, as oportunidades ofensivas que o seu pressing lhe proporcionava.

Sporting
A fórmula aplicada por Jardim não foi diferente de nenhum outro jogo, nomeadamente no enfase dado à presença pressionante e ao condicionamento da fase de construção do adversário. Por essa via, o Sporting tentou - como sempre tenta - não só impedir o adversário de ter bola, como também potenciar momentos de desorganização do adversário. O sucesso desta estratégia depende, obviamente, da capacidade de resposta da oposição, e foi por isso, por exemplo, que o Sporting sentiu tantas dificuldades no jogo da Luz. Neste caso, e em sentido totalmente inverso, o sucesso foi tremendo - maior, até, do que no jogo da Taça da Liga - com inúmeras intercepções a serem conseguidas e várias situações de transição para explorar. O problema, porém, surgiu na definição no último terço, onde a equipa voltou a não estar especialmente inspirada, o que determinou um enorme desperdício de jogadas potencialmente perigosas, mas que raramente chegaram realmente a ameaçar Helton ou, depois, Fabiano.
À margem destes dois aspectos do jogo - a meu ver, e como escrevi acima, os mais determinantes na definição do mesmo - há que realçar ainda a repetição das tendências desde sempre verificadas na equipa de Jardim, nomeadamente a pouca exposição ao risco na fase de construção e a dependência quase total dos corredores laterais na criação ofensiva, ignorando quase que por completo o espaço interior. Num âmbito mais estratégico, importa também sublinhar a má preparação para os duelos individuais com Quaresma, nomeadamente na definição de coberturas defensivas à acção de Cedric, algo que aparentemente terá sido corrigido ao intervalo.
Em relação ao que resta da temporada, esta foi uma vitória obviamente muito importante para o objectivo do 2º lugar. 5 pontos em 7 jogos são sem dúvida uma vantagem significativa, mas de forma nenhuma uma garantia. Desde logo, porque basta 1 deslize para que a sensação de conforto se esfume, mas sobretudo pelos sinais que a equipa vem deixando nos últimos tempos. O conforto para o Sporting, parece-me, não vem tanto da confiança na sua própria performance, mas antes da expectativa de que também o Porto terá os seus pontos a perder até ao final da competição.

Porto
No rescaldo do jogo frente ao Nápoles tinha alertado para a perspectiva de problemas na fase de construção, para este jogo. Essa expectativa confirmou-se em pleno, com uma quantidade, diria, pornográfica de perdas de bola em zona normalmente proibida. A factura foi, neste sentido, extremamente generosa para os riscos que a equipa correu, mas isso tem mais a ver com demérito alheio do que com mérito próprio, não servindo por isso de atenuante. Em particular, parece-me que o Porto tenta forçar a progressão em apoio a todo o custo, não revelando porém uma preparação colectiva para responder aos problemas que uma atitude mais pressionante lhe possa colocar. A consequência é um desfasamento significativo entre o risco assumido e a qualidade apresentada, tal como ficou bem patente neste jogo. Mas este é apenas um dos aspectos que há para corrigir no novo Porto de Luís Castro, com outros indícios, identificados na partida da Liga Europa, a serem igualmente confirmados no teste de Alvalade. A saber, e para além da fase de construção 1) o comportamento da linha defensiva, frequentemente exposta em situações questionáveis; 2) o posicionamento defensivo dos médios interiores, com Fernando a aparecer frequentemente isolado "entrelinhas"; 3) a dinâmica ofensiva, novamente com os médios interiores em foco, e com a dificuldade de explorar o jogo interior a manter-se desde a saída de Lucho.

São motivos de sobra para que exista alguma apreensão em relação ao futuro imediato, com a agravante da equipa atravessar nesta altura um ciclo competitivo muito apertado e não haver propriamente condições para que, através do treino, se possam corrigir muitos destes aspectos. Aliás, é no plano estratégico que Luís Castro justificará mais criticas relativamente ao que se passou neste jogo, porque se os sinais eram - tal como escrevi - identificáveis, as consequências eram também elas perfeitamente antecipáveis e, logo, possíveis de evitar ou atenuar através do plano estratégico. É bom que tudo isto seja bem equacionado para o jogo de Nápoles, porque se Benitez apostar numa abordagem mais agressiva, ao contrário do que fez na primeira mão, o Porto poderá passar por grandes dificuldades, já que o potencial técnico dos dianteiros napolitanos não é certamente igual aos do Sporting.

