7.3.14
5 jogadas (controlo da profundidade)
Aproveito algumas jogadas do passado fim de semana para abordar o tema do controlo da profundidade, tantas vezes na origem dos golos que vamos vendo. Como ponto prévio, quero referir que esta é uma situação muito difícil de defender com eficácia, porque normalmente exige decisões num espaço de tempo muito curto, requerendo a coerência de vários jogadores e, várias vezes, com muito espaço para controlar. No mesmo sentido, não é minha intenção passar a ideia de que há formas certas e erradas de abordar o problema - aliás, essa é uma abordagem que refuto em quase tudo no futebol. A utilidade deste, como qualquer outro princípio comportamental, está dependente da eficácia na sua implementação, e é praticamente impossível alguém ter a certeza de que uma forma de defender seja, por si só, mais eficaz do que a outra. Como em quase tudo no futebol, a opção acaba por depender da convicção de cada um, sendo que bons treinadores, que conseguem colocar as suas equipas a controlar bem este tipo de situação, têm frequentemente abordagens perfeitamente distintas na forma de o fazer. Pessoalmente, a minha percepção é que equipas, como Chelsea ou Atlético de Madrid, que tendem a arriscar menos em termos de exposição espacial, acabam por ter um melhor controlo deste tipo de situação. Mas, como referi, é uma situação discutível, e daí também o seu interesse...
1 - Começo por recuar 1 semana no tempo para recuperar o primeiro golo do Arouca em Braga. O meu foco, aqui, vai para a ausência de pressão sobre Ceballos, sendo que Sasso tinha todas as condições para o fazer - inclusivamente, Ceballos começa por receber de costas. A pressão sobre o portador da bola é um dos aspectos fundamentais para o controlo da profundidade e, neste caso, para além de dar tempo à equipa para se reorganizar, a pressão seria fundamental para evitar a exposição das costas de uma linha defensiva ainda demasiado subida no terreno. Este lance, tal como o do segundo golo sofrido pelo Braga no mesmo jogo, evidenciam as dificuldades de Sasso para jogar como defesa-lateral, e daí a minha crítica em torno da decisão de, no jogo de Alvalade, ter sido novamente lançado para a mesma posição.
2 - O segundo golo sofrido pelo Porto em Guimarães espanta pela simplicidade com que Marco Matias surge na cara de Hélton. O primeiro ponto a abordar é, na minha opinião, o posicionamento de Alex Sandro. É normal haver alguma abertura posicional, já que era o Porto quem tinha inicialmente a bola, mas no momento em que se torna evidente a reposição de Hélton para o lado direito, exigia-se maior prudência do lateral-esquerdo no seu posicionamento, coisa que não aconteceu. Depois, porém, também me parece questionável a abordagem de Abdoulaye. Mais uma vez, tudo surge numa situação em que se perde a presença pressionante sobre o portador da bola - no caso, Maazou. Abdoulaye optou por se manter na mesma linha, tentando usar o fora-de-jogo para condicionar a iniciativa do Vitória. A meu ver, é muito discutível a opção, simplesmente porque a ausência de controlo sobre o tempo de execução de Maazou determina que o risco de exposição aumente assinalavelmente.
3 - O grande golo de Gaitan também justifica alguma reflexão a este propósito. Ao manter-se mais alta, a linha defensiva do Belenenses consegue cortar todas as linhas de passe ao extremo argentino, o que num primeiro momento aparenta garantir o sucesso da sua acção. Perante um jogador que vinha em velocidade, porém, o número de metros nas suas costas acabou por oferecer outra solução a Gaitan, no caso a progressão individual. No lance, há ainda que destacar dois aspectos: primeiro, claro, a qualidade de Gaitan. Depois, também, a acção de Matt Jones. O ideal, perante uma defesa tão alta, é que o guarda-redes esteja preparado para intervir nas suas costas. Não sendo isso possível, porém, exigia-se mais prudência na saída da baliza, precisamente para não permitir que Gaitan fizesse o que acabou por fazer. Ainda assim, note-se, Matt Jones tem sido um dos grandes destaques da prova, no que a guarda-redes diz respeito.
4 - O primeiro de golo do Chelsea em Craven Cottage evidencia-se pela facilidade com que a equipa transformou um lançamento lateral na imediação da sua área, numa situação de 1x0, na área oposta. E, de novo, o tema do controlo da profundidade justifica discussão. O ponto mais evidente e comprometedor é, claro, a falta de sintonia entre os jogadores do Fulham, com alguns jogadores a tentar manter a linha de fora-de-jogo e outros a recuar, tentando desesperadamente recuperar metros. Seja como for, a questão que coloco é até que ponto se justificava arriscar usar o fora-de-jogo como condicionamento do adversário, numa situação em que Hazard não estava a ser directamente pressionado?
5 - Neste último caso, o desfecho acaba por ter algum perigo para a baliza de Courtois, mas o meu sublinhado vai para aquilo que me parece ser uma boa reacção colectiva do Atlético de Madrid. Ao tirar a bola da zona de pressão, o Real fica com uma situação muito favorável para explorar a profundidade, não havendo pressão sobre Di Maria e com Ronaldo e Benzema a terem reacções fortíssimas neste tipo de situação. O Atlético, porém, consegue rapidamente cortar a profundidade, e mesmo se o Real, por mérito próprio, chega a uma situação de finalização, parece-me que o facto de a acção não ter terminado com um jogador na cara de Courtois é, em si mesmo, um significativo atenuar dos danos potenciais.
Fugindo um pouco ao tema, aproveito para realçar o bom derbi de Madrid que tivemos no passado fim-de-semana. Duas das melhores equipas do futebol mundial, com características e pontos fortes muito diferentes, mas ambas com muita qualidade. O Real com um grande potencial técnico na frente, e hoje com uma circulação baixa que usa muito bem a largura e abertura dos seus médios (Di Maria e Modric) como ponto de partida para as suas jogadas. O Atlético - provavelmente a equipa que, actualmente, mais admiro - com recursos mais modestos, mas como uma organização e sentido colectivo notáveis, fortíssima no controlo defensivo, e muito lúcida sobre a forma como pode causar estragos nos adversários. Um grande jogo, e um desfecho que, também ele, me pareceu justo.