No último “Pontapé de Saída” – na minha opinião o único programa em que se discute realmente o futebol em Portugal – a Selecção esteve em principal ponto de destaque. O momento mais curioso do programa surgiu quando Luis Freitas Lobo deixou a sua visão sobre o legado que poderá, ou não, deixar Scolari após a sua saída. O comentador revelou uma surpreendente critica ao que entende ter sido um trabalho pouco construtivo e que para Portugal não deixa... “nada”.
É uma questão interessante, sem dúvida, esta do “o que deixará Scolari”... Curiosamente, o primeiro texto que escrevi neste blog intitulava-se “Scolari, um legado para o futuro” e por aí se pode entender a minha discordância com a análise feita por LFL. Devo dizer que percebo o que quer dizer, nomeadamente no que respeita ao trabalho de base, onde de facto não trouxe mais valias, mas parece-me redutor comparar Scolari ao trabalho exercido no tempo de Queiroz. Aqui ficam alguns pontos da minha opinião sobre o assunto:
- Desvalorizar resultados desportivos sob argumento de que temos uma grande Selecção parece-me perigoso e injusto. A verdade é que Scolari é o Seleccionador mais bem sucedido da história do futebol português e um caso de sucesso a nível Mundial. Isso não deve nunca ser desvalorizado. Grandes selecções de grandes países como a Espanha ou Inglaterra que o digam...
- Não posso esquecer o que se passou com outros grupos de trabalho, com casos graves de indisciplina (“Saltillo”, “Paula”, Coreia, etc.) que não se repetiram com Scolari ao comando – pelo menos casos com a mesma gravidade.
- É verdade que Scolari não inovou na forma de jogar nacional. Não trouxe um novo modelo, nem sequer um novo sistema, mas esse não é, na minha opinião, o seu “legado”...
- Dizer que a união nacional foi conseguida através de conflitos regionais parece-me um contra-senso. A união nacional só foi restabelecida após os sucessos desportivos do Seleccionador.
- Não me parece que todas as reacções de Scolari sejam preparadas. Reagir de forma absolutamente controlada em ambientes tão tensos como jogos decisivos é algo que parece praticamente impossível. Também não me revejo em muitas das suas posições, mas é uma característica que faz parte do seu carácter e com a qual ele sabe bem viver.
- O verdadeiro legado de Scolari está, na minha opinião, na forma como orienta e se relaciona com o seu grupo. Pela primeira vez as convocatórias deixaram de ser um mero prémio para os jogadores em melhor forma e feitas em torno dos interesses dos 3 grandes. O grupo era o mais importante e a cultura de um espírito comum com vista a um objectivo foi quase sempre privilegiada. Por vezes não foram os melhores do ponto de vista individual, mas foi sempre aquele que o Seleccionador pensava ser o melhor grupo. Esta é uma forma diferente de estar de todos os outros Seleccionadores e que deve ser absorvida e cultivada após a sua saída.
- Francamente, hoje vejo a Selecção com mais força mental e mais independência da clubite que tantas vezes a impossibilitou de representar melhor as cores nacionais. Scolari tem bastante mérito nisso e creio que não aprender nada com estes anos seria um grande desperdício..