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14.3.14

Tottenham - Benfica: Estatística e opinião

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O futebol tem na volatilidade um dos seus maiores pontos de interesse. Por vezes, paga-se caro ao mais subtil dos pormenores. Noutros casos, as vitórias aparentam surgir com uma ligeireza capaz de surpreender o mais despreocupado dos optimistas. O Benfica tem sido, como poucos, um bom exemplo desta bipolaridade do jogo, e se num passado recente pareceu ter os deuses todos contra si, hoje passa por um momento perfeitamente inverso. Não quero com isto a menosprezar a exibição encarnada em Londres, que num cenário bastante complicado conseguiu controlar de forma notável um adversário de grande qualidade. Mas, convenhamos, poucos jogos haverá em que se marca 1 golo no primeiro remate e, sobretudo, 2 golos na sequência dos únicos 2 cantos conquistados em todo o jogo.

Analisando por partes, o Benfica teve diante de si um jogo muito complicado, onde sentiu quase sempre muitas dificuldades em ter bola, perante a densidade promovida pelo posicionamento táctico da equipa inglesa. A oportunidade, para a equipa encarnada, rapidamente se identificou, e esteve sempre na exposição que o Tottenham oferecia nas costas da linha defensiva (muito subida, precisamente, para fazer a tal redução do espaço que condicionou o jogo apoiado do Benfica). E foi, sem surpresa, por essa via que o Benfica acabou por ganhar vantagem. Mas, se a equipa tardou em conseguir gerir o jogo com bola - já irei à fase positiva da exibição, neste plano - também foi evidente que teve sempre um grande controlo sobre a iniciativa ofensiva do adversário, mesmo com este a ter o maior volume de jogo e presença territorial. À margem do golo, que acontece de livre, o Benfica foi apenas exposto por uma vez, numa situação de transição que terminou numa finalização de Adebayor. Não seria fácil para nenhuma equipa fazer melhor em termos defensivos, perante um adversário com a qualidade do Tottenham e, sobretudo, com tão pouca posse de bola como teve o Benfica.

No entanto, se até ao 2-1 o Benfica tinha alicerçado a sua vantagem no mérito defensivo e na eficácia do pouco que havia criado ofensivamente, a partir daí a equipa passou a gerir, finalmente, o jogo com bola, arrancando para um final de jogo de muito maior qualidade. A explicação é simples e terá sido fácil de perceber por todos que acompanharam o jogo: as entradas de Enzo e Gaitan. Até esse ponto, apenas Ruben Amorim tinha conseguido responder com serenidade e eficácia à tal densidade que os Spurs impunham no meio-campo, mas com a entrada dos dois argentinos essa capacidade triplicou e, rapidamente, o Benfica congelou um jogo que parecia ter tudo para se começar a ferver.

Com ou sem felicidade, o facto é que o 1-3 de White Hart Lane vem colocar o Benfica muito perto dos quartos-de-final e, se tal se confirmar, a presença em nova final europeia passará a ser um cenário bastante plausível, tendo em conta a concorrência e o actual momento da equipa. Na verdade, não pode ser surpreendente, se tivermos em conta o que aconteceu em anos anteriores, o que se estranha é como é que esta equipa se viu envolvida por tanto descrédito e durante tantos meses...

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Porto - Nápoles: Estatística e opinião

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O momento da época, e da própria equipa, não permite que se confundam prioridades: ganhar é, mais do que nunca, o fundamental. Neste sentido, percebe-se perfeitamente a satisfação pelo triunfo e a esperança que este transmite, tanto a adeptos como aos próprios jogadores. Para segundo plano ficam, ainda assim, alguns sinais menos positivos relativamente ao que a equipa mostrou em campo, e que deverão justificar alguma moderação no optimismo com que se projecta o futuro imediato.

Começando pela fase de construção, pessoalmente não me pareceu um grande jogo da equipa azul-e-branca, com vários erros potencialmente comprometedores e perante uma equipa que não faz do condicionamento pressionante sobre a fase de construção adversária uma prioridade do seu jogo. Este parece-me um ponto importante para o clássico de Alvalade porque, ao contrário do Nápoles, o Sporting adopta uma postura mais pressionante sobre nesta fase do jogo, tendo sido precisamente aí que o Porto mais dificuldades sentiu no jogo para a Taça da Liga. É, portanto, um aspecto interessante para acompanhar no fim-de-semana.

Depois, e previsivelmente, há aspectos que não parecem ainda totalmente assimilados, nomeadamente em organização defensiva. A definição do pressing, e o papel dos dois médios interiores, causa-me algumas dúvidas, mas o ponto onde a equipa se revelou mais vulnerável foi no comportamento da linha defensiva, várias vezes assumindo o risco de expor a profundidade, em situações onde me parece muito discutível que o faça. Este é um problema que vem de trás e que, mesmo havendo essa intenção, pode não ser fácil de corrigir no imediato. Seja como for, o Nápoles teve também muito mérito na forma como, em algumas ocasiões, expôs as costas da defesa portista.

