24.2.14

Rio Ave - Sporting: Opinião e Estatística

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- Como explicar estas estranhas oscilações no futebol do Sporting? Particularmente, como explicar o sucesso do denominado "Plano B" em contextos específicos, sendo que quando foi aplicado de uma forma mais prolongada, os sinais foram absolutamente contrastantes? Receio que, para quem procura uma solução do tipo "chave na mão", a minha resposta não seja particularmente interessante...
No futebol, como em quase tudo na vida, temos a tentação de procurar nexos de causalidade que possam explicar, linearmente, tudo o que vemos. Acontece que essa tentação, quase irresistível para a natureza humana, nos leva com demasiada frequência a um raciocinio que é, do ponto de vista lógico, errado, nomeadamente por procurar a causa a partir do efeito, e não o contrário. No caso do futebol, repetidamente recorremos à táctica como factor universalmente explicativo, ignorando o efeito complexo da interacção de factores que, de forma dinâmica, vão influenciando o jogo. É por isso que fenómenos como o factor casa, ou o facto de haver mais golos nas segundas partes dos jogos permanecem sem ter uma causa claramente identificada, apesar de assumirem uma influência praticamente transversal a todas as equipas e campeonatos. E é neste sentido que a minha resposta para o mistério do "Plano B" do Sporting se revela desinteressante. Ou seja, não me parece que se possa isolar um factor explicativo para as diferenças de resposta da equipa, e tudo terá provavelmente a ver com a complexidade do contexto e não com uma simples alteração táctica que possa, miraculosamente, resolver todos os problemas de Leonardo Jardim.

- Entrando mais concretamente no jogo de Vila do Conde, referir que foi uma vitória importante do Sporting, num campo difícil e com uma reacção, de novo, muito boa à adversidade. Porém, as boas notícias, para o Sporting, acabam aqui, porque olhando para o jogo como um todo a exibição leonina estará muito longe de oferecer garantias para o que quer que seja.
O factor marcante da partida esteve, na minha leitura, na diferença da resposta da equipa em termos de construção, da primeira para a segunda parte, assim como no próprio comportamento do Rio Ave com bola. Na primeira parte, o Sporting havia sentido sempre muitas dificuldades na ligação do seu jogo, o que é mais habitual no que respeita ao corredor central, mas que não o costuma ser tanto, relativamente aos corredores laterais. Em desvantagem, o Sporting passou a arriscar mais na progressão pelo meio, com William Carvalho a emergir no jogo, com Montero a ser referência como apoio frontal e com Mané a acrescentar capacidade de transporte de bola nessa zona. Ainda assim, note-se, o Sporting não forçou nunca um jogo muito directo, servindo-se apenas de Slimani como finalizador e não tanto como referência para a construção - uma solução que, a meu ver e salvo em raras circunstâncias, retira qualidade ao jogo do Sporting. Daí que, desta vez, o tal "Plano B" tenha tido características diferentes do habitual.  Do ponto de vista do Sporting, seja como for, urge encontrar um rendimento mais consistente e menos dependente destes "gritos de revolta" em situações de adversidade. Até porque, ninguém tenha ilusões, no longo-prazo acabarão por ser mais os pontos perdidos do que as reviravoltas.
Convém, aqui, fazer uma referência ao Rio Ave, que recorreu sempre muito ao pontapé longo (muito longo!) de Ederson para a sua construção. É uma opção que me parece razoável num jogo destes, mas que também me parece ter tido uma interpretação não muito bem preparada, do ponto de vista colectivo. Não sei se o guarda-redes procurava um jogador em concreto ou se tentava apenas bater o mais longo possível, o certo é que frequentemente a equipa não pareceu devidamente preparada para disputar as segundas-bolas, já bem dentro do meio-campo do Sporting. Algo que poderá ter sido decisivo para o domínio territorial que o Sporting conquistou no segundo tempo e que, com um uso mais calibrado deste recurso, provavelmente teria complicado bem mais as aspirações da reacção leonina.

Individualidades (Sporting)
Rui Patrício - Mais um bom jogo, apesar do golo sofrido. Particularmente, importante a intervenção da primeira parte que, com a ajuda de Maurício, impediu o golo do Rio Ave. Tem sido um dos pontos fortes do Sporting neste campeonato e, provavelmente mesmo, o melhor guarda-redes da prova.

Cedric - Já várias vezes o elogiei nesta temporada, mas desta vez fez um jogo simplesmente desastrado. Em particular, com bola, teve um desempenho técnico muito mau, com várias decisões questionáveis, bombeando repetidamente a bola em profundidade, mas quase sempre sem propósito. Defensivamente, por outro lado, não há muito a apontar e confirma a melhoria observada esta época, nomeadamente em termos posicionais.

Jefferson - Se, do outro lado, Cedric esteve mal, Jefferson pouco melhor esteve. Um pouco mais consequente com bola, é certo, mas também à custa de muito risco, optando por conduzir a bola em situações de risco, algo que foi repetindo até se dar a perda que custou um golo à equipa. Também defensivamente, não esteve isento de erros e acabou por salvar a sua exibição pelo decisivo cruzamento para o golo, numa jogada em que tirou partido da má abordagem defensiva de Pedro Santos, antes de cruzar.

