15.12.14

Porto - Benfica (I): performance colectiva

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Como comentário geral ao jogo, e antes de abordar especificamente cada uma das equipas, diria que a partida não fugiu muito da expectativa que partilhei na antevisão. Ou seja, foi um jogo de poucas chegadas às zonas de finalização, o que sugere um melhor desempenho defensivo do que ofensivo de ambas as equipas. O que não esperava, e sobretudo na primeira parte, era que fosse apenas o Porto a conseguir ameaçar o último reduto contrário, tendo conseguido inclusivamente tirar bom partido das poucas vezes em que conseguiu chegar de forma útil à área de Júlio César. E por aqui se verá que, na minha leitura, o resultado e a vitória do Benfica tiveram sobretudo a ver com um desnível acentuado de eficácia no aproveitamento dos principais lances criados.

Porto - Sinais repetidos (melhor a defender do que a atacar)
No final, Lopetegui tentou contrariar a sentença dos números reclamando para a sua equipa a superioridade no jogo. Não estou totalmente certo da utilidade deste discurso em termos mediáticos, mas não posso deixar de conceder alguma razão à leitura do treinador basco. Mas, vamos por partes...
O melhor da exibição portista, a meu ver, está no capítulo defensivo, indo de encontro a outros sinais já dados nesta temporada, nomeadamente nos jogos fora para Champions. Se contarmos o número de vezes que o Benfica chegou ao último terço portista vamos chegar a valores muito baixos e invulgares para uma equipa com a qualidade dos encarnados. Haverá algum demérito do Benfica (mais abaixo darei a minha visão sobre isso), mas entre peso do mérito de uns e demérito de outros penso que é justo enaltecer sobretudo os créditos portistas, até porque não creio que muitas equipas conseguissem este registo. É claro que o resultado e os dois golos sofridos sugerirão uma análise diferente, que procure até à minúcia explicações causais que possam sugerir alguma lógica ao destino verificado. Se o recurso a esta perspectiva indutiva de raciocínio normalmente não traz bons resultados, neste caso parece-me que só pode mesmo conduzir a conclusões forçadas e de pouco significado lógico. É que nem os golos resultaram de lances onde houvesse um grande descontrolo defensivo, nem o Benfica conseguiu ao longo dos 90 minutos expor o último reduto portista, seja nas costas ou na frente da sua defesa. É claro que haverá reparos individuais a fazer, mas nada que na minha opinião sirva para deixar de concluir sobre o bom controlo defensivo do Porto, apesar do resultado e dos dois golos sofridos.
Menos bem, e também numa repetição indícios anteriores, pareceu-me estar a prestação ofensiva da equipa. É certo que a equipa conseguiu um número importante de ocasiões claras de golo, mas isso terá resultado mais de um bom aproveitamento das chegadas ao último terço, do que propriamente de uma grande capacidade para criar problemas sistemáticos de controlo defensivo ao Benfica, no fundo que correspondessem ao tempo de posse de bola que a equipa teve. Aqui, convém distinguir a primeira da segunda parte, e muito pela postura defensiva do Benfica. Na primeira parte, o Porto conseguiu tirar partido de uma das situações que tinha abordado na antevisão, que eram os movimentos na profundidade dos seus médios, aproveitando a tentativa do Benfica jogar com a sua linha defensiva mais alta. Foi sobretudo pelas dificuldades de controlo do meio campo do Benfica que o Porto criou problemas ao seu adversário nesse período, tendo-se esfumado essa oportunidade quando Jesus baixou as suas linhas, na segunda parte. Aqui, há um ponto que gostaria de abordar particularmente, que tem a ver com a superioridade numérica de que o Porto usufruía no centro do campo, mas que em geral não aproveitou bem. Particularmente, quando a equipa conseguia atrair Lima e Talisca para pressionar os centrais, fazendo também uso do guarda-redes, deixava Enzo e Samaris para controlar Casemiro, Herrera e Oliver, uma vantagem que na primeira parte esteve na origem dos principais problemas defensivos do Benfica, mas que me pareceu ainda assim subaproveitada. Primeiro, por causa de Casemiro, que continua a ter um desempenho com bola muito fraco (defensivamente será o oposto, mas mais sobre isso na análise individual). Justificava-se que o médio jogasse sempre dentro do bloco do Benfica e não que baixasse para a linha dos centrais (o que o retirava da tal zona onde podia criar superioridade), e justificava-se também que tivesse mais capacidade para assumir o jogo com bola, nas costas dos avançados do Benfica, o que não aconteceu. Depois, porque na segunda parte, Oliver e Herrera mantiveram-se demasiado profundos e pouco móveis, o que deixava de fazer sentido quando a linha do Benfica deixou de oferecer os espaços que tinham sido aproveitados na primeira parte. Como nada disto aconteceu, à excepção dos tais movimentos de Oliver e Herrera o Porto voltou a ser fundamentalmente uma equipa de jogo exterior e relativamente previsível, apesar de todo o talento dos seus jogadores.