Tudo somado, o Porto sai desta primeira mão com uma vitória feliz, não só pelo triunfo mas pelo facto de não ter sofrido qualquer golo, num jogo onde o Nápoles fez mais do que o suficiente para o ter conseguido. Para já, e mais até do que melhorar, o grande desafio é conseguir que a equipa dê continuidade a este nível de resposta, num ciclo de jogos muito apertado, de elevado grau de dificuldade e onde não se prevê que não haja muita rotatividade nas escolhas dos principais protagonistas. Não vai ser fácil...

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13.3.14

Champions, oitavos-de-final (VI)

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Barcelona - Man City
Foi um jogo muito entretido, e onde quase sempre sobressaiu o elevado nível técnico dos dois conjuntos. Daí o número elevado de oportunidades, com os golos a tardar em fazer justiça à superiorização dos ataques relativamente às defesas. De novo, e tal como no Bayern-Arsenal, parece-me importante notar que o Barça não precisava de ganhar, e isso terá sido um factor decisivo para que não tivesse forçado a vitória que, ainda assim, lhe acabou mesmo por sorrir.

Sobre o Man City, começo por questionar a ideia com que todos ficamos - eu incluído - de que "se tivesse jogado assim, na primeira mão...". De facto, a equipa apareceu menos preocupada com o controlo defensivo do adversário, com dois alas interiores que a meu ver potenciam melhor a qualidade do jogo ofensivo da equipa, e teve o mérito de ser uma das raras equipas que, de há muito tempo a esta parte, conseguiu passar uma boa parte do tempo com a bola também do seu lado - mérito para a circulação baixa da equipa que, com excepção de Bayern e Barça, talvez não fique actualmente a dever nada a ninguém. A minha questão, porém, tem a ver com as comparações entre diversas fases do jogo, onde o contexto é manifestamente diferente. Ou seja, na segunda mão, o resultado era já de 2-0, o que leva a uma atitude diferente de ambas as equipas, e com o Barça intuitivamente a ter como prioridade o controlo sobre a vantagem conseguida. Não é a primeira vez que me refiro a este problema - de tirar conclusões a partir de comparações a partir de contextos diferentes - e muitos exemplos semelhantes acontecem todos os anos, quando as equipas são derrotadas mas aparentam jogar melhor depois de estar em desvantagem. Normalmente, e precisamente por ignorar o contexto, a conclusão revela-se uma ilusão.

Relativamente ao Barça, passou uma eliminatória difícil com grande naturalidade, como talvez nenhuma outra equipa o conseguisse fazer frente a este Man City (eventualmente o Bayern teria essa capacidade), e isso prova a sua força. Ainda assim, é inegável o subrendimento da equipa quando comparada com aquilo que foi nos 5 anos anteriores. Quais são, então, as diferenças que explicam esta quebra? Começo por referir que tenho acompanhado a equipa apenas pontualmente, e que por isso poderá haver aspectos que me escapam. Ainda assim, e começando pelo lado defensivo tantas vezes desprezado nas equipas de Guardiola (de novo, o que escrevia ontem: nenhuma equipa atinge a excelência sem ser muito competente em TODOS os momentos tácticos do jogo), o Barça actual tem muito mais dificuldade no condicionamento pressionante dos seus adversários, o que lhe retira presença territorial e tempo de posse de bola. Por exemplo, creio que em épocas anteriores esta equipa do Man City teria tido muito mais dificuldade em circular como fez neste jogo. Com bola, e mesmo mantendo uma qualidade individual que, a meu ver, não encontra par em qualquer outra equipa da actualidade, há também diferenças, sobretudo ao nível do jogo posicional. Em particular, destaco - aliás, já o havia feito no jogo da primeira mão - a falta de soluções colectivas quando a equipa se aproxima da última linha do seu adversário. Neste jogo, por exemplo, foram inúmeras as vezes em que os jogadores catalães forçaram iniciativas individuais, o que obviamente acaba por favorecer as hipóteses de quem está organizado, e em superioridade numérica, para defender. Ainda dentro deste ponto, parece-me haver uma focalização excessiva em Messi, com a equipa a procurar constantemente o seu astro, mas com este a ser relegado muitas vezes para iniciativas individuais que, mesmo para ele, não são fáceis de resolver. Enfim, é este o novo Barça que temos, e duvido que possa mudar muito com esta liderança técnica. Mantém-se uma equipa fortíssima, claro, mas é também apenas uma sombra daquilo que foi na sua anterior versão.