E.Dier - De longe, a melhor exibição que lhe vi fazer esta época. Irrepreensível a defender, com várias intervenções fora da sua zona, e desta vez sem comprometer a equipa a construir. Neste registo, sim, é possível perspectivar que Dier venha inevitavelmente a conquistar o seu lugar na equipa. Mas terá sempre de ser a partir das bases, do que é fundamental para um central, e nunca do que é acessório e muitas vezes descontextualizado das orientações colectivas. Veremos que continuidade dará...

Maurício - Não teve de sair tanto da sua zona, comparativamente com Dier, mas esteve igualmente eficaz e interventivo nas suas acções defensivas. Foi manifestamente infeliz no lance do auto-golo, tendo inclusivamente definido muito correctamente o posicionamento numa situação díficil, de inferioridade numérica, mantendo-se na linha de passe para o cruzamento. Único reparo para uma perda de bola na primeira parte, quando quis forçar a entrada da bola em William Carvalho.

William - Não foi um jogo extraordinário, e começou até por ser uma exibição bastante modesta, onde a sua influência no jogo foi escassa. No entanto, cresceu muito na segunda parte, arriscando mais e dando-se bem com isso, o que acabou por ser decisivo para o domínio que a equipa exerceu após o golo sofrido. Tudo somado, acabou por ser das unidades de maior rendimento da equipa.

Adrien - De novo, o contraste entre o que faz com e sem bola. Defensivamente, muito bem, com grande intensidade, ganhando vários duelos e com bom ajuste posicional, nomeadamente entre o meio e a esquerda. Com bola, no entanto, voltou a estar inconsistente, parecendo acusar algum desgaste com o evoluir do tempo e falhando, quer no objectivo de oferecer maior qualidade/consistência à ligação do jogo, quer no propósito de ajudar a aproximar a equipa do golo.

André Martins - É verdade que teve dificuldades em encontrar soluções de passe no último terço, em particular porque o Rio Ave controlou bem os seus movimentos sobre o corredor direito (através de um encaixe individual que já havia resultado no jogo de Alvalade). Mas não concordo que seja este jogo a servir de motivo para que se aponte o dedo a André Martins. Estas são as suas características - para o bem e para o mal - e o seu rendimento não esteve muito distante dos restantes jogadores ou daquilo que vem habitualmente fazendo. Isto é, é verdade que não teve a preponderância que a equipa precisava, mas isso não foi um contraste com o que é hábito ou com aquilo que foi a regra da equipa, na primeira parte. Com Adrien suspenso, seria interessante vê-lo nessa posição, onde creio ter mais vocação para actuar.

Heldon - Pela forma como lhe foi oferecida a titularidade, percebe-se que terá sido uma contratação com forte aprovação do treinador. A verdade é que não conseguiu ainda justificar a diferença para as restantes soluções da posição, quer em termos de capacidade de desequilíbrio, quer em termos de qualidade na envolvência no jogo.

Wilson - Um desempenho bastante modesto, onde teve até uma boa eficácia nas suas aparições com bola, mas onde não conseguiu causar qualquer impacto, acabando igualmente por fazer um jogo de muito pouca utilidade em termos de trabalho defensivo.

Montero - Permanece sem marcar, em parte porque a equipa não tem produzido muito em termos ofensivos, e em parte porque ele próprio não tem conseguido um grande impacto, sentindo-se alguma ansiedade na tomada de decisão. É claro que não se pode esperar a mesma frequência goleadora quando joga numa posição mais recuada, como tem acontecido com frequência, e isso deve ser tido igualmente em conta. Na segunda parte teve algum peso na ligação do jogo ofensivo, oferecendo-se como apoio frontal. Com mais um golo de Slimani e um jogo de suspensão, poderá ter perdido a titularidade como principal referência ofensiva da equipa.

Mané - Já havia causado um impacto positivo, jogando numa posição mais interior, mas onde a sua capacidade de transporte fez alguma diferença relativamente à primeira parte. Depois, acabou por marcar mesmo o golo decisivo, justificando-se a continuidade na aposta que nele vem sendo feita.

Slimani - O seu impacto como substituto tem sido incrível e, até, praticamente impossível de manter no futuro. Na próxima semana terá mais uma oportunidade como titular, e se tiver a sorte de marcar, certamente que a titularidade será sua.

Carrillo - Confesso que não vejo grandes motivos para o seu eclipse recente, suspeitando que os motivos terão a ver com mais do que aquilo que mostra em campo. Isto, porque Carrillo permanece como o mais virtuoso entre os extremos da equipa, e mesmo que a sua regularidade ainda não tenha sido conseguida, também me parece estranho que não tenha surgido mais vezes como alternativa, em algumas partidas recentes. O grande destaque da sua curta presença foi, claro, o cruzamento para o segundo golo.

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