18.9.14

Notas da Champions (Benfica, Porto e Sporting)

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Benfica - Zenit - Um desfecho decepcionante face às expectativas do Benfica para este duelo e para esta competição. Há duas formas de ler o que se passou. A primeira, enfatizando o condicionalismo de se ter jogado em inferioridade numérica durante 70 minutos. A segunda, sublinhando que o Zenit demorou apenas 20 minutos a materializar o 'knock-out' no estádio da Luz. Pessoalmente, tendo a valorizar mais a segunda, até porque se o Benfica ficou reduzido a 10, tal só aconteceu porque Artur resolveu adiar o segundo golo, trocando-o pela sua presença em campo.
Explorando os motivos que estão na base da derrota, começo por Jardel, e pelos passes perdidos em zona proibida. A importância da segurança na primeira fase de construção é um tema que valorizo muito e que abordo com bastante frequência e há muito tempo a esta parte. Mas importa não confundir as coisas, porque ter segurança não implica que se tenha uma grande qualidade de construção, e vice versa. O primeiro problema, da segurança, precede o segundo, da qualidade de construção. A segurança visa impedir aquilo que sucedeu ao Benfica, ou seja ser exposto defensivamente, e a qualidade de construção tem como objectivo fazer a equipa progredir de forma útil para fases mais adiantadas do jogo ofensivo. E, aqui e por tudo isto, quero logicamente reforçar que o problema das perdas de bola do Benfica não tem como explicação fundamental uma eventual falta de qualidade técnica dos seus centrais, mas sim com o seu critério em posse. A qualidade técnica afectará, sim, o potencial qualitativo da construção, e aquilo que ela pode oferecer ao processo ofensivo, mas não necessariamente a segurança. Até porque para fazer um passe lateral de 10-15 metros, como aquele que deu origem ao primeiro golo no jogo, não é preciso uma qualidade técnica especialmente relevante. Para dar exemplos do futebol português, posso lembrar David Luiz, que era um jogador que oferecia grande potencial à construção, precisamente pela qualidade técnica que tem, mas que colocava em risco várias vezes a segurança na fase de construção, pelo critério que assumia. Outro exemplo idêntico, mas no Porto, Otamendi. Em sentido inverso, temos no Benfica o caso de Luisão, que é um jogador que não oferece especial mais valia à construção, mas que raramente coloca em causa a segurança da equipa, pelo bom critério que assume.
Ainda assim, e apesar do destaque que lhe dei, não atribuo todas as responsabilidades da derrota do Benfica à falta de critério na sua fase de construção. Outro ponto em que a equipa se revelou vulnerável foi na exposição das costas da sua linha defensiva. Aqui, mais do que a coordenação dos próprios defensores, destacaria a perda de presença pressionante sobre o portador da bola, que é uma condição umbilicalmente ligada à segurança da própria linha defensiva. Demérito para o meio campo do Benfica, que foi incapaz de se impor a esse nível, mas também muito mérito para o Zenit. Aqui, destacaria os duelos directos (o Zenit venceu a maioria, e isso foi um ponto de partida importante), a capacidade para sair de forma útil de zonas de pressão, e a preparação dos jogadores para realizarem diagonais de rotura nos tempos certos. Este último ponto, das diagonais de rotura, parece-me ainda pouco trabalhado no futebol português, e talvez também por isso tenhamos tanta dificuldade em formar jogadores com facilidade em explorar eficazmente as zonas de finalização. Finalmente, uma nota sobre Garay. No ano passado coloquei-o entre os principais jogadores do campeonato, com Jackson, Gaitan, Wiliam e Rodrigo, e penso mesmo que haverá poucos centrais com a sua capacidade no futebol actual. Com bola, e recuperando o tema do parágrafo anterior, combina qualidade técnica com critério, oferecendo potencial e segurança. Sem bola, tem uma notável leitura de jogo, o que lhe permite antecipar as jogadas, sendo forte tanto a controlar o espaço nas suas costas, como a dominar os duelos que trava com os avançados, na sua frente. Se tem sido difícil ao Benfica substituir Garay? Pudera!

Porto - BATE - Criticou-se a ausência de jogo interior, e a equipa vinha do seu resultado menos conseguido na temporada. O que fez Lopetegui? Tirou um médio, colocou um avançado, acentuou ainda mais a profundidade vertical e a necessidade de recorrer à largura para progredir. Resultado? Uma goleada que recupera toda e qualquer mazela no estado anímico de equipa e adeptos, fazendo ressurgir mais do que nunca o optimismo em torno do sucesso desportivo na presente temporada.
Há algumas conclusões a retirar de tudo isto. A primeira é que Brahimi é um craque (já se sabia, é verdade, mas convém não esquecer que o Porto chega ao 4-0 com 3 golos de iniciativas individuais suas)! A segunda, que mesmo que se reconheça alguma previsibilidade no seu jogo, o Porto tem condições para ter sucesso dentro da sua proposta de jogo, nomeadamente porque tem jogadores capazes de oferecer qualidade ao jogo exterior e tem depois um ponta de lança muito forte na resposta às acções de cruzamento. A terceira - e fico-me por aqui - é que Lopetegui dificilmente trabalhará alternativas à sua ideia de jogo, nomeadamente ao nível do jogo interior, e o mais provável é mesmo que "largura" continue, e seja até ao fim, a palavra dominante, relativamente ao Porto 14/15.
Quanto ao resto, não tenho muito a acrescentar aos números do próprio jogo: Uma grande vitória, a lembrar as grandes noites europeias que aquele estádio já viveu!