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12.3.14

Champions, oitavos-de-final (V)

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Atl.Madrid - Milan
Pessoalmente, gostei bastante do jogo. Pela qualidade do Atlético, que voltou a fazer um grande jogo em praticamente todas as dimensões, mas também pela réplica pontualmente oferecida pelo Milan, que apesar da goleada final conseguiu criar alguma incerteza no desfecho da eliminatória, nomeadamente na primeira parte. O movimento de Balotelli, na origem do golo italiano é, aliás, um dos pontos que mais destacaria na partida, criando um invulgar momento de desorganização na defensiva 'colchonera', que teria como consequência não só o golo, mas também uma fase psicologicamente favorável ao Milan, que terminaria com o golo de Arda. E, depois sim, o Atlético tomou em definitivo as rédeas do jogo e da eliminatória.

Ainda sobre ao Atlético, e à margem do jogo, queria realçar a forma como o sucesso da equipa nos é invariavelmente explicado, quer antes, quer durante as partidas. A explicação passa sempre por realçar, primeiro, a atitude/agressividade da equipa, e depois a sua prestação num ou noutro momento táctico do jogo - normalmente transição. Ora, seja por desleixo ou incapacidade de quem analisa, a verdade é que este tipo de diagnóstico contém alguns equívocos triviais, e acaba por passar a ideia errada sobre o que é preciso para se ter, ou não, sucesso no futebol. Desde logo, dar ênfase primordial à agressividade é dar-lhe uma importância explicativa, no que ao sucesso diz respeito, que ela não manifestamente não tem. Porque se o Atlético tivesse tanto sucesso - estamos a falar de uma das 4-5 equipas de maior rendimento na Europa, actualmente - devido à agressividade, então a excelência estaria ao alcance de qualquer equipa distrital. Depois, de igual modo, nenhuma equipa pode atingir este patamar sem ter enorme competência em todos os momentos tácticos do jogo. Todos! Aliás, é interessante porque no caso do Atlético parece-me que se comete o erro inverso relativamente às análises que se fazem a equipas tacticamente mais evoluídas. Por exemplo, no caso do Barça de Guardiola, raramente se destacava a sua agressividade e competência nos momentos tácticos defensivos, quando essas eram, também, componentes fundamentais do enorme sucesso que a equipa conseguiu, e sem as quais certamente nunca o teria conseguido.

Neste jogo, por exemplo, o Atlético conseguiu 3 dos 4 golos em organização ofensiva, fruto de uma boa distribuição posicional dos jogadores, sempre com muitos apoios oferecidos ao portador da bola, o que lhe permite, não só criar situações de envolvimento no corredor por onde a bola entra, como também estar bem posicionado para a reacção à perda da bola, caso esta aconteça. É claro que o Atlético não tem a qualidade de equipas como Barça, Real ou Bayern, mas seria praticamente impossível que a tivesse, dada a disparidade de mais-valias individuais. Este é, porém, o exercício mais interessante do futebol - tentar fazer melhor, com menos - e o meu ponto, aqui, é que só se pode perceber o "fenómeno" se o analisarmos e reflectirmos na sua plenitude, e nunca através de "clichés" e análises tacticamente superficiais.

Bayern - Arsenal 
Não foi um grande jogo, nem tão pouco a eliminatória tinha já muito para nos oferecer, depois do que se passou em Londres. Aliás, creio que o conforto com que o Bayern sempre esteve na partida é a principal explicação para que o empate tivesse subsistido até ao final, já que a vitória era dispensável para os alemães. Ainda assim, do ponto de vista táctico, há bastantes pontos de interesse a explorar...

