Na semana passada decorreram as "Jornadas técnicas do futebol" - uma espécie de doce pré natalício para os que tentam compreender esta vertente do jogo. Como prato forte do evento foram convidados como oradores os treinadores: Jorge Jesus, Neca, Fernando Santos e Paulo Bento. É precisamente sobre este último e o "jogar" do seu Sporting que me aqui quero debruçar, partindo do breve acompanhamento que os jornais fizeram da palestra - podem crer que lamento não poder ter estado presente!
Que Paulo Bento aplica o seu modelo de jogo em 4x4x2 (losango) não é novidade mas, evidentemente, a forma de jogar não se resume ao sistema de jogo, havendo diferenças óbvias entre, por exemplo, o "jogar" dos losangos de Benfica e Sporting. Aqui fica um pequeno resumo dos príncipios do Sporting de Bento nas 4 fases essenciais do jogo: Defesa, Transição defensiva, Transição ofensiva e Ataque.
Defesa - A prioridade passa por um eficaz povoamento das zonas defensivas, tendo sempre a bola e o espaço como referências prioritárias (método zona). O objectivo passa por reduzir os espaços entre os sectores (ou "entre-linhas"), impedindo que o adversário possa progredir verticalmente. Aqui, a basculação colectiva torna-se crucial para que a equipa tenha um posicionamento zonal adequado a cada momento. Falta um pormenor fundamental, o "pressing" sobre o jogador com a bola.
Transição defensiva - É uma das prioridades da equipa. No momento em que perde a bola o Sporting procura dois tipos de comportamento: o "pressing" feito pelos jogadores mais perto da bola e o reposicionamento colectivo, garantido pelos restantes jogadores. Para o sucesso neste cada vez mais valorizado momento do jogo são necessários dois fundamentos - a velocidade de reacção e o equilibrio da equipa no instante imediatamente anterior à perda de bola.
Transição ofensiva - Este é o aspecto onde o Sporting se apresenta menos rotinado. A transição é, obviamente, tanto mais perigosa quanto mais adiantada no terreno for a recuperção da bola. A solicitação para Liedson é já um clássico (vejam-se, por exemplo, alguns lançamentos rápidos de Ricardo para o "Levezinho") mas falta ao Sporting alguma profundidade e, sobretudo, movimentos claramente rotinados.
Ataque - Ao contrário do que dizem algumas críticas menos fundamentadas, o Sporting de Bento é especialmente dinâmico nas acções em apoio pelos flancos (particularmente o esquerdo). Colocando sempre muitos jogadores sobre as linhas, consegue-se uma superioridade numérica que permite encontrar sistematicamente soluções de passe. Aqui a acção do 10 é fundamental, visto que faz um movimento em diagonal encontrando muitas vezes espaço para cruzar. Referência ainda para a oscilação que o Sporting apresenta no seu jogo. Numa tentativa de variar as abordagens ofensivas são observáveis algumas solicitações mais directas.
Aqui ficam algumas das declarações fundamentais da palestra de Paulo Bento, reveladoras da sua compreensão sobre a problemática do jogo e que realçam em particular três aspectos:
a importância do pragmatismo no "jogar"
"Não tenham dúvidas de que também mando os meus jogadores jogar feio quando é preciso. Fazer faltas e chutar para fora quando é necessário também faz parte de um modelo de jogo, porém a nossa preocupação é colocar a equipa a jogar sempre da melhor maneira possível"
a importância do treino e da sistematização de processos
"Não tive dificuldades em implementar o meu modelo de jogo. Temos sempre presente a necessidade de dar identidade aos exercícios que efectuarmos nos treinos, de acordo, nomeadamente, com a especificidade em relação aos espaços e apoios. Realizamos exercícios nas zonas onde queremos que sejam repetidos nos jogos. Introduzimos também os aspectos mentais, através da complexidade, competitividade e concentração."
a importância dos momentos de transição na definição de um modelo de jogo
"Trabalhamos essencialmente o ataque apoiado, mas não descuramos, igualmente, o contra-ataque e o ataque rápido, apesar de as equipas adversárias jogarem maioritariamente sobre a sua defensiva. Procuramos sempre efectuar uma transição defensiva rápida no primeiro e segundo momentos, de forma a reagrupar e colocar os jogadores perto da bola, reduzindo os espaços. Em termos de transição ofensiva, procuramos profundidade através de ataque rápido e contra-ataque"
Sem ter conquistado ainda nenhum troféu na sua carreira e com um resto de temporada complicado pela frente, não tenho problemas em projectar Paulo Bento como um treinador de grande sucesso no futebol nacional... seja no Sporting ou noutro clube qualquer!