Maribor - Sporting - Mais um empate a 1 golo, que vem acentuar o sentimento de frustração em torno da época do Sporting. Apesar da semelhança dos desfechos, começo por traçar as diferenças entre este empate e aquele que o antecedeu, frente ao Belenenses, porque me parecem casos completamente diferentes. É verdade que desta vez a vitória esteve praticamente garantida, e que apenas não se confirmou devido a uma oferta desnecessária no último lance do jogo, no entanto, e por muito que a forma como as coisas aconteceram sugira o contrário, este é um resultado bem mais coerente com a história do jogo, do que aquilo que acontecera no passado sábado. Ou seja, é verdade que o Sporting teve mais domínio e presença territorial do que o Maribor, mas ao contrário do que aconteceu frente ao Belenenses onde foi ameaçado apenas por 2 vezes, a equipa permitiu que os eslovenos dividissem o jogo em termos de proximidade real com o golo. Na parte final, e de forma decisiva, por erros individuais dos centrais - e já lá vou - mas no resto do jogo por motivos que ultrapassam esse problema. A saber, o Maribor forçou sempre um jogo de grande presença junto da zona de finalização, e sempre que lhe era permitido verticalizar de forma rápida, o Sporting sentia problemas óbvios. Era, neste contexto, fundamental que o Sporting tivesse realizado um jogo mais conseguido do ponto de vista posicional. E, aqui, podemos até incluir os dois momentos do jogo. Em organização defensiva, porque era necessário que a linha média não se distanciasse muito dos centrais, sob pena de rapidamente ser criada superioridade numérica nessa zona fulcral. Em organização ofensiva, porque era preciso gerir com critério a posse de bola e ter uma preparação posicional adequada para responder à perda de bola, porque com 2 elementos adiantados, era muito fácil que o Sporting fosse colocado numa situação de igualdade numérica em situações de ataque rápido. Nem num caso, nem no outro o Sporting correspondeu a essa especificidade que o jogo lhe exigia, e por isso acabou por não ver o seu domínio ser traduzido numa grande diferença de proximidade com o golo. Não porque não tivesse criado boas ocasiões, que criou, mas porque acabou por também permitir que o adversário as criasse. E este será um cenário previsivelmente repetido frente a Schalke e Chelsea, com o óbvio acréscimo de risco para a equipa.
Explorando então o tema dos centrais, começo por dizer que, embora eu não acredite em tais coisas, o futebol de facto parece por vezes alinhado com fenómenos paranormais. Tanto se falou dos centrais, e eles acabaram mesmo por deitar por terra uma vitória praticamente garantida, os dois, e na última jogada do jogo. Se fosse ficção, pareceria irrealista! Enfim, é verdade que o Sporting tem limitações ao nível dos centrais - bastante mais pronunciadas em Sarr, na minha leitura, e como já expliquei - mas não me parece de todo que tais problemas sejam suficientes para hipotecar as possibilidades da equipa realizar uma boa temporada, ou que justifiquem a carga dramática que têm suscitado. Primeiro, porque os problemas defensivos do Sporting - e como expliquei acima - me parecem muito longe de estar circunscritos aos centrais. Depois, porque o Sporting apenas perdeu 1 dos seus titulares da última época, que foi muito conseguida ao nível deste sector específico, e não me parece que Rojo alguma vez tenha representado uma mais valia individual para que a sua saída represente, por si só, um drama. Posto tudo isto, não espantará se disser que é a Marco Silva que me parece caber grande parte das possibilidades de sucesso da equipa. O treinador terá de encontrar respostas aos problemas que nesta altura se lhe apresentam, de forma a potenciar as virtudes e atenuar os defeitos dos seus recursos. Tanto em termos colectivos, como a nível individual, porque há várias unidades - para além dos centrais! - em sub-rendimento neste inicio de época, e cujo desenvolvimento depende em grande medida das orientações tácticas que lhes forem dadas. É um teste importante para o treinador e para a sua carreira, e provavelmente o desfecho definir-se-á entre a sua capacidade de se abstrair dos inúmeros diagnósticos externos, e encontrar ele próprio as respostas a partir de dentro. Se o conseguir, possivelmente acabará rotulado de "teimoso", mas também terá mais hipóteses de se manter no patamar a que chegou...

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