Começando pelo Bayern, a nota principal vai claramente para a estrutura que Guardiola utilizou, recorrendo ao duplo-pivot, algo que não sendo inédito desde os tempos do Barça (onde chegou a utilizar o 4-4-2, por exemplo), não deixa de ser uma novidade relativamente ao que foi hábito no percurso do treinador até aqui. Sobre sistemas tácticos, e como sempre, não tenho muito a comentar, por entender que determinam muito pouco em termos qualitativos, e só se tornam mais relevantes quando a dinâmica colectiva é mais rudimentar, o que não é - de todo! - o caso do Bayern. Assim, em posse, o Bayern apresentou uma boa movimentação colectiva, sempre com grande mobilidade em praticamente todas as suas unidades, mas com algum défice de intensidade, o que explica em grande parte as poucas ocasiões criadas, relativamente ao volume de jogo que a equipa teve. O principal contraste, em relação à primeira mão, foi o menor foco dado ao espaço entrelinhas, transferindo-se esse ênfase para as combinações sobre os corredores laterais, com Gotze e Schweinsteiger a incorporar essas zonas do terreno. Convém aqui também salientar a maior/melhor protecção do Arsenal ao seu espaço entrelinhas, particularmente através da acção de Arteta, sempre muito atento à presença de Gotze nessa zona. Para além da habitual qualidade na circulação baixa, parece-me também fundamental destacar o comportamento defensivo da equipa, em meu entender um aspecto decisivo para o conforto que a equipa manteve no jogo. Bom jogo posicional e muito boa agressividade/reactividade, o que determinou o controlo do momento de transição ataque-defesa, mas também o condicionamento constante da circulação do Arsenal, que permanentemente era obrigada a recuar a bola para o seu guarda-redes.

Sobre o Arsenal, tenho de me confessar desiludido (novamente!) com a réplica da equipa, neste jogo e nesta eliminatória. Começando pelo ponto mais estranho - a utilização de Ozil como médio-direito - talvez seja útil tentar perceber a intenção de Wenger, que certamente não era apenas colocar o criativo alemão a correr atrás de Alaba, durante 45 minutos. Penso que a lógica por detrás desta aparentemente imperceptível opção reside na principal estratégia de Wenger para a sua construção: bater longo, para o lado direito. A ideia, neste sentido, passaria por tentar que Ozil jogasse a partir da segunda-bola, tentando fazer a bola sair da zona de pressão e, possivelmente, tirando depois partido da maior verticalidade de Podolski, que partia do corredor oposto. No papel, talvez tivesse alguma lógica, na prática, revelou-se um disparate. Mas o principal problema do Arsenal não foi Ozil, nem tão pouco o aspecto defensivo, onde a equipa até esteve melhor do que na primeira mão. Foi, isso sim, a total incapacidade para ter bola, sucumbindo permanentemente ao "aperto" do pressing bávaro. Se o Bayern já é muito difícil de contrariar quando tem a bola, a tarefa torna-se irremediavelmente inglória se as poucas ocasiões em que os papeis se invertem terminam invariavelmente com o guarda-redes a pontapear a bola para a frente. Ora, foi precisamente isso que sucedeu e, no caso do Arsenal, creio que se exigia mais arrojo e mais qualidade na circulação baixa, até porque se o pressing do Bayern fosse ultrapassado, a equipa teria depois boas possibilidades de criar os desequilíbrios de que tanto precisava. Mas esta não é a primeira vez que o Arsenal deixa a desejar em grandes confrontos europeus, sendo essa a regra do seu historial recente. Discute-se muito, relativamente a Wenger, se o copo está meio-vazio ou meio-cheio. Pessoalmente, parece-me que o principal mérito do francês é mesmo o recrutamento, tendo conseguido compor sistematicamente equipas de elevado nível técnico, o que naturalmente potencia o "fancy-football" que todos apreciamos. No que respeita à capacidade de superação da sua própria equipa, porém, não creio que se possa esperar muito de Wenger. O Arsenal parece sempre demasiado dependente da superioridade técnica para se afirmar, e quando isso não se verifica a equipa não tem, nem um nível de organização, nem tão pouco uma versatilidade estratégica que lhe permita fazer frente a adversários mais fortes. Não posso dizer que o problema do Arsenal seja Wenger - até porque esse tipo de análise tem de ter sempre uma perspectiva comparativa - mas parece-me claro que, com o francês, o objectivo de competir com os melhores terá sempre de passar por um nível de investimento muito elevado, e nunca pela capacidade de superação da própria equipa.

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11.3.14

Penáltis e a apofenia da derrota

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O jogo de Setúbal serviu de mote para reforçar o tema das arbitragens na primeira linha do plano mediático. Sem querer, como é óbvio, entrar com grande profundidade nesse tipo de discussão, aproveito para deixar um simples exercício comparativo, sobre a importância dos penáltis nos golos marcados pelas várias equipas, no campeonato e ao longo das últimas 10 épocas. Para efeitos comparativos, incluí também as duas ligas mais competitivas da actualidade, de Espanha e Inglaterra. A ideia é ter um indicador relativo, e não absoluto, já que uma equipa que ataca mais terá, naturalmente, tendência para ter mais penáltis marcados a seu favor, e vice-versa. Seria igualmente interessante complementar a análise com os dados defensivos (ou seja, % golos sofridos por penáltis), mas o acesso a esses dados revelar-se-ia bem mais moroso para mim, não sendo este um tema que justifique tanto trabalho.

