23.8.06

“O Maior Espectáculo do Mundo”

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A Premier League é hoje a competição desportiva mais vista em todo o mundo e os seus clubes respiram uma saúde económica e financeira invejável... no inicio da década de 90 o campeonato inglês sofreu uma alteração estrutural de relevo que passou a direccionar a organização do jogo no sentido da profissionalização, fomentando uma cultura de espectáculo do futebol e percebendo a necessidade de, colectivamente promover e desenvolver o “produto futebol” dentro e fora das fronteiras britânicas... Em Portugal a visão sobre esta problemática é limitada - quase nula – prevalecendo uma cultura clubista, sem estratégia comum e onde apenas os grandes clubes vão modernizando o seu relacionamento com a respectiva massa adepta... as consequências do “agigantamento” inglês são uma ameaça bem real!


As aparências iludem de facto - diversas vezes somos confrontados com situações que em quase tudo se aparentam mas que em quase nada são verdadeiramente iguais. Em certa medida é também isso que acontece quando descontraidamente assistimos ao início de cada um dos campeonatos que nesta altura protagonizam a “reentre” futebolística, sem percepcionar a importância que diferencia cada um dos momentos observados... Abandonado ao seu próprio destino depois da tragédia de Heysel Park e desconsiderado durante por mais de uma década pela pobreza técnica do seu estilo “Made in England” – o “Kick n’ Rush” – o Campeonato Inglês é hoje um caso de inegável sucesso no panorama desportivo mundial, tornando-se em muito mais do que uma competição atractiva: no “Maior Espectáculo do Mundo”...
O acórdão Bosman e o “boom” das receitas televisivas formam um cocktail que reorientou radicalmente as coordenadas na Europa do futebol, gravando para sempre a importância do final da década de 90 na história do jogo. Como em qualquer mudança, saem reforçados (ou em última análise, sobrevivem) aqueles que mais rapidamente a ela se adaptam. No caso do futebol inglês, a grande virtude estará, mais do que na adaptação, na antecipação da mudança – no inicio da década de 90 o campeonato inglês sofreu uma alteração estrutural de relevo que passou a direccionar a organização do jogo no sentido da profissionalização, fomentando uma cultura de espectáculo do futebol (não confundir este conceito com “futebol espectáculo” – um erro de muitos!) e percebendo a necessidade de, colectivamente promover e desenvolver o “produto futebol” dentro e fora das fronteiras britânicas.
A paixão pela modalidade e a dimensão socioeconómica do país representavam uma vantagem natural, sem dúvida, contudo não poderá ser esta uma explicação suficiente para justificar todo o caminho percorrido desde o inicio da década de 90: a Premier League é hoje a competição desportiva mais vista em todo o mundo (mais de mil milhões de telespectadores repartidos por 195 países) e os seus clubes respiram uma saúde económica e financeira invejável. A lógica é simples: quanto mais visto for o campeonato, mais interesse gera nos patrocinadores, mais receitas conseguem os clubes, mais disponibilidade existe para pagar a (muitos e bons) jogadores e maior interesse é gerado no público. Trata-se pois de um ciclo de valor que há muito foi percepcionado pelos responsáveis ingleses tendo estes implementado uma estratégia que, a tempo e horas começou a colher os seus frutos. Acções promocionais levadas a cabo em todo mundo (particularmente no mercado asiático onde já se realizaram torneios especiais com equipas inglesas em 2003 e 2005), a criação de magazines semanais sobre a competição e uma cultura de defesa e valorização do jogo e do espectáculo são apenas algumas das diligências que aos olhos de toda a gente foram postas em prática.
Não sendo, a meu ver, o melhor dos campeonato sob ponto de vista estritamente futebolístico, a Premier League consegue, para a maioria de nós, ser hoje o mais atractivo – algo apenas alcançado através do respeito e culto de um valor essencial: o espectáculo do futebol (mais uma vez, não confundir “futebol espectáculo”).

Uma ameaça real...
Para o futebol português as consequências do “agigantamento” inglês são uma ameça bem real!
Em Portugal a visão sobre esta problemática é limitada - quase nula – prevalecendo uma cultura clubista, sem estratégia comum e onde apenas os grandes clubes vão modernizando o seu relacionamento com a respectiva massa adepta (as campanhas promocionais vistas nos três grandes não encontram paralelo na generalidade dos clubes nacionais). Os grandes clubes europeus estão assim a conquistar lenta mais seguramente o seu espaço entre as preferências dos adeptos lusos, sendo esta uma situação evidentemente preocupante: o maior prejuízo recairá, sem surpresas, sobre os mais pequenos que dificilmente poderão manter a sua condição de profissionalismo face à escassez de receitas que inevitavelmente resultará de uma redução progressiva do número de adeptos. Os clubes grandes, por seu lado, manterão o seu estatuto aquém fronteiras, mas ficarão cada vez mais isolados e distantes do poderio económico (e por conseguinte, desportivo) dos grandes europeus.
Este é um cenário que assombra o futuro dos países (uns mais do que outros) fora do poderoso quinteto formado por Inglaterra, Espanha, Itália, Alemanha e França e que deverá alterar ainda mais a forma como até hoje percepcionamos o futebol europeu.

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