Benfica - Vitória importante, exibição preocupante
O Benfica pode ter ganho o jogo e possivelmente uma vantagem decisiva na corrida ao título, mas na minha opinião não deixou de fazer no Dragão um jogo bastante medíocre para os seus pergaminhos.
Começando pelo capítulo defensivo, a equipa esteve claramente melhor na segunda parte, quando baixou as suas linhas, depois de ter tido bastantes problemas quando tentou defender em zonas mais amplas do terreno. A ideia de Jesus era usar Lima e Talisca para pressionar os centrais e o pivot, mas frequentemente estes eram atraídos e libertavam Casemiro, valendo ao Benfica a pouca capacidade o médio portista para aproveitar esse facto. Depois, mais atrás, surgiu sobretudo um problema de encaixe, em termos de referências individuais nos médios do Porto. A ideia era que os movimentos dos médios do Porto fossem acompanhados, ora por um dos centrais, ora por um dos médios, mas esse ajuste só foi realmente bem conseguido na segunda parte, quando a equipa passou a defender numa zona mais baixa, e também mais curta, do terreno. Aqui, nota para a diferença na exibição de Samaris, que ganhou muito quando a equipa encostou atrás. De resto, o Benfica foi, como é habitualmente, uma equipa organizada e solidária, com bom relacionamento intersectorial, o que lhe permitiu, com alguma felicidade à mistura é certo, sobreviver sem sofrer golos, num jogo onde passou a maior parte do tempo sem bola e no seu meio campo.
Se defensivamente, e apesar de alguns problemas, a equipa teve um bom desempenho, já com bola não se pode dizer manifestamente o mesmo. O Benfica não conseguiu gerir o jogo com bola, nem tão pouco fazer uso do espaço que o Porto oferecia pela exposição espacial decorrente do facto de estar constantemente em acção ofensiva. Marcou dois golos, é verdade, mas na minha opinião tal resulta essencialmente de um excelente aproveitamente circunstancial daquilo que produziu ofensivamente, e não de uma tradução que corresponda fielmente à seu desempenho ofensivo no jogo. Aqui, temos de separar dois temas, um tem a ver com a incapacidade da equipa se afirmar com bola, o outro com a sua incapacidade de ter mais profundidade nas suas acções ofensivas. Relativamente às dificuldades para ter bola, penso que tal tem que ver com a estratégia de Jesus, que claramente optou por iniciar o jogo através de reposições longas e não assumir o risco de tentar sair desde trás. Percebe-se que tenha tido esse receio, porque o Benfica de hoje não revela grande vocação para envolver o pressing adversário, como fazia no passado, e provavelmente se o tivesse tentado, a equipa acabaria por passar por problemas ao nível da sua segurança em posse. Sucede, porém, que este Benfica também não me parece especialmente vocacionado para jogar a partir de bolas divididas, e a verdade é que perdeu a maioria delas. Talisca pode ter centímetros de sobra mas não é um jogador especialmente forte nos duelos aéreos, e Enzo e Samaris não têm uma presença defensiva tão forte que possa compensar essa lacuna nas segundas bolas. Ou seja, urge que Jesus resolva esta situação e que encontre uma alternativa a partir da qual a equipa possa ser mais eficaz e se consiga assumir perante adversários mais fortes. É certo que sem Europa não sobram muitos embates dessa dimensão, mas convém não menosprezar o campeonato a esta distância do final, até porque não há muito mais a que se agarrar. A minha convicção é que se não evoluir, e tal como aconteceu em Braga e agora no Dragão, o Benfica passará por dificuldades para se impor com bola, sempre que defrontar adversários mais exigentes. Depois, relativamente à pouca profundidade do jogo da equipa, parece-me que o Porto chamará a si boa parte do mérito. Tendo pouca bola, a oportunidade abria-se sobretudo no momento de transição, mas o facto é que o Benfica conseguiu poucas recuperações no corredor central, o que dificultava o desdobramento ofensivo, e contou também quase sempre com uma boa reacção à perda por parte do Porto, cujas qualidades defensivas já elogiei acima.

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