A primeira nota a salientar, olhando para estes quadros, é que não há uma disparidade tão escandalosa como a veemência dos discursos dos adeptos e dirigentes parece sugerir. Sem qualquer surpresa, de resto. O ponto que mais realçaria, aliás, vai para o facto de, em Portugal, os "grandes" estarem todos no topo da tabela, o que não acontece em Espanha ou Inglaterra. Mas, tão pouco, esta é uma tendência clara que nos permita confirmar uma outra tese tantas vezes repetida, de que os "grandes" são mais favorecidos do que os outros. Em suma, e na melhor das hipóteses, os dados de penáltis não podem ser considerados mais do que inconclusivos, relativamente às diversas teorias acerrimamente defendidas nas discussões sobre o tema. Uma constatação que parece afastar, pelo menos, a hipótese de tendências claras em favor ou desfavor de alguns clubes (no que a penáltis diz respeito), já que se isso acontecesse seria impossível que tal não se reflectisse nos números acumulados.

Para mim, e como quem me lê saberá, este é um tema que valorizo muito pouco na definição do sucesso de médio-longo prazo dos clubes, ainda que como agentes directos no jogo, os árbitros possam ter obviamente influência nos resultados de cada partida. Vejo a permanente polémica em torno da arbitragem como uma consequência inevitável da natureza emotiva do fenómeno futebolístico e da relação dos adeptos com os seus clubes. Uma espécie de apofenia colectiva, que ganha especial força na hora das derrotas. E é essa a minha explicação para o facto de assistirmos repetidamente - ano após ano - ao mesmo tipo de discussão, e para o facto dos clubes campeões serem sempre conotados como favorecimentos das arbitragens, no final de cada temporada. Foi assim com Porto, Benfica, Sporting e Boavista quase sempre que chegaram aos seus títulos. Neste sentido, e na minha óptica, a arbitragem é e será sempre um tema central nas discussões extra-jogo, aconteça o que acontecer. Porque o que as motiva, verdadeiramente, não é tanto os erros dos árbitros, mas sim a natureza dos adeptos.

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10.3.14

As 4 lutas da tabela

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Primeiro lugar - a questão a colocar, depois desta jornada, é se ainda haverá alguma dúvida a colocar em relação ao campeão 2013/14? É certo que o passado recente não aconselha precipitações na atribuição precoce das faixas, mas é bom não confundir a excepção com a regra, e a regra é que uma equipa nas condições actuais do Benfica tem uma probabilidade muito reduzida de perder o título ou, mesmo, de ainda ver o seu primeiro posto ser colocado em causa nas jornadas que faltam. Para mais, não tenho dúvidas de que Jesus continuará oferecer ao campeonato prioridade total na gestão da equipa (tal como fez frente ao Estoril, em vésperas de uma difícil jornada europeia), o que não ajuda as perspectivas de Porto e Sporting para uma eventual recuperação. Ou seja, e no que ao Benfica diz respeito, o campeonato continuará a ser a prioridade, mas o mais provável é que o tempero do que ainda falta jogar esteja reservado para as 3 competições restantes, onde se aproximam duelos muito interessantes.

Segundo lugar - O clássico da próxima semana será, obviamente, muito importante para definir posições antes da recta final do campeonato. Pessoalmente, acho improvável que Porto e Sporting somem por vitórias todos os jogos que fiquem por jogar depois desse jogo. No caso do Porto, porque mesmo perspectivando uma melhoria da equipa no futuro imediato, há que contar com o peso do calendário. Para além da Liga Europa, o Porto jogará nas duas taças, e até mais do que a conquista das mesmas, muito do brio da sua equipa actual. Jogar contra o Benfica, para o Porto, não é o mesmo que jogar contra outra equipa qualquer, e por isso esses duelos acabarão por ter uma importância que, nessa altura, poderá relegar o campeonato para segundo plano e custar alguns pontos. Isto, claro, para além da Liga Europa, onde o Porto mantém ambições. Quanto ao Sporting, e como venho escrevendo, o seu futebol há muito que não é suficiente para que se possa perspectivar uma sequência muito continuada de vitórias. A equipa tem lidado bem com a adversidade, é certo, mas isso não será nunca suficiente numa prova de longa duração como é o campeonato. Com apenas 2 pontos de vantagem sobre o Porto e, face ao actual rendimento do futebol leonino, seria mesmo muito importante uma vitória no próximo fim-de-semana. O Sporting depara-se agora com o irónico cenário, que se lhe projectou como pior possibilidade depois do bom inicio de época que realizou: ou seja, a equipa corre o risco de cumprir as suas metas iniciais no campeonato, e mesmo assim, sair de 2013/14 com um sentimento de frustração.

Europa - Com o Estoril em excelente posição - quer pela situação pontual, quer pela qualidade que apresenta - para confirmar o quarto lugar, poderemos ter um final de época muito interessante na luta pelo quinto posto. Esta jornada contemplava dois jogos muito importantes a este respeito: o Braga-Nacional e o Marítimo-Guimarães, ainda por jogar. É uma corrida, nesta altura, muito imprevisível: o Nacional tem a vantagem pontual, mas pouco mais do que isso. O Braga será a equipa com melhores recursos, mas nem o seu futebol é ainda suficientemente consistente nem, tão pouco, o calendário lhe é favorável. O Guimarães tem um óptimo calendário, mas nem por isso o nível do seu jogo lhe permite dar por garantida a vitória em qualquer dos embates que tem por disputar. Sobra ainda o Marítimo, que certamente continuará a sonhar com a Europa enquanto isso lhe for permitido e que, se vencer o Vitória, passará certamente a ser um importante candidato ao ambicionado quinto lugar.

Despromoção - Os dois jogos deste fim-de-semana tiveram como especial consequência a saída do Gil Vicente das contas da despromoção. Aliás, com o calendário que tem, a equipa de João de Deus poderá até acabar a prova muito bem posicionada. Para baixo, ficaram Paços, Belenenses, Olhanense e, também, Arouca, sendo que dificilmente outro clube conseguirá o "feito" de se intrometer nesta luta. O Paços tarda, e provavelmente já não vai a tempo, em se encontrar nesta temporada. O desgaste competitivo e emocional da aventura europeia e uma época muito mal gerida no que respeita ao comando técnico, ditaram uma longa trajectória à procura de um carácter e identidade colectiva que, no entanto, nunca chegou. Tudo o que resta é salvar a pele e minimizar danos. Em Olhão, a equipa parece, pelo menos em termos de crença colectiva, estar no seu melhor momento da época. O problema é que são muitos os danos acumulados e, se combinarmos a situação pontual com o calendário, talvez ninguém quisesse trocar de lugar com o Olhanense. Outro candidato sério à despromoção é o Belenenses que, passe o exagero, é uma equipa que só conhece um momento táctico: organização defensiva. É espantoso que uma equipa com tão poucos golos sofridos esteja nesta situação, mas a verdade é que o Belenenses é uma equipa de contrastes e se defensivamente se organiza bastante bem (ainda que, a meu ver, tenha perdido alguma qualidade desde a primeira volta), com bola denota uma preocupante ausência de ideias, o que lhe tem custado golos e muitos pontos. Nestas contas, há ainda que não descartar o Arouca. É improvável, mas como bem sabe Pedro Emanuel pelo que lhe aconteceu em Coimbra, o futebol às vezes prega algumas partidas deste tipo.

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7.3.14

5 jogadas (controlo da profundidade)

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Aproveito algumas jogadas do passado fim de semana para abordar o tema do controlo da profundidade, tantas vezes na origem dos golos que vamos vendo. Como ponto prévio, quero referir que esta é uma situação muito difícil de defender com eficácia, porque normalmente exige decisões num espaço de tempo muito curto, requerendo a coerência de vários jogadores e, várias vezes, com muito espaço para controlar. No mesmo sentido, não é minha intenção passar a ideia de que há formas certas e erradas de abordar o problema - aliás, essa é uma abordagem que refuto em quase tudo no futebol. A utilidade deste, como qualquer outro princípio comportamental, está dependente da eficácia na sua implementação, e é praticamente impossível alguém ter a certeza de que uma forma de defender seja, por si só, mais eficaz do que a outra. Como em quase tudo no futebol, a opção acaba por depender da convicção de cada um, sendo que bons treinadores, que conseguem colocar as suas equipas a controlar bem este tipo de situação, têm frequentemente abordagens perfeitamente distintas na forma de o fazer. Pessoalmente, a minha percepção é que equipas, como Chelsea ou Atlético de Madrid, que tendem a arriscar menos em termos de exposição espacial, acabam por ter um melhor controlo deste tipo de situação. Mas, como referi, é uma situação discutível, e daí também o seu interesse...

1 - Começo por recuar 1 semana no tempo para recuperar o primeiro golo do Arouca em Braga. O meu foco, aqui, vai para a ausência de pressão sobre Ceballos, sendo que Sasso tinha todas as condições para o fazer - inclusivamente, Ceballos começa por receber de costas. A pressão sobre o portador da bola é um dos aspectos fundamentais para o controlo da profundidade e, neste caso, para além de dar tempo à equipa para se reorganizar, a pressão seria fundamental para evitar a exposição das costas de uma linha defensiva ainda demasiado subida no terreno. Este lance, tal como o do segundo golo sofrido pelo Braga no mesmo jogo, evidenciam as dificuldades de Sasso para jogar como defesa-lateral, e daí a minha crítica em torno da decisão de, no jogo de Alvalade, ter sido novamente lançado para a mesma posição.

2 - O segundo golo sofrido pelo Porto em Guimarães espanta pela simplicidade com que Marco Matias surge na cara de Hélton. O primeiro ponto a abordar é, na minha opinião, o posicionamento de Alex Sandro. É normal haver alguma abertura posicional, já que era o Porto quem tinha inicialmente a bola, mas no momento em que se torna evidente a reposição de Hélton para o lado direito, exigia-se maior prudência do lateral-esquerdo no seu posicionamento, coisa que não aconteceu. Depois, porém, também me parece questionável a abordagem de Abdoulaye. Mais uma vez, tudo surge numa situação em que se perde a presença pressionante sobre o portador da bola - no caso, Maazou. Abdoulaye optou por se manter na mesma linha, tentando usar o fora-de-jogo para condicionar a iniciativa do Vitória. A meu ver, é muito discutível a opção, simplesmente porque a ausência de controlo sobre o tempo de execução de Maazou determina que o risco de exposição aumente assinalavelmente.

3 - O grande golo de Gaitan também justifica alguma reflexão a este propósito. Ao manter-se mais alta, a linha defensiva do Belenenses consegue cortar todas as linhas de passe ao extremo argentino, o que num primeiro momento aparenta garantir o sucesso da sua acção. Perante um jogador que vinha em velocidade, porém, o número de metros nas suas costas acabou por oferecer outra solução a Gaitan, no caso a progressão individual. No lance, há ainda que destacar dois aspectos: primeiro, claro, a qualidade de Gaitan. Depois, também, a acção de Matt Jones. O ideal, perante uma defesa tão alta, é que o guarda-redes esteja preparado para intervir nas suas costas. Não sendo isso possível, porém, exigia-se mais prudência na saída da baliza, precisamente para não permitir que Gaitan fizesse o que acabou por fazer. Ainda assim, note-se, Matt Jones tem sido um dos grandes destaques da prova, no que a guarda-redes diz respeito.

4 - O primeiro de golo do Chelsea em Craven Cottage evidencia-se pela facilidade com que a equipa transformou um lançamento lateral na imediação da sua área, numa situação de 1x0, na área oposta. E, de novo, o tema do controlo da profundidade justifica discussão. O ponto mais evidente e comprometedor é, claro, a falta de sintonia entre os jogadores do Fulham, com alguns jogadores a tentar manter a linha de fora-de-jogo e outros a recuar, tentando desesperadamente recuperar metros. Seja como for, a questão que coloco é até que ponto se justificava arriscar usar o fora-de-jogo como condicionamento do adversário, numa situação em que Hazard não estava a ser directamente pressionado?

5 - Neste último caso, o desfecho acaba por ter algum perigo para a baliza de Courtois, mas o meu sublinhado vai para aquilo que me parece ser uma boa reacção colectiva do Atlético de Madrid. Ao tirar a bola da zona de pressão, o Real fica com uma situação muito favorável para explorar a profundidade, não havendo pressão sobre Di Maria e com Ronaldo e Benzema a terem reacções fortíssimas neste tipo de situação. O Atlético, porém, consegue rapidamente cortar a profundidade, e mesmo se o Real, por mérito próprio, chega a uma situação de finalização, parece-me que o facto de a acção não ter terminado com um jogador na cara de Courtois é, em si mesmo, um significativo atenuar dos danos potenciais.

Fugindo um pouco ao tema, aproveito para realçar o bom derbi de Madrid que tivemos no passado fim-de-semana. Duas das melhores equipas do futebol mundial, com características e pontos fortes muito diferentes, mas ambas com muita qualidade. O Real com um grande potencial técnico na frente, e hoje com uma circulação baixa que usa muito bem a largura e abertura dos seus médios (Di Maria e Modric) como ponto de partida para as suas jogadas. O Atlético - provavelmente a equipa que, actualmente, mais admiro - com recursos mais modestos, mas como uma organização e sentido colectivo notáveis, fortíssima no controlo defensivo, e muito lúcida sobre a forma como pode causar estragos nos adversários. Um grande jogo, e um desfecho que, também ele, me pareceu